Título: SADDAM PEDE RECONCILIAÇÃO AO IRAQUE
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Fonte: O Globo, 08/11/2006, O Mundo, p. 30

De volta ao tribunal, ex-ditador prega perdão a iraquianos. Premier espera execução até o fim do ano

BAGDÁ. Dois dias após ter sido condenado à morte por enforcamento, o ex-ditador do Iraque Saddam Hussein voltou ontem a um tribunal em Bagdá, desta vez respondendo a acusações por ter ordenado um massacre contra a população curda no norte do país nos anos 80. Mais calmo, e num tom conciliatório, o ex-ditador pediu aos iraquianos que se reconciliem.

¿ Convoco todos os iraquianos, árabes e curdos, a perdoar, a reconciliar-se e apertar as mãos ¿ disse Saddam durante a audiência.

Ontem, o primeiro-ministro iraquiano, Nouri Maliki, disse que espera que a execução de Saddam ocorra até o fim do ano.

Numa sessão dramática, o ex-presidente foi condenado à morte, no domingo, por causa do assassinato de 148 pessoas no vilarejo de Dujail, de maioria xiita, em 1982.

No processo alvo da audiência de ontem, ele é acusado de promover a operação Anfal, que, segundo estimativas, matou cerca de 180 mil curdos no norte do país. Se for considerado culpado por genocídio e crime contra a Humanidade, Saddam pode ser condenado novamente à pena capital.

Durante a audiência, Saddam fez citações ao profeta Maomé e a Jesus Cristo, dizendo que ambos pediram perdão a Deus aos que se opuseram a eles.

¿ Os iraquianos precisam seguir esses exemplos. O momento é de perdão e de união ¿ disse ele.

Já as testemunhas de acusação convocadas a depor não tinham o mesmo discurso conciliatório. Qahar Khalil Mohammed, o primeiro a depor, disse que ele e outros homens de seu vilarejo se renderam a soldados iraquianos depois de terem recebido a promessa de uma anistia. No entanto, todos foram enfileirados e fuzilados pelos soldados. A testemunha sobreviveu apesar de graves ferimentos, mas outras 33 pessoas morreram.

Saddam rechaçou o depoimento, mas também sem se alterar:

¿ Ninguém pode confirmar se o que Mohammed disse de fato ocorreu.

A sentença de morte de Saddam provocou uma série de reações dentro e fora do Iraque. Enquanto os xiitas comemoram a decisão da Justiça, os sunitas protestam e dizem que pretendem vingar o ex-líder. Especialistas, no entanto, não acreditam que a sentença seja responsável por um aumento da violência no país, que já é considerada crítica.

Saddam foi condenado a dois dias das eleições parlamentares americanas, que ocorreram ontem, e sua sentença foi amplamente comemorada pela Casa Branca e pelo Partido Republicano. Já a União Européia e a Rússia criticaram a decisão e a ONU pediu que a Justiça iraquiana dê moratória para a sentença de morte.

Especialistas em direito no Iraque afirmam que a decisão está longe de ser posta em prática. Na segunda-feira, foi aberto o prazo de 30 dias para que a defesa faça a apelação da sentença na Alta Corte de Justiça do país.

Mesmo se os magistrados decidirem manter a pena capital, esta precisa, por lei, ser sancionada pelo presidente (que é contra a pena de morte) e por dois vice-presidentes, um sunita e outro xiita. Ainda há a interpretação de alguns juristas de que Saddam só deve ser executado depois de julgado em todos os outros processos que responde, o que poderia levar meses ou anos.

Ontem, os advogados de Saddam, que iriam para a Jordânia, disseram que foram proibidos por forças americanas de deixar a capital do Iraque.

O julgamento do ex-ditador ocorreu em meio a mais um dia de violência no país. Em Bagdá, um homem-bomba matou ao menos 17 pessoas e deixou outras dezenas feridas ontem num ataque em uma rua comercial movimentada.