Título: O clube do milhão da Câmara
Autor: Francisco Leali, Carolina Brígido e Alan Gripp
Fonte: O Globo, 07/11/2006, O País, p. 3

Grupo de 60 deputados eleitos declara gastos milionários em suas campanhas

Um seleto grupo de deputados eleitos em 1º de outubro garantiu uma cadeira no Congresso Nacional após levar às ruas campanhas milionárias. Levantamento feito com base na prestação de contas apresentada pelos candidatos à Justiça Eleitoral revela que 60 dos vitoriosos na disputa para a Câmara declararam ter arrecadado mais de R$1 milhão para cada campanha. A lista das candidaturas milionárias contrasta com a receita pífia de concorrentes eleitos para o mesmo cargo ¿ como o estilista Clodovil Hernandes (PTC-SP), que teve a terceira maior votação do país gastando apenas R$14.300 ¿ a quarta menor.

Ao todo, as campanhas de 479 novos integrantes da Câmara dos Deputados ¿ a prestação de contas de 34 deles não foi divulgada até ontem ¿ somaram R$247,8 milhões em receita. Em média, cada deputado eleito conseguiu arrecadar R$517 mil. O grupo das campanhas caras é encabeçado por dois empresários paranaenses. O primeiro colocado é Alfredo Kaefer, do PSDB, cuja candidatura conseguiu amealhar R$2,951 milhões. Em segundo lugar, com R$2,923 milhões de receita, está Rodrigo da Rocha Loures, do PMDB.

Nos dois casos, as candidaturas foram custeadas basicamente com recursos próprios e de suas empresas. Kaefer é dono do frigorífico Diplomata, dedicado à criação de aves, que atualmente tem cerca de cinco mil funcionários. Rocha Loures é dono da empresa de alimentos Nutrimental ¿ que produz, entre outros itens, as barras de cereal Nutry. O grupo emprega cerca de mil funcionários.

Palocci declara R$2,39 milhões

Para se ter uma idéia do investimento vultoso feito pelos dois, o subsídio atual de um deputado é de R$12.847,20 mensais. Caso sejam mantidos os valores atuais, em quatro anos, o deputado terá embolsado R$668.054,40 ¿ sem contar as outras verbas de auxílio, que podem ou não ser utilizadas pelo parlamentar. O valor é mais de quatro vezes menor do que o investimento feito na campanha de Kaefer para conquistar seu primeiro mandato em Brasília.

A lista das receitas milionárias revela que protagonistas de escândalos recentes não tiveram prejuízo na arrecadação de suas campanhas. O ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci (PT-SP) arrecadou R$2,39 milhões; o ex-presidente do PT Ricardo Berzoini (PT-SP), R$2,06 milhões; o deputado Sandro Mabel, apontado como beneficiário do esquema do mensalão, R$1,67 milhão; e o deputado Jader Barbalho (PMDB-PA), R$1,96 milhão.

A campanha de Berzoini foi custeada por empresas tradicionais, como o grupo Votorantim, que colaborou com R$200 mil; a Construtora OAS, com R$100 mil; e a Santa Bárbara Engenharia, com R$100 mil. O diretório nacional do PT contribuiu com mais de R$400 mil.

Presidente da Câmara arrecadou R$2 milhões

O ranking dos que gastaram mais também conta com políticos experientes, como os atuais deputados Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e Walter Feldman (PSDB-SP). Eles arrecadaram, respectivamente, R$2 milhões e R$2,72 milhões. Paulo Renato de Souza (PSDB-SP), ministro da Educação no governo Fernando Henrique Cardoso, obteve receita de R$2,22 milhões. O maior doador da campanha de Feldman foi a Associação Imobiliária Brasileira, que desembolsou R$350 mil. Paulo Renato foi favorecido principalmente pela siderúrgica Gerdau, que investiu R$100 mil.

A mesma Gerdau colaborou com R$100 mil com a campanha do líder sindical Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), cujos cofres foram abastecidos com R$1,99 milhão. Outro novato no Congresso com receita milionária é Ratinho Júnior (PPS-PR), filho do apresentador do SBT de mesmo nome. Sua receita somou R$2,62 milhões e saiu, em boa parte, do bolso do pai famoso.

Entre as candidaturas mais baratas estão duas do Prona: Enéas Carneiro, de São Paulo, e Suely Santana da Silva, do Rio de Janeiro. Eles se elegeram com apenas R$6 mil e R$6.300 no bolso, respectivamente. O candidato vitorioso que menos arrecadou foi o novato Marcos Antônio, eleito pelo PSC de Pernambuco. Eleito tradicionalmente com o voto de militares fluminenses, o deputado Jair Bolsonaro, do PP, voltou a ter êxito sem precisar gastar muito. Sua campanha foi feita basicamente com recursos próprios e custou R$20 mil.