Título: Lula proíbe divergências públicas
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 02/11/2006, O País, p. 3

Presidente impõe silêncio sobre rumos da economia e cobra propostas de ministros

Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu ontem quatro ministros e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, para discutir uma estratégia que viabilize o crescimento acelerado da economia no segundo mandato sem comprometer a estabilidade. Lula abriu a reunião dizendo que os pilares da atual política econômica não serão alterados, deu prazo de 15 a 20 dias para que os ministros apresentem um documento com propostas de consenso sobre o tema ¿ que será apresentado a governadores, empresários e ao Congresso ¿ e proibiu debates públicos que possam externar divergências internas da equipe na área econômica.

Na abertura da reunião ¿ que teve a presença dos ministros Dilma Rousseff (Casa Civil), Guido Mantega (Fazenda), Paulo Bernardo (Planejamento) e Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento), além de Meirelles ¿ o presidente considerou ¿muito infelizes¿ as declarações do ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, sobre o fim da ¿era Palocci¿. Disse que teve de desautorizá-las publicamente, um dia depois da vitória que garantiu mais um mandato de quatro anos, porque não quer que esse debate seja público enquanto não houver consenso no governo.

Lula advertiu os presentes que não quer mais ver na imprensa ministros expondo pontos de vista divergentes em relação à política econômica. Nos bastidores do governo, as declarações do ministro Tarso Genro foram consideradas inoportunas e capazes de ofuscar o clima de euforia com a vitória do governo nas urnas.

Para a reunião de ontem com o presidente, os ministros e o presidente do BC levaram um conjunto de 50 propostas com diagnósticos sobre a atual situação da economia e medidas capazes de alavancar o crescimento para um patamar mínimo de 5%, nos próximos quatro anos. Lula pediu que as propostas de consenso sejam consolidadas num documento, que servirá de base para uma espécie de agenda de governo no segundo mandato.

O presidente quer discuti-las com governadores, empresários e o Congresso, criando as condições de governabilidade necessárias para que o país cresça.

Bolsa Família vai ser preservado

A receita para destravar o crescimento da economia envolve quatro pilares básicos: área fiscal; área tributária; investimentos públicos, especialmente na área de infra-estrutura; e melhorias na gestão da máquina pública.

¿ É preciso reduzir os custos do investimento. O custo do capital precisa ser reduzido com a adoção de melhores estruturas de financiamento e a criação de fundos de investimento específicos em infra-estrutura. É preciso promover uma desoneração tributária cada vez maior do investimento, resolver alguns entraves institucionais, diminuir a judicialização. Há todo um ritual contestatório nos processos licitatórios que pode adiar ad infinitum o investimento ¿ disse a ministra Dilma Rousseff.

O presidente pediu aos ministros que as medidas venham acompanhadas de um estudo de viabilidade política, para que possa considerar, em sua análise, as chances de aprovação das propostas pelo Congresso.

Entre as medidas já apresentadas pelos ministros estão velhas conhecidas: a prorrogação da CPMF e da Desvinculação das Receitas da União (DRU), que exigem mudanças na Constituição. Elas vencem em 2007 e representam substancial parcela de receitas do Orçamento, no caso da CPMF, e flexibilidade para a execução das despesas, no caso da DRU.

Na reunião com os ministros, Lula também deixou claro que a agenda para alavancar o crescimento da economia deve garantir a preservação dos programas sociais, em especial o Bolsa Família, dos quais ele não abre mão.

O presidente ressaltou ainda que não aceitará qualquer proposta que coloque em risco o controle da inflação, conquista já assegurada no primeiro mandato.

O pedido de presidente para que os ministros apresentem um documento com propostas de consenso sobre os rumos da economia e a presença do presidente do Banco Central na reunião indicam que Lula não está disposto a incentivar as divergências entre os dois grupos que ocupam postos chaves no governo: os chamados desenvolvimentistas e os conservadores.

De um lado, estão os ministros Guido Mantega, Dilma Rousseff, Luiz Fernando Furlan e Tarso Genro ¿ este último não foi chamado para a reunião com Lula. De outro, está o presidente do Banco Central , que conta com o apoio de Paulo Bernardo (Planejamento) dentro do governo e a influência do ex-ministro Antonio Palocci que, mesmo afastado da administração pública, ainda é um interlocutor privilegiado do presidente Lula nas questões relativas à economia, além de petistas de expressão no Congresso, como o senador Aloizio Mercadante.

O grupo desenvolvimentista gostaria de ver Meirelles fora do governo porque considera que o presidente do Banco Central tem poderes excessivos e autonomia total na condução da política monetária.