Título: PAÍS TEM DAS PIORES TAXAS DE REPETÊNCIA DO MUNDO
Autor: Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 27/10/2006, O País, p. 17
Brasil aparece em 15º lugar no relatório da Unesco, acima apenas de 12 nações da África subsaariana, Nepal e Anguila
BRASÍLIA. O Brasil aparece em 15º lugar, empatado com Moçambique, no ranking de maiores taxas de repetência na escola primária divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). O relatório mostra que apenas 12 países da África subsaariana, a região mais pobre do mundo, o Nepal, na Ásia, e a colônia britânica de Anguila, no Caribe, estavam em situação pior que a brasileira.
O ranking considerou dados de 140 nações e territórios, indicando que 20,6% dos estudantes brasileiros de 1ª a 4ª série repetiram o ano em 2002. Em 1999, a taxa era ainda maior, de 24%.
O campeão de reprovação foi Guiné Equatorial, na África, com 40,5%. Os dez primeiros países da lista são africanos. Com a menor taxa, 0,01%, aparece a Coréia do Sul, país que se notabilizou nos últimos anos por fazer pesados investimentos em educação. Dos 140 países, 71 apresentam taxas inferiores a 5%.
O Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos 2007, lançado em Nova York, diz que a taxa de repetência reflete a qualidade do ensino. Sob o título "Bases Sólidas: Cuidados e Educação na Primeira Infância", o estudo defende maiores investimentos em creches e pré-escolas, como forma de melhorar o rendimento dos estudantes na etapa seguinte, ou seja, no ensino fundamental.
A coordenadora do escritório da Unesco no Rio Grande do Sul e especialista em educação infantil, Alessandra Schneider, lembra que o cérebro se desenvolve nos primeiros anos de vida. Daí a importância da creche e da pré-escola:
- A criança entra na 1ª série com um nível de desenvolvimento cognitivo melhor. É na faixa de 0 a 3 anos que se formam 90% das conexões cerebrais.
O Brasil é citado duas vezes no relatório, juntamente com a África subsaariana, como exemplo de países ou regiões com altas taxas de repetência. O texto destaca negativamente também a taxa brasileira na 1ª série, que estava em 29,3%, em 2003, segundo o estudo. O país aparece ainda no grupo de 28 nações em desenvolvimento com mais de 500 mil crianças fora da escola primária. Na Nigéria, são mais de 8 milhões.
Por conta da dificuldade de obter dados de todos os países num mesmo ano, a Unesco compara estimativas do período de 2001 a 2005. Assim, o ano-base varia conforme a disponibilidade de informações. A educação primária, que dura quatro anos no Brasil, pode levar de três a sete anos no resto do mundo.
A presidente da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Maria do Pilar, disse que o Brasil convive com uma cultura conservadora favorável à reprovação de estudantes, como forma de garantir o aprendizado. Segundo ela, que é secretária da Educação de Belo Horizonte, essa concepção é equivocada:
- O pensamento conservador diz que, se reprovar, a criança aprende no ano seguinte, o que não é verdade. Está provado que, quanto mais reprovação, pior o desempenho dos alunos. É preciso mudar o modelo de escola.
MEC divulga nota mas não menciona taxa de repetência
O relatório mostra que a América Latina e o Caribe são as regiões, no mundo em desenvolvimento, com a maior cobertura de matrículas na educação infantil, atendendo 62% das crianças. O estudo defende programas de transferência de renda como o Bolsa Família ou o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), para evitar que crianças deixem a escola para trabalhar.
O Ministério da Educação divulgou nota sobre o relatório sem fazer referência à taxa de repetência. O texto informa que o atendimento em creches subiu de 10,6% para 13,4% das crianças até 3 anos, entre 2001 e 2004. Na pré-escola, o aumento foi de 65,6% para 70,5% da população de 4 a 6 anos, no mesmo período.
Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), os dados de repetência mais recentes são de 2004, e apontam taxa de 21,1% no ensino fundamental, incluindo as séries finais e não apenas a escola primária.
INFÂNCIA EXPLORADA nas páginas 31 e 32