Título: o PT e o sacrifício
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 16/11/2006, O Globo, p. 2

Para construir com o PMDB um governo de coalizão, o presidente Lula estaria disposto a sacrificar o PT, podando seus espaços e seus projetos. Insinua isso quando diz que seu partido já tem o maior dos cargos, a Presidência, mas tende, por outro lado, a conservar petistas em ministérios estratégicos. Hoje, Lula e a direção do PT têm a primeira conversa depois da eleição sobre o papel do partido no segundo governo.

Ela ocorre em meio a queixas e angústias dos petistas, que ainda não foram ouvidos por Lula mas estão sendo indiretamente informados de que terão que ceder em nome da governabilidade. É óbvio que a situação mudou, que o partido sofreu uma aguda desidratação política a partir da sucessão de escândalos envolvendo seus dirigentes ou representantes no governo. Lula foi reeleito a bordo de uma ampla frente política, por ele mesmo costurada, e que nem tomou forma de coligação formal. Nessa frente destacaram-se forças e atores de outros partidos, sobretudo do PMDB. Para construir agora uma coalizão que garanta a estabilidade político-parlamentar, essas forças terão que estar representadas, guardada a melhor simetria possível com a presença de cada uma no Congresso. É óbvio que o PT, com apenas 16% das cadeiras na Câmara, não pode aspirar à hegemonia no governo.

- Mas isso não pode significar a anulação do PT, que foi o partido mais votado do país para a Câmara - diz uma das queixosas, a líder no Senado, Ideli Salvatti.

Ela irritou o PMDB ao reivindicar para o PT a liderança do governo na Casa, cargo para o qual Lula indicara o peemedebista Romero Jucá. Criando caso com o PMDB, o PT mostra não estar compreendendo a necessidade da coalizão, dissemos aqui ontem. A senadora nega que tenha contestado a escolha e faz outras colocações sobre a relação PT-governo.

- Quando eu reivindiquei para nossa bancada o cargo de líder, estava pensando no ano que vem. Ninguém dissera, pública ou reservadamente, que o presidente indicara o senador Jucá também para o segundo mandato. Pareceu-nos que era para suceder ao Mercadante este ano. o cargo é de livre escolha do presidente, mas nossa postulação é legítima. Quem foi que se expôs o tempo todo no Senado diante da artilharia pesada da oposição? Foi o PT. Uns poucos, é verdade, mas fomos nós que demos a cara a tapa!

Diz a senadora entender perfeitamente a necessidade da coalizão e do compartilhamento do governo, mas que isso está sendo usado para tentar neutralizar inteiramente seu partido.

- o PT não saiu destruído das urnas, ao contrário do que muitos previram. Pelo contrário, foi o partido mais votado para a Câmara e o que teve mais votos de legenda. Mas não podemos abrir a boca que lá vem pedrada, como se nenhuma aspiração nossa fosse legítima. Sou líder da bancada, tenho o dever de expressar os desejos dela.

Queixa-se ainda a senadora da orientação do governo: assim como o convite a Jucá não foi claramente divulgado, ela ainda não sabe que conduta adotar em seu estado em relação ao governador Luiz Henrique, do PMDB, que apoiou Geraldo Alckmin.

- Nos estados, estamos em aproximação com o PP de Espiridião Amin, um PP que busca sua renovação. Quem deve ser nosso aliado? Preciso saber. Não vamos criar caso, mas não peçam nossa auto-anulação.

Estarão com Lula hoje o presidente interino, Marco Aurélio Garcia, e alguns membros da executiva. Queixas, cargos e política econômica vão entrar na conversa. Lula sabe como ninguém tourear o PT. Tenciona fixar os limites do partido no novo governo.