Título: RISCO DE PARALISIA NA CASA BRANCA
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 04/11/2006, O Mundo, p. 40

Vitória democrata no Congresso pode acirrar divisões e deixar Bush sem espaço para agir

Ase confirmarem as previsões de que, depois de 12 anos, o Partido Democrata conquistará de novo a maioria na Câmara de Representantes e no Senado nas eleições de terça-feira, os EUA entrarão num período de dois anos que exigirá extrema habilidade de sua classe política para evitar sérias turbulências e inclusive uma eventual paralisia ¿ ou no mínimo um engessamento ¿ do governo.

Essa perspectiva, delineada nos últimos dias por vários analistas, se baseia no clima inflamável da disputa eleitoral ¿ que acabou transformando a votação num referendo sobre o governo de George W. Bush. Seu desfecho, dizem eles, dependerá em grande parte da habilidade do próprio Bush. Além de estar no lado minoritário, encontrará dificuldades nas trincheiras de seu partido.

O presidente, afinal, será tido como o culpado pela derrota. E, castigado dessa forma por ter levado o país à guerra no Iraque, que se torna cada dia mais impopular, ficará mais difícil manter o apoio de muita gente até mesmo do Partido Republicano para levar adiante a atual politica em relação à ocupação daquele país.

¿ Bush terá, obviamente, a capacidade de dizer não às propostas e leis que os democratas aprovarem, vetando-as. Só que, ao mesmo tempo, o presidente não terá a capacidade de dizer sim às suas próprias sugestões e projetos, que serão descartados pela oposição ¿ disse David Gergen, ex-conselheiro da Casa Branca nos governos de Richard Nixon, Gerald Ford, Ronald Reagan e Bill Clinton, hoje professor da Universidade de Harvard.

Ao mesmo tempo, caberá aos democratas expor ao país de forma mais clara e detalhada a estratégia ¿ que permaneceu obscura, pouco palpável, ao longo da campanha ¿ que pretendem colocar em prática, tratando de evitar a criação de um atoleiro. Uma situação dessas poderia, além de aumentar o ritmo do crescente desprestígio dos EUA, minar a economia do país.

Bush teria de ser capaz de criar um clima semelhante ao que Clinton conseguiu depois que democratas perderam a maioria em 1994. Ele estendeu a mão aos republicanos, quando entraram em pauta assuntos do interesse deles. E, ao mesmo tempo, convenceu-os de que o mais importante era o bem comum. O êxito da estratégia ficou cristalizado dois anos depois, quando apesar da maioria republicana no Capitólio, conseguiu a reeleição:

¿ A questão é que não vejo Bush capaz de algo semelhante. E isso se deve ao amargor e à divisão causados por sua radical política de direita implementada. Não é que não possa fazer o que Clinton fez, mas sim que será muito mais difícil. Mesmo porque, Clinton teve seis anos para criar sua base, e Bush só teria mais dois para isso ¿ disse Doug Schoen, que trabalhou para o presidente democrata como pesquisador de opinião.