Título: ROMPER COM ERA PALOCCI É MUDAR ATUAL POLÍTICA
Autor: Martha Beck
Fonte: O Globo, 31/10/2006, O País, p. 8

`Lula já perdeu eleições por ouvir que a inflação não é tão importante¿, diz economista

Romper com a era Palocci é mudar o rumo da política consolidada ao longo de mais de uma década, de rígido controle monetário para manter a inflação baixa. Mas também é consolidar o poder da corrente de pensamento desenvolvimentista que nunca esteve tão forte no governo nos últimos anos, mas ainda não é hegemônica. Este grupo defende a flexibilização monetária para obter mais crescimento ¿ e diz que não será preciso impor sacrifícios à sociedade, como acabar com os reajustes reais para o salário mínimo. Mas seus críticos, monetaristas, temem a volta da inflação.

¿ Lula já perdeu várias eleições por ouvir que a inflação não é tão importante, como defendiam os desenvolvimentistas. Hoje ele sabe que boa parte da reeleição se deve à inflação baixa ¿ diz o economista Marcio Garcia, da PUC-Rio, para quem o corte de gastos será fundamental para garantir o ajuste das contas públicas e fazer a economia crescer mais no futuro.

Garcia é alinhado com o pensamento monetarista representado no governo pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Este grupo ficou enfraquecido desde a saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda. A política de rigor monetário ganhou força no governo Fernando Henrique Cardoso, depois de disputa entre o ministro Pedro Malan ¿ que venceu a queda-de-braço ¿ com o então ministro do Planejamento José Serra. Este deixou a área econômica e foi posteriormente para a Saúde.

¿ Com a inflação em alta em 2003, Lula também optou por uma política mais conservadora, que derrubou a inflação, fez o risco país cair e também a relação entre a dívida pública ¿ afirma o cientista político Marcelo Coutinho, do Observatório Político Sul-Americano (Opsa).

Para Coutinho, o que está em jogo é a definição de quem vai mandar na economia.

¿ Com a saída de Palocci, o pensamento monetarista perdeu força no governo. Se o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, cotado para substituir Mantega, emplacar, eles voltam a ganhar força ¿ opina Coutinho.

O baixo crescimento da economia em 2005, mais os escândalos de corrupção no governo, provocaram questionamentos sobre a política de rigor monetário e aumentaram o clamor por crescimento. Mantega, um desenvolvimentista, ganhou o ministério com o apoio da ministra Dilma Roussef, da Casa Civil, bem como do presidente do BNDES, Demian Fioca.

Mantega defende queda mais acelerada dos juros para liberar recursos ¿ hoje são destinados cerca de R$150 bilhões para o pagamento de juros da dívida pública ¿ para investimentos capazes de alavancar o crescimento. O economista João Sicsú, da UFRJ, concorda com a tese:

¿ Desenvolvimentismo não significa irresponsabilidade fiscal. Não quer dizer que haverá aumento dos gastos públicos, mas sim que o governo vai acelerar o corte dos juros e fazer investimentos em infra-estrutura ¿ afirma Sicsú.