Título: MINISTRO: PILOTOS ERRARAM AO IGNORAR PLANO DE VÔO
Autor: Alan Gripp e Paulo Yafusso
Fonte: O Globo, 09/11/2006, O País, p. 13

Waldir Pires diz que acusação da empresa dona do Legacy aos controladores de vôo é `absolutamente inadequada¿

BRASÍLIA e CAMPO GRANDE. O ministro da Defesa, Waldir Pires, reagiu ontem à nota da empresa americana, Excel Aire, dona do jato executivo Legacy, que, na véspera, responsabilizou os controladores de vôo brasileiros pelo choque com o Boeing da Gol, causando a morte de 154 pessoas (entre passageiros e tripulantes). Pires disse que as afirmações da empresa são ¿absolutamente inadequadas¿, e que é preciso aguardar a conclusão das investigações da Aeronáutica para apontar os culpados.

A nota da Excel Aire disse que os pilotos americanos do Legacy seguiram a orientação passada pela torre de controle de São José dos Campos, de onde o jato partiu, para seguir a de 37 mil pés de altitude até Manaus. O Boeing da Gol estava na mesma altitude, na direção contrária. A empresa argumentou que as normas internacionais de aviação determinam que as diretrizes das torres de controle se sobrepõem ao plano de vôo escrito.

Queda vertical e perda de consciência

O plano, entregue pessoalmente aos pilotos, determinava que o jato deveria estar a 38 mil pés no ponto onde cruzaria com o avião da Gol. Pires disse que, independentemente do diálogo com a torre, os pilotos do jato não deveriam ter fugido do plano de vôo.

¿ A torre, normalmente, pensa em quando o avião está saindo e qual o destino final, mas não é ela que determina as altitudes e o curso das coisas. Isso é o plano de vôo ¿ disse o ministro.

Pires informou que as investigações da tragédia indicam que, após chocar-se o Legacy, o Boeing iniciou imediatamente uma queda vertical. Segundo o ministro, o avião se partiu e, com a descompressão, os passageiros perderam a consciência em, no máximo, 20 segundos:

¿ Da forma como o acidente se deu, as investigações mostram que o Boeing desceu na perpendicular, com uma velocidade gigantesca. Isso indica que os passageiros quase nem sentiram a queda e teriam perdido a consciência em uma questão de instantes.

A hipótese foi reforçada pela análise das duas caixas-pretas do Boeing ¿ uma com a gravação do som na cabine de comando e outra com os dados técnicos da aeronave, como altitude, localização e velocidade. Há informações, não confirmadas oficialmente, de que a caixa de voz não teria captado sons de pânico ou diálogos depois da colisão com o Legacy. Isso reforça a hipótese de que os pilotos estavam inconscientes durante a queda, que teria demorado entre dois minutos e meio e três minutos.

Em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, o juiz José Henrique Neiva de Carvalho e Silva, da 1ª Vara Cível Residual, disse ontem que vai pedir a ajuda da Justiça dos Estados Unidos para citar e intimar os donos da Excel Aire, dona do Legacy. Em decisão liminar, o juiz já determinou o seqüestro do Legacy e ainda mandou tornar indisponíveis os bens da empresa americana que possam existir no Brasil.

A liminar foi concedida numa ação proposta pelo advogado Danny Fabrício Cabral, em defesa da filha de seis anos do bancário Eduardo Ribeiro de Souza. O bancário foi uma das vítimas do acidente. O magistrado afirmou que aceitou o pedido feito na ação, por entender que manter o Legacy no Brasil seria a única forma de garantir que a autora da ação consiga penhorar bens para assegurar o recebimento de indenização, no caso de sair vencedora no processo. O juiz explicou que a medida é provisória e a decisão final sobre o pagamento da indenização depende de provas, que deverão ser apresentadas no decorrer do processo:

¿ Ainda não se sabe de quem é a culpa, mas reter a aeronave aqui era a única forma de assegurar o pagamento da indenização, caso seja necessário a penhora de bens.

O juiz determinou ainda que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) seja a depositária dos bens. A empresa americana ainda pode recorrer para derrubar a liminar do juiz. Ontem, em Brasília, a comissão que investiga o acidente visitou o Centro Integrado de Defesa e Controle do Tráfego Aéreo (Cindacta 1), responsável por monitorar a região onde aconteceu o choque entre os aviões. A equipe colheu os registros das aeronaves no sistema de controle do espaço aéreo. Amanhã, o grupo ¿ que conta com representantes dos governos dos EUA e do Canadá ¿ irá ao Cindacta 4, em Manaus, de onde partiu o boeing e para onde seguia o Legacy.

(*) Especial para O GLOBO