Título: Uns ganham, outros perdem
Autor: Alessandra Duarte
Fonte: O Globo, 11/11/2006, Economia, p. 47

Celebridades se unem contra lei de pequenas empresas, que reduz verba do Sesc

Desoneração tributária, Sistema S (que inclui Sesc e Senai), micro e pequeno empresário e outros termos de economia entraram no cotidiano da classe artística brasileira. O fim da contribuição das companhias de menor porte ao Sistema S, previsto pela nova Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas - aprovada pelo Senado na quarta-feira, para entrar em vigor em 1º de julho de 2007, e que voltará à Câmara - reduzirá em 30% a receita da entidade. Um abaixo-assinado organizado pelo Sesc e pela classe artística contra a perda de receita já recolheu, nas 27 unidades da rede e em seu site, cerca de um milhão de assinaturas, entre elas as de nomes como Antunes Filho, Fernanda Torres, José Miguel Wisnik, Pedro Luís, Leoni, Renato Vieira, Denise Stoklos e Clarice Niskier. Há também adesão de profissionais do esporte, como Robson Caetano e Luísa Parente.

A lei gerará economia às micro e pequenas empresas, ao unificar tributos no Supersimples. Mas, como efeito colateral, afetará a receita do Sesc, projetada em R$1,4 bilhão este ano. Em 2005, a rede promoveu cerca de 63 mil atividades culturais em todo o país, como peças de teatro. O diretor regional do Sesc-RJ, Dionino Colaneri, diz que, além de determinar a retirada da contribuição das micro e pequenas empresas ao Sistema S, a nova lei também aumenta o número de empresas classificadas nesse porte.

- Nas regiões mais carentes, as conseqüências disso vão ser mais graves, porque já não são muitas as empresas médias e grandes - diz Colaneri, destacando que apenas o serviço odontológico da rede é exclusivo a comerciários, enquanto os outros são abertos ao público. - Com esse corte, teremos de diminuir a oferta de serviços. Ainda é cedo para dizer o que será ou não cortado, mas devemos poupar mais os programas sociais e de saúde.

Lei visou cortar carga tributária

O argumento do Congresso para a retirada da contribuição ao Sistema S (dentro do Supersimples) é desonerar as micro e pequenas empresas - uma emenda parlamentar que deixava fora da lei a retirada da contribuição ao Sistema S não foi aceita. A lei volta para a Câmara porque houve alteração da sua entrada em vigência, de janeiro para julho. Segundo Colaneri, o Sesc estuda com as Confederações Nacionais de Comércio e Indústria que medida legal tomar:

- O artigo 240 da Constituição protege de cortes a arrecadação do Sistema S. Por isso, vamos tentar argumentar que a retirada da contribuição é inconstitucional. Se houver medida judicial, será no Supremo Tribunal Federal.

O diretor de teatro Antunes Filho, que tem seu Centro de Pesquisas Teatrais (CPT) residente no Sesc-Consolação, em São Paulo, considera a aprovação da lei no Senado "uma catástrofe".

- É um naufrágio. Só o que o Sesc fez em relação à gratuidade para a terceira idade é algo pioneiro no país. Esse corte de receita não atinge apenas a instituição, ou o comerciário. Em São Paulo, por exemplo, cada bairro tem um teatro do Sesc - ressalta Antunes Filho. - Estão jogando para o improvável algo que era certo. Parece que as pessoas não conhecem a realidade do Sesc. Por que não vão lá ver o que acontece para depois terem suas idéias? Estou muito chateado.

No Rio, o abaixo-assinado recebeu mais de 50 mil assinaturas. Uma delas foi a da atriz Fernanda Torres.

- O Sesc é formador de público e de atores. Lida com a terceira, a primeira e todas as idades. É um projeto de luxo para todos, dos grupos tradicionais aos de vanguarda, famosos ou não. Você fazer um Tchecov no Sesc é diferente de fazer fora dele, porque ele tem um público que segura a temporada - diz a atriz, que se manifestou contra o fim da contribuição à rede Sesc na entrega do prêmio Bravo, em São Paulo, no fim de outubro. - Mas estive com o pessoal do ministério (da Cultura) esta semana e eles me explicaram que querem melhorar o funcionamento do Sistema S, mas de uma maneira que não se toque no Sesc, porque também acham que ele é exemplar.

O compositor José Miguel Wisnik também lamenta:

- O trabalho social, esportivo e cultural e o retorno efetivo que o Sesc dá à população em serviços diversificados e de altíssima qualidade têm que ser um modelo para o Brasil. Na área musical, ele tem sido uma alternativa permanente ao imediatismo dos meios de massa, com um leque amplo e representativo de artistas de todas as tendências e gerações. Acho patético e inaceitável que se tenha que involuir no lugar exato em que as coisas se mostram mais capazes de avançar.

Diretora ressalta papel para iniciante

A diretora teatral Ana Kfouri diz que, além de ser contra o corte de verba da rede Sesc, é a favor de que a mudança na lei das micro e pequenas empresas seja aproveitada para se incluírem nessa categoria as produções culturais, sobretudo as teatrais, para desonerar a carga tributária delas também:

- Isso prejudica não somente o artista, mas o público.

Para a diretora Bia Lessa, o papel cultural e esportivo do Sesc é essencial, sobretudo para profissionais iniciantes. Ela lembra os circuitos nacionais organizados pela instituição (teatral, chamado Palco Giratório, e musical, ou Sonora Brasil):

- Me assusta a idéia de mexer para pior numa das poucas coisas no Brasil que funcionam.

O atleta Robson Caetano, sócio da microempresa Robson Caetano Produções e da pequena empresa OSC (de consultoria esportiva), diz que a desoneração deve acontecer, mas com o corte de outros impostos:

- Cerca de 14% da arrecadação bruta das minhas empresas vão para pagamento de imposto, mas há outros tributos que não têm o peso da contribuição ao Sesc, como o PIS ou a Cofins.

COM ADIAMENTO, PEQUENAS DEIXARÃO DE POUPAR R$3 BI, na página 48