Título: Mais rigor com a corrupção
Autor: Chico Otávio e Heverson Bayer
Fonte: O Globo, 16/11/2006, O País, p. 3

Pesquisa mostra que juízes querem penas mais duras para o colarinho branco

Pesquisa divulgada ontem pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) mostrou que os juízes são favoráveis à aplicação de penas mais severas para agentes políticos apanhados em casos de corrupção e improbidade administrativa. De um total de 3.000 juízes entrevistados em todo o país entre 5 de junho e 17 de setembro, 79,1% defenderam "totalmente" o reforço das penalidades. Outros 16,5% responderam que são "favoráveis" à medida, contra apenas 1,7% que se colocou "contra" ou "totalmente contra".

Ainda pela sondagem, a corrupção foi apontada por 98,5% dos magistrados como o principal entrave para um desenvolvimento social e econômico mais acelerado do Brasil. As respostas mais surpreendentes apareceram no capítulo sobre a legislação penal. Convidados a apresentar propostas na área, 95,6% se declaram favoráveis a penas mais severas para políticos em casos de corrupção. Outros 69% defendem o aumento do limite máximo do cumprimento de pena privativa de liberdade.

Segundo a pesquisa, o avanço da violência está abalando antigas convicções dos juízes brasileiros. A consulta da AMB revela que a categoria começa a abandonar a tradição liberal que prevalecia nos tribunais criminais pelo endurecimento da legislação penal. mais de 60% dos juízes consultados são favoráveis à redução da maioridade penal e 81,5% defendem o aumento do tempo de cumprimento de pena para a obtenção de livramento condicional.

A divulgação desses dados aconteceu pouco antes da abertura oficial do XIX Congresso Brasileiro de Magistrados, que se estenderá até este sábado em Curitiba (PR) com o tema "Desenvolvimento: uma questão de justiça". A cerimônia oficial contou com a participação do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.

A atualização da tipificação dos crimes eleitorais foi outro ponto relevante da pesquisa, conquistando o apoio de 95,4% dos magistrados, seguida pela limitação dos custos das campanhas (92,55%) e pelo aumento de hipóteses de inelegibilidade (91,7%).

Redução da maioridade penal

Ao comentar os resultados da sondagem, o presidente da AMB, Rodrigo Collaço, defendeu uma reforma da legislação eleitoral. Segundo ele, a base em vigor no país não puniria efetivamente. Collaço disse ainda que, se essa reforma já tivesse sido feita, escândalos como o do mensalão não teriam acontecido.

- Não existe punição no campo eleitoral e penal para quem utiliza dinheiro desviado das grandes quantias destinadas para as campanhas, que resultam na criação de caixa dois - disse ele.

O estudo, coordenado pela cientista política Maria Tereza Sadek, da USP, consultou os magistrados sobre política, legislação, trabalho e meio ambiente. Para 86% deles, o excesso de recursos é o aspecto mais importante para a existência da impunidade no país. A demora no encerramento do processo foi apontada por quase 84% dos juízes, enquanto 74% culpam as deficiências do inquérito policial.

A pesquisa abordou também o tempo da maioridade penal. Dos entrevistados, 61% disseram ser "totalmente favoráveis" e "favoráveis" à redução da maioridade penal. E 35,6% se colocaram "totalmente contra" ou "contra" a alteração da legislação.

Na seqüência, a pesquisa enfocou a questão do tempo de internação de menores infratores. De novo, a maioria dos juízes (75,3%) defendeu o aumento desse período, contra 19,3% "totalmente contra" e "contra".

A pesquisa, que vai ser usada como tema de debate durante o congresso, também aborda outros assuntos, como as relações de trabalho, a seleção e a formação dos juízes e a atuação da Justiça Eleitoral e de organizações não-governamentais (ONGs).