Título: CANDIDATOS ESTIMAM GASTOS EM R$210 MILHÕES
Autor: Carolina Brígido e Raquel Miura
Fonte: O Globo, 26/10/2006, O País, p. 5

Lula e Alckmin aumentam previsão de despesas, que supera em 110% o total consumido por PT e PSDB em 2002

BRASÍLIA. A soma dos gastos oficiais das duas principais campanhas presidenciais poderá chegar, até o próximo domingo, a R$210 milhões. O valor representa mais que o dobro (110% de aumento) dos custos declarados pelo PT e PSDB nas eleições para presidente em 2002, que somavam R$100 milhões (já corrigidos). Para especialistas, é mais uma evidência da prática do caixa dois nas campanhas anteriores. Na noite de anteontem, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autorizou o aumento de R$26 milhões no teto de gastos previstos pela campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, passando dos R$89 milhões estimados inicialmente para R$115 milhões.

Mudança na lei eleitoral para reduzir custos falhou

O candidato tucano, Geraldo Alckmin, também pediu ao TSE para ampliar o teto de gastos de R$85 milhões para R$95 milhões. A princípio, o ministro José Delgado havia negado o pedido, mas ontem à noite o plenário do TSE autorizou o aumento. Ao final da eleição, os partidos não podem declarar gastos superiores ao teto registrado na Justiça Eleitoral.

Há quatro anos, a campanha de Lula custou R$52,7 milhões e a do tucano José Serra, R$47,3 milhões ¿ ambas em valores corrigidos pela inflação acumulada no período.

Os números deste ano atestam que falhou a tentativa do Congresso de diminuir os custos das campanhas com mudanças na legislação eleitoral. Foram proibidos os showmícios e a distribuição de camisetas e brindes. O próprio presidente do TSE, ministro Marco Aurélio de Mello, lança a suspeita:

¿ Há um descompasso aí a ser esclarecido. Não podemos conceber que se proibindo brindes e showmícios a campanha seja mais cara que em 2002.

Especialistas em legislação eleitoral dizem que o aumento dos gastos denuncia a diminuição do caixa dois, não seu fim. Para eles, o maior rigor na fiscalização e a repercussão de escândalos recentes de caixa dois colaboraram para a mudança

¿ Era de se esperar que a campanha ficasse mais barata. Como isso não ocorreu, muito pelo contrário, a suposição é de que o caixa dois esteve muito mais presente nas eleições passadas, sem dúvida. Agora, essa prática não acabou. O dinheiro para a suposta compra do dossiê (contra tucanos) é uma mostra de que o caixa dois continua, ainda que mais controlado ¿ avaliou o cientista político Otaciano Nogueira, da Universidade de Brasília (UnB).

Os advogados dos partidos tentam justifica o aumento das despesas, alegando que as práticas proibidas na eleição deste ano não eram as mais caras das campanhas. As novas regras, segundo eles, teriam obrigado os candidatos a investir em novas formas de convencimento do eleitor. Com o fim dos outdoors, por exemplo, as campanhas tiveram que gastar ainda mais, pois precisam contratar pessoas para segurar placas nas ruas e empunhar bandeiras.

¿ A forma de se fazer campanha mudou, em quatro anos muda muita coisa. Os candidatos estão investindo mais em impressos, placas, pequenos eventos e outras formas de chamar a atenção do eleitor. Tudo isso faz com que haja maior gasto ¿ explicou o advogado do PSDB, José Eduardo Alckmin.

¿ Quando se tiram as despesas com camisetas, showmícios e coisas mais tradicionais, os gastos acabam concentrados em coisas mais caras, como os programas de TV ¿ avaliou Márcio Silva, advogado do PT.

Escândalos e exposição à mídia aumentaram controle

Mas o cientista político Luiz Henrique Bahia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), acredita que o aumento dos gastos este ano comprova que houve caixa dois em 2002.

¿ Acho que há quatro anos houve uma declaração não real dos gastos, o que reforça toda a suspeita de que houve caixa dois. Agora vemos um zelo maior com as contas, principalmente entre os candidatos mais expostos na mídia, como Lula e Alckmin. Mas, apesar do controle, não acredito em fim do caixa dois ¿ disse Bahia.

Para Silvana Krause, da Universidade Federal de Goiás, depois de tantos escândalos, os partidos se sentiram coagidos a apresentar uma declaração mais próxima da realidade.

¿ Isso é um sintoma de uma Justiça um pouco mais fiscalizadora e resultado de tantas denúncias. Eles se sentiram constrangidos e incorporaram boa parte dos gastos informais aos dados oficiais. É o que tudo indica. Podemos dizer que houve um certo avanço ¿ afirmou.

(*)Da CBN, especial para O GLOBO