Título: Cortar para investir
Autor: Carla Rocha, Dimmi Amora, Fábio vasconcellos
Fonte: O Globo, 02/11/2006, Rio, p. 18

Equipe de Cabral negociará na Alerj mudanças no orçamento de 2007 para incluir projetos

Considerada alta por especialistas, a meta do governador eleito Sérgio Cabral de cortar 50% das despesas de custeio vai gerar recursos que poderão dobrar os investimentos do estado. O vice-governador eleito Luiz Fernando Pezão anunciou ontem que, na próxima semana, a nova equipe já começa a discutir mudanças na proposta orçamentária de 2007, que está na Assembléia Legislativa (Alerj). A idéia é incluir projetos do novo governo, que serão executados com verbas obtidas com a redução de gastos, podendo subir para cerca de R$3 bilhões o valor dos investimentos. Ano passado, o governo investiu em obras e compra de material permanente, entre outros itens, R$1,3 bilhão.

¿ A maior parte dos recursos obtidos com a redução de gastos será aplicada em investimentos, na realização do nosso programa de governo ¿ assegurou Pezão.

Ele acrescentou que muitos investimentos serão feitos com a ajuda do governo federal. Nesse caso, os cortes no custeio vão permitir que o estado aumente sua capacidade de contrapartida financeira nos futuros convênios. Pezão ressaltou que a meta é cortar R$3 bilhões, mas somente a partir da próxima semana a equipe de transição começará a ter números mais precisos. O vice-governador argumentou ainda que os recursos virão também da melhora da arrecadação.

¿ O presidente Lula demonstrou interesse em incluir no orçamento federal recursos para o metrô. Dessa maneira, o estado precisará ter recursos para entrar com a sua contrapartida. É essa a nossa intenção. E isso será feito tanto com a redução de despesas, como com a melhora da arrecadação ¿ afirmou Pezão.

Poderá haver cortes de terceirizados

O presidente da Comissão de Orçamento da Alerj, deputado Edson Albertassi (PMDB), admitiu que haverá mudanças no orçamento.

¿ A proposta é reduzir o custeio, mas pode evoluir também para corte de pessoal terceirizado ¿ disse.

Os R$3 bilhões das despesas de custeio que se pretende cortar representam 9% da receita prevista pelo estado para este ano. Para atingir a meta, Cabral já avisou que também quer reduzir o número de secretarias e, conseqüentemente, de pessoas ocupando cargos em comissão. Em abril, a governadora Rosinha Garotinho determinou um corte linear de 25% nas despesas do governo. Técnicos do estado acham difícil que se consiga um enxugamento tão drástico sem afetar os serviços essenciais.

François Bremaeker, coordenador do Banco de Dados Municipais do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam), cita como exemplo o governo federal, que tem muito mais recursos e faz cortes anuais na faixa de R$4 bilhões. Ele lembra que, em geral, os anúncios do novo governo são de cortes rígidos para ganhar margem de negociação com aliados que pedem cargos ao eleito.

¿ É um ato de prevenção política, até que ele possa tomar pé da real situação e ver onde é possível fazer o corte preciso, sem afetar os serviços públicos ¿ disse Bremaeker, que apóia o corte de terceirizados. ¿ Em geral, você gasta mais contratando o terceirizado que fazendo concurso, porque as empresas privadas querem margem de lucro.

Apesar das dificuldades, Armando Cunha, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), disse que o corte de custeio é, hoje, a forma mais eficaz de garantir recursos para investimento, porque o aumento da carga tributária, que já representa no Brasil cerca de 40% do PIB, seria inadmissível.

¿ É preciso apenas ter cuidado, porque os economistas tendem a demonizar o custeio. O foco deve ser as gorduras estritamente administrativas. Se atingirem os serviços diretamente prestados à população, na área de educação e saúde, poderão ser um tiro no pé. Além disso, também é fundamental qualificar as despesas ¿ observou Cunha.

Outro especialista que vê com bons olhos o corte proposto é o professor de administração pública Cláudio Gurgel, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Ele alerta, no entanto, para a importância de fazer escolhas cirúrgicas de investimento num estado que sofre uma série de carências em áreas essenciais.

¿ Reduzir a despesa com terceirização é bom, porque ela guarda características financeiras e políticas geralmente ruins. Pode ter aspectos positivos: priorizar concursos públicos, estabilizar a máquina e também aumentar os recursos para as atividades fins, como os postos 24 horas que ele (Sérgio Cabral) disse que vai criar ¿ analisou.

O deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), membro da Comissão de Orçamento da Alerj, lembra que as contas do governo devem fechar o ano com um rombo de R$2,5 bilhões de restos a pagar. Caso isso ocorra, os investimentos ficarão prejudicados:

¿ Acho importante a medida, porque a situação do estado é de grande dificuldade. O estado chega em 2007 com um rombo de R$2,5 bilhões ¿ disse Luiz Paulo.