Título: NEM ERA PALOCCI NEM MANTEGA¿
Autor: Tatiana Farah, Cristiane Jungblut e Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 31/10/2006, O País, p. 3

Lula desautoriza Tarso, diz que política econômica é sua e que equilíbrio fiscal será mantido

Um dia depois de ser reeleito, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desautorizou seu ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, que, no dia da eleição, anunciou que a economia mudaria de rumo e que a ¿era Palocci¿ tinha acabado. Lula afirmou ontem que quem comanda a economia é ele e que não existe ¿era Palocci¿ ou ¿era Mantega¿. Segundo ele, o governo manterá as metas de inflação nos mesmos moldes do primeiro mandato.

O presidente deu entrevistas às quatro principais redes de TV do país ontem à noite. Lula disse não ter pressa para decidir o futuro do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e dos outros ministros. Mas não confirmou se Mantega permanecerá no segundo mandato. O presidente também negou que o ex-ministro José Dirceu vá voltar a ter influência no núcleo do governo petista.

Nas quatro entrevistas, Lula mostrou irritação com as especulações sobre a saída de Mantega do Ministério da Fazenda e disse, várias vezes, que ele ficará no cargo ¿até quando ele quiser¿. Chegou a comparar a formação de um ministério com a escalação da seleção:

¿ O Dunga escolhe os jogadores, e eu, os ministros ¿ disse.

Lula ainda se irritou ao falar do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, afirmando que ele ¿instiga para que as coisas não dêem certo¿ e disse esperar que a oposição seja responsável e vote projetos de interesse do país. Sobre o PT, disse que alguns meteram os pés pelas mãos e que o partido precisa de uma direção forte. Trechos das entrevistas à TV Globo, ao SBT, à Bandeirantes e à Record.

ERA PALOCCI: ¿Não teve `era Palocci¿, como não tem `era Guido Mantega¿. Ou seja, a política econômica do nosso governo era determinada pelo governo e, sobretudo, por mim. Nada era feito sem passar por discussão comigo.¿

ERA PALOCCI 2: ¿Nós estamos colhendo hoje coisas que foram plantadas no tempo do Palocci. A política econômica brasileira está mais sólida. Hoje poderemos falar com muita tranqüilidade que nós queremos apostar no desenvolvimento econômico, na distribuição de renda e na educação de qualidade porque nós fomos muito responsáveis na condução da política econômica. Obviamente, todo mundo queria que crescesse um pouco mais e eu também queria, mas não era possível compatibilizar o crescimento com o controle da inflação. Agora eu posso dizer que a economia vai crescer. Os juros estão numa política de descenso e vão continuar caindo. E a inflação vai continuar controlada.¿

INFLAÇÃO X CRESCIMENTO: ¿Não vamos mexer na meta de inflação. A inflação, para nós, é condição básica para manter o poder aquisitivo do povo pobre deste país. O que nós vamos é continuar com a política fiscal responsável, vamos ter meta de inflação e vamos trabalhar para a economia crescer.¿

MANTEGA: ¿Quem ganhou as eleições fui eu. Quem troca ministro sou eu. Quem indica ministro sou eu. Eu não sei por que as pessoas especulam tanto sobre coisas que não deveriam especular. É um problema meu. E eu não tenho pressa. Tenho até o dia 1º de janeiro para indicar o ministério e o Guido Mantega fica no ministério, a política econômica também. Com um atenuante importante: nós vamos incentivar o crescimento da economia. O Guido Mantega é o meu ministro da Fazenda, o Meirelles é o presidente do Banco Central, o Tarso Genro é o coordenador político e a Dilma é ministra da Casa Civil e isso se mantém até que eu decida manter ou não. O que eu não posso é ficar trabalhando na base do palpite. É desagradável que as pessoas ajam com irresponsabilidade e fazendo especulações em áreas extremamente delicadas ¿

REFORMA MINISTERIAL: ¿Não pretendo trocar ministros agora. Não pretendo fazer grandes mudanças (...) Não posso agora parar para ficar discutindo um governo que tenho tempo até 1º de janeiro. De vez em quando, acho que se especula muito, ou seja, convocação da seleção e Ministério no Brasil, todo mundo acha que pode dar palpite. E quem escolhe jogador é o Dunga e quem escolhe os ministros sou eu. Só quero que as pessoas tenham paciência e esperem que eu monte o meu time.¿

FERNANDO HENRIQUE/OPOSIÇÃO: ¿Lamento profundamente que um ex-presidente da República, que deveria ter um pensamento muito mais positivo com relação ao Brasil, ele vive instigando para que as coisas não dêem certo. Mas primeiro acho que oposição é oposição e situação é situação. Isso é no Brasil e no mundo inteiro. Segundo, não tenho projeto de interesse pessoal. (...) Passei oito anos no governo e ele nunca me chamou para tomar um cafezinho. Penso em conversar com ele. Não tenho mágoa das pessoas. Eu, sobretudo, sou um ser humanos civilizado. Portanto, se ele não quiser tomar cafezinho e quiser tomar outra coisa, posso oferecer outra coisa para ele.¿

OPOSIÇÃO 2: ¿Fui oposição muitas vezes, perdi muitas eleições e nunca fui chamado para conversar. Quem ganha governa e acabou. Pretendo, junto com a coordenação política, construir a maioria necessária para votar os projetos necessários e considerados importantes. Tenho amizade com vários deles e vou procurá-los para conversar.¿

O PT NAS ELEIÇÕES: ¿O meu partido ajudou demais. Alguns companheiros do PT meteram os pés pelas mãos. Deveria ser uma campanha de muita tranqüilidade. O PT tem que ter uma direção compatível com sua grandeza. O PT não acabou, como se dizia. O PT precisa ter uma direção muito forte para fazer juz à confiança do povo brasileiro.¿

JOSÉ DIRCEU: ¿O José Dirceu é um homem cassado politicamente. O Zé Dirceu foi cassado por dez anos. Ou seja, nós decidimos quatro meses atrás que o segundo mandato seria desenvolvimento, distribuição de renda e educação de qualidade. (ao negar que Dirceu, que apóia um mandato voltado para o desenvolvimento, possa vir a ter um papel importante na próxima gestão).¿

BRASIL DIVIDIDO: ¿Foi levantado pela oposição que eu queria dividir o país. O resultado eleitoral foi outro. O Brasil está mais unido que nunca.¿

DERROTA NO SUL: ¿Nos estados onde eu ganhei as eleições, ganhei com 70%, 75% e até com 80%. Perdemos nos estados do Sul com uma diferença pequena. No segundo turno, só nós crescemos e crescemos exatamente no Sul do país.¿

PAZ E AMOR: ¿É preciso ter uma relação civilizada. Oposição é oposição, situação é situação em qualquer lugar do mundo. Não existe essa de alguém perder a eleição e governar ou, de quem ganhar, não governar. O que precisamos é ter uma relação civilizada para definirmos corretamente uma separação do joio e do trigo.¿

CONGRESSO NACIONAL: ¿Quando for um projeto para o Congresso Nacional que seja de interesse do Brasil, que as pessoas votem. E depois, se quiserem fazer crítica ao presidente, que façam. A questão da lei geral da micro e pequena empresa precisa ser votada, o Fundo Nacional de Educação Básica precisa ser votado.¿

REFORMA POLÍTICA: ¿A reforma política vai ter de ser votada. Pode não ser aquela que eu sonho, mas acho que será uma que pode ser consensuada entre todos os partidos políticos ou pelo menos pela maioria.¿

BOLSA FAMÍLIA: ¿Ele (o programa) pode melhorar mais (...) O Bolsa Família vai continuar existindo até que a gente consiga diminuir a pobreza nesse país. Fico feliz que por conta do Bolsa Família, por conta do aumento do salário-mínimo, a gente teve em pouco tempo a redução de 19,3% (no número) das pessoas pobres no Brasil. É um alento (...) Vamos continuar trabalhando porque precisamos exterminar a miséria nesse país.¿

SALÁRIO-MÍNIMO: ¿Tenho o desejo e a disposição política para continuar recuperando o poder aquisitivo do salário-mínimo. O salário-mínimo que tem é pouco, porque é mínimo. E nós vamos tentar continuar melhorando o salário-mínimo.¿