Título: Corrupção no PT enfraquece o presidente¿
Autor: Janaina Figueiredo
Fonte: O Globo, 29/10/2006, O País, p. 20

Para acabar com a desesperança e o sentimento de que políticos são iguais, a brasilianista americana Barbara Weinstein sugere que, se reeleito, o presidente Lula assuma a gravidade da corrupção no PT e deixe de acusar a oposição de armar um complô contra o governo.

¿ Ele tem de assumir as responsabilidades, pelo menos de maneira indireta, e se distanciar dessa política de corrupção ¿ diz Barbara Weinsten, presidente da American Historical Society e professora de história do Brasil e da América Latina moderna.

De que maneira a senhora acha que o possível segundo mandato do presidente Lula pode ser diferente do primeiro?

BARBARA WEINSTEIN: Depois de ter deixado claro que não é uma ameaça aos vários grupos de poder econômico e aos interesses internacionais na economia brasileira, minha expectativa é que agora ele se sinta liberado para fazer reformas mais sérias e profundas num segundo mandato. O problema é que a corrupção no PT enfraquece a situação do presidente Lula.

Lula deve ser reeleito mas a esperança de que mudaria o país parece substituída pelo sentimento de que todos os políticos são corruptos. Como ele pode mudar isso?

WEINSTEIN: Primeiro, ele tem de assumir a gravidade da corrupção dentro do partido e deixar de dizer que são os inimigos do PT que estão fazendo tudo isso. Em campanha, político diz qualquer coisa mas, depois de reeleito, Lula tem de assumir uma certa responsabilidade ¿ pelo menos indireta ¿ e se distanciar dessa política de corrupção. Ele tem tomado uma posição desonesta ao responsabilizar a oposição por tudo.

A senhora acha que são as políticas populistas que estão elegendo Lula?

WEINSTEIN: Acredito que o presidente Lula não virou um populista como o presidente Hugo Chávez, por exemplo. Ele continua vinculado ao PT, que não é simplesmente o partido do Lula, mas é um partido político com programa e correntes. A campanha foi populista porque ele perdeu o apoio de certos grupos por causa dos problemas com a corrupção.

Quando a senhora diz que Lula precisa fazer reformas sérias, ao que está se referindo?

WENSTEIN: No caso do Brasil, as reformas mais importantes têm a ver com o dinheiro, o orçamento do governo tem de ser reorganizado para gastar com moradia, saúde e educação básica.

A política externa de Lula também foi polêmica. Como a senhora avalia a ação dele na área internacional?

WEINSTEIN: Acho que surgiu esse conceito de uma esquerda boa e uma esquerda não tão boa na América Latina. Tem o grupo de Hugo Chávez, Fidel Castro, Evo Morales, que é considerado por muitos como a esquerda populista. E o outro, do qual fazem parte a presidente do Chile, Michelle Bachelet, o do Uruguai, Tabaré Vásquez, e talvez Néstor Kirchner, da Argentina. Lula é uma figura instável, muitas vezes parece a esquerda populista e em outras a esquerda mais responsável. O fato de ele ser flexível e criar relações com vários chefes de Estado na América Latina foi essencial no sentido de alianças dos grupos progressistas na América Latina. Acho que foi o ponto mais forte do governo Lula.

A senhora está escrevendo um livro relacionado com raça e gênero no Brasil. O que acha da política de cotas raciais do governo Lula?

WEINSTEIN: Sou a favor, mas não se pode fazer de qualquer maneira, não é só uma questão de aumentar o número de afro-descendentes entrando nas universidades. Tem de melhorar os colégios, criar programas para ajudar as pessoas a fazer a ponte entre o colégio e a universidade. Se abrir as portas da universidade para as pessoas e não der nenhuma base para elas terem sucesso, o resultado será reforçar o preconceito. Vão dizer: essas pessoas não eram preparadas, não deviam ter entrado na universidade. É preciso gastar dinheiro para ajudar as pessoas a ter sucesso na universidade. Não adianta simplesmente dizer: ¿Vamos ser mais progressistas na questão de raça¿.

E na questão de gênero?

WEINSTEIN: É menos marcado no primeiro mandato. Passou a haver mais conversas públicas sobre assédio sexual e questões como essas.