Título: MULHER PODE SER A 3ª NA LINHA DE PODER
Autor: Helena Celestino
Fonte: O Globo, 07/11/2006, O Mundo, p. 28

Líder democrata na Câmara de Representantes, Nancy Pelosi ficará atrás apenas de Dick Cheney se partido fizer maioria

mulher a chefiar a Câmara

NOVA YORK. Nancy Pelosi diz com todas as letras que George W. Bush é um incompetente. Sem medo da onda direitista que percorre o país, ela defende o direito ao aborto, denuncia os atentados aos direitos humanos pelo governo americano e liderou a campanha na Câmara contra a invasão do Iraque.

Os republicanos adoram fazer piadas com ela, uma sofisticada mulher de 66 anos fascinada por terninhos de grife. Os conservadores não se cansam de lembrar que a base eleitoral de Pelosi em São Francisco é Height-Ashbury, o bairro-símbolo da contracultura e dos valores da esquerda, considerados decadentes e perigosos pelos aliados de Bush. Durante a feroz campanha eleitoral, tentaram colar nela a imagem de extremista que deixará o país indefeso diante dos terroristas e fará avançar toda a ¿agenda gay¿.

Reeleição em São Francisco está garantida

Não pegou. Desafiando os estereótipos, Nancy Pelosi a partir de hoje poderá passar a ser chamada de Madam the Speaker ¿ ou senhora presidente ¿ ao transformar-se na primeira mulher a assumir a Presidência da Câmara dos Representantes nos Estados Unidos, cargo que transforma seu ocupante no segundo na linha sucessória, atrás apenas do vice-presidente Dick Cheney. Se as pesquisas de opinião estiveram certas e o Partido Democrata fizer 15 deputados a mais nas eleições, ela será eleita líder da maioria, marcando a volta do comando democrata na Câmara pela primeira vez em 12 anos. ¿A caricatura que os republicanos fazem de Pelosi não combina com a visão que temos dela aqui. Para São Francisco, ela é moderada: não é uma visionária, mas é muito boa no jogo político¿, disse John Arensmeyer, um militante democrata, ao ¿The Independent¿.

Madam the Speaker evita a linha ¿já ganhou¿. Com a reeleição assegurada ¿ no distrito dela 85% dos eleitores votam nos democratas ¿ faz campanha pelos candidatos do partido furiosamente, pulando de aeroporto em aeroporto. Os republicanos fizeram dela uma estrela dos milhares de anúncios políticos que invadiram a TV, botando-a de cara amarrada, ao lado de Hillary Clinton e Ted Kennedy, alertando os eleitores de que o voto no Partido Democrata significa também eleger ¿esses esquerdistas¿. O problema com a tática é que, fora dos círculos de Washington, Nancy Pelosi não é uma cara conhecida.

¿Dois terços do público não têm idéia de quem eu sou, o que acho uma vantagem. Esses anúncios não falam de mim, mas do Partido Democrata¿, disse Pelosi à revista ¿Newsweek¿.

A imagem da TV não combina com o jeito Pelosi na vida real. Charmosa e rica ¿ é uma das dez maiores fortunas do Congresso ¿ ela adora referir-se à sua vida doméstica nos comícios e sempre repete a pergunta ¿devo falar como mãe de cinco filhos?¿. Gosta de se definir como uma ¿ítalo-americana, católica apostólica romana, mãe e avó¿.

A deputada só começou a vida política depois dos filhos já grandinhos. Elegeu-se pela primeira vez em 1987, aos 47 anos, mas aprendeu tudo sobre o ofício da política com a família: seu pai foi prefeito de Baltimore nos anos 40 e 50. Pelosi reconhece que essa convivência formou o seu estilo político e ajudou-a movimentar-se na Câmara, um clube predominantemente masculino. Nas duas décadas no Congresso, arrecadou milhões de dólares para as campanhas dos colegas, foi extremamente disciplinada e, com esses atributos, pavimentou sua eleição para líder da minoria em 2003.

Pragmática, já declarou não ter a menor intenção de pedir o impeachment de Bush.

¿ Está fora da mesa. Não funcionaria ¿ disse na TV.

Sobre a intenção de abrir investigações para apurar a atuação da Casa Branca no Iraque ou no socorro às vítimas do furacão Katrina, desconversa. Pelo menos, por enquanto.

¿ Ainda nem ganhamos...