Título: NOVO GOVERNADOR `HERDARÁ¿ ROMBO DE ATÉ R$2 BI
Autor: Dimmi Amora
Fonte: O Globo, 29/10/2006, O País, p. 29

Rio tem gastos elevados com a máquina, apesar de ter reduzido verbas para educação, saúde, segurança e transportes

Foram muitas as promessas dos candidatos ao governo do Estado do Rio. Mas, para cumpri-las, o eleito hoje para suceder à governadora Rosinha Garotinho (PMDB) terá que suar para conseguir dinheiro. E as perspectivas não são animadoras. Estimativas do Tribunal de Contas do Estado (TCE) feitas em maio apontam que o atual governo deve entregar o caixa com um déficit entre R$1,5 bilhão e R$2 bilhões.

O rombo não significa, porém, que os serviços prestados pelo estado melhoraram. Pelo contrário. Os números do TCE mostram que o governo gastou em 2005 menos em setores como saúde, educação, segurança e transportes do que em 2001. Em alguns casos, os gastos são menores que em 1998. E a previsão é de queda nos gastos este ano. Nos investimentos, por exemplo (o que significa construção de novas estradas, escolas, hospitais, compra de equipamento permanente etc), o governo gastou em 2005 quase metade do que se gastava em 1998.

Desde a entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, o governo Rosinha deixou de fazer déficits orçamentários (gastar mais que arrecada). Os pequenos superávits da atual gestão não foram suficientes para cobrir o rombo de mais de R$2 bilhões deixado em 2002 pelas administrações de Anthony Garotinho (PMDB) e Benedita da Silva (PT). Se não faz déficit, rotineiramente a governadora cancela empenhos (que são espécies de ordens de pagamentos para fornecedores) ao fim do ano. Foram R$4,1 bilhões cancelados em 2004 e R$3,8 bilhões em 2005.

Terceirizações somam R$4,1 bi

Mas, de acordo com o relatório das contas de gestão de 2005 da governadora, elaborado pelo conselheiro do TCE Julio Rabello, em muitos casos os serviços já tinham sido prestados e o governo não podia cancelar o empenho. Os prejudicados protestam e acabam recebendo no ano seguinte ou na Justiça. Ninguém sabe quanto dos empenhos que podem ser cancelados este ano ficarão para o próximo governador.

Gastos elevados, principalmente na manutenção da máquina estatal, são a causa do buraco nas contas públicas. As despesas de custeio ¿ que pagam contas de consumo, contratam serviços de terceiros (entre eles ONGs) ¿ dispararam. Só com serviços de terceiros o governo gastou R$4,1 bilhões em 2005, segundo o TCE.

As despesas com pessoal, que caíram nos últimos anos, vão aumentar. A governadora Rosinha Garotinho anunciou reajustes para várias categorias que estavam com vencimentos congelados há anos. Este aumento será parcelado em 24 vezes, sendo apenas seis deles no mandato dela. Ao final do período, as estimativas iniciais eram que o impacto fosse de cerca de R$960 milhões ao ano.

De acordo com o TCE, os gastos com pessoal em 2005 foram de R$7,3 bilhões. Como os dois candidatos prometem acabar com as terceirizações, isso significa mais despesas com servidores já que a mão de obra terceirizada, em geral, recebe menos que os servidores concursados. Em muitos setores, não são feitos concursos há mais de uma década.

O Rio também paga cada vez mais juros sobre sua dívida externa e à União, que alcançava R$44 bilhões em 2005. O pagamento de juros desta dívida chegou a quase R$2 bilhões e respondia por 6,6% da receita total, dois pontos percentuais a mais do que em 1998.

Além do possível déficit e das novas despesas já contratadas, o próximo governador já assume com uma perda de receita de ICMS que pode chegar a R$1 bilhão por ano. Em 31 de dezembro termina a vigência do imposto especial que aumentou em cinco pontos percentuais o ICMS das contas de energia elétrica e telefonia para arrecadar recursos para o Fundo Estadual de Combate à Pobreza (FECP). A alíquota passará a ser de um ponto percentual, igual à dos outros produtos.

O ICMS, principal fonte de arrecadação, é outro problema para o próximo governador. Sem contar o crescimento referente ao aumento causado pela criação do FECP no início do atual governo, a arrecadação deste tributo está em queda há mais de dois anos em termos reais (descontada a inflação). É o único estado da federação que registrava tal fenômeno num período em que a economia nacional teve crescimento em todos os anos.

Dados da Secretaria estadual da Receita mostram que a arrecadação do imposto em 2005, R$13,2 bilhões, foi 2,97% menor que a de 2004, descontada a inflação. A arrecadação acumulada entre janeiro e maio de 2006 foi 3,14% menor que o mesmo período do ano passado, descontada a inflação. Desde junho houve uma recuperação e a queda foi estancada. O governo também contingenciou o orçamento e determinou corte de 25% das despesas de custeio para tentar evitar o rombo.

Educação: queda de 22,15%

A penúria pela qual passam as polícias, as escolas e os hospitais está diretamente relacionada a essa crise na gestão do dinheiro público. Ela levou o governo a reduzir investimentos em setores prioritários. O relatório do TCE mostra, numa comparação entre 2001 e 2005, que o atual governo está gastando menos 22,15% em educação, 18,9% em saneamento e 6,4% em segurança pública.

Os gastos com educação, por exemplo, são percentualmente menores hoje do que eram em 1998, sendo que o número de alunos aumentou mais de 50%. No caso dos transportes, o governo gastou em 2005 menos de metade dos gastos de 1998. Na segurança, os gastos aumentaram mas não resultaram em melhoria dos indicadores de violência, que se mantiveram no mesmo nível ou aumentaram.

O relatório aponta ainda o aumento de gastos, de 98%, na saúde. Mas, descontados os programas que foram agregados ao setor ¿ pagamento de juros do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, Cheque Cidadão, Restaurante Popular etc ¿ houve queda nos gastos do setor, que pode ser sentida no péssimo estado dos hospitais do estado.

Já a misteriosa rubrica encargos especiais teve um incremento de 36,7% de receitas. E o gasto com publicidade passou de R$52 milhões para R$93 milhões no período.

Se o governo vai mal, a economia do estado segue no mesmo rumo. Retirada a indústria petrolífera, que não paga ICMS no local onde o petróleo é retirado, a produção industrial do Rio apresenta queda vertiginosa há três décadas, segundo levantamento do economista Mauro Osório, da UFRJ. Além disso, segundo ele, há decréscimo do PIB na Região Metropolitana, que concentra 75% da população. O PIB cresce no estado como um todo devido ao crescimento do interior. Com isso, o desemprego e a pobreza cresceram.

E como notícias ruins parecem que chegam todas juntas, o preço do barril do petróleo está em queda. Se a tendência se mantiver, o eleito perderá receita de royalties, a única que cresce significativamente e que já representava, em 2005, 13% da arrecadação estadual.