Título: 'Sem liberdade, não há Justiça, não há cidadania, não há democracia'
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 20/11/2006, O País, p. 4

Em discurso para magistrados, Roberto Irineu Marinho exalta importância da imprensa livre

CURITIBA. O presidente das Organizações Globo, Roberto Irineu Marinho, defendeu ontem a liberdade de imprensa como valor fundamental para que o país se desenvolva em ambiente democrático. Ao discursar em nome dos homenageados no XIX Congresso Brasileiro de Magistrados, ele enfatizou o papel da imprensa na democracia:

- Nossos governantes e legisladores, ao longo dos anos e cada vez mais, deram-se conta de que a liberdade de expressão é um valor que deve ser preservado de todas as maneiras. Nada pode levar à tentação de legislar visando a restringi-lo.

Roberto Irineu recebeu a comenda da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), também dada à presidente do STF, Ellen Gracie, ao desembargador Cláudio Baldino Maciel, e ao jurista Luís Roberto Barroso. A seguir os principais trechos do discurso de Roberto Irineu Marinho:

"A liberdade de expressão é um valor que deve ser preservado de todas as maneiras"

"Fui escolhido para agradecer, em nome da ministra Ellen Gracie, do desembargador Cláudio Baldino Maciel, do advogado Luis Roberto Barroso e em meu próprio nome, a honraria que hoje recebemos.

Neste congresso, além da felicidade pela premiação, as senhoras e os senhores nos levam também a agradecer o que estamos presenciando. O tema deste encontro não poderia ser mais oportuno: "Desenvolvimento: uma questão de justiça". O Brasil está há muito à espera de um processo auto-sustentado de desenvolvimento (...).

Não poderia, porém, deixar escapar momento tão especial sem falar de um tema caro a todos, tenho certeza: a liberdade de expressão. Apesar de ser uma preocupação comum, falo agora em meu nome, como homem de imprensa.

A defesa que fazemos da liberdade de expressão não significa que nós, jornalistas, estejamos em lugar especial, intocável, acima do bem e do mal. Nesses mais de 80 anos desde a fundação de O GLOBO, veículo pioneiro em nosso grupo, aprendemos cotidianamente que temos responsabilidades e que devemos ser cobrados por elas. Mas nesses mesmos 80 anos aprendemos ainda mais que, sem liberdade, não há Justiça, não há desenvolvimento, não há cidadania, não há democracia(...).

(...) Nossos governantes e legisladores, ao longo dos anos e cada vez mais, deram-se conta de que a liberdade de expressão é um valor que deve ser preservado de todas as maneiras. Nada pode levar à tentação de legislar visando a restringi-lo (...)

Na história de nossas empresas, tomamos, voluntária e muito seriamente, a intenção de, ao sermos livres, sermos justos. Se lei nenhuma pode impor a alguém virtudes que não possui, nosso grupo quer que nossos jornalistas almejem essa virtude. Queremos praticar um jornalismo que busque sempre a correção, que busque a isenção e que se aproxime, o mais que puder, da verdade. Sabemos que a filosofia nos mostra a dificuldade de atingir plenamente essas metas, mas, no jornalismo diário, temos de agir como se isso fosse 100% possível. Somente assim, chegaremos o mais perto possível dos fatos.

Não fazemos isso apenas porque queremos ser virtuosos. Fazemos isso porque, ao longo desses mais de 80 anos, aprendemos que essa é uma exigência dos nossos consumidores: informar com qualidade. sem isso, nós estamos conscientes de que seríamos abandonados e nossas empresas definhariam.

(...) Creio que essa realidade é bem entendida por todos os que fazem parte do que se costumou chamar de "a grande imprensa": ela vive sob essa demanda da sociedade e procura corresponder a ela. Isso não significa que acertemos sempre, mas o fato que se deve aqui sublinhar é que a má-fé nunca está por trás de nossos erros. O jornalismo é sempre uma obra coletiva, um jornal, uma revista, um telejornal são sempre feitos por uma multidão de homens e mulheres. O propósito é informar com correção, mas, como toda obra humana, também o jornalismo não é imune ao erro. Quando, por qualquer razão, falhamos em nossa missão, não há outra saída senão nos corrigir. O que se deve evitar, porém, quando há fatos negativos que contrariem este ou aquele, é ver os fatos como erros, é culpar o mensageiro pela mensagem. É no diálogo sereno e democrático que percebemos a diferença entre uma coisa e outra. Estou certo, porém, que, nesta questão, estamos todos cada vez mais amadurecidos.

Quero crer que a medalha que hoje recebo seja o reconhecimento de que, aos olhos da AMB, nossos veículos de comunicação têm tentado alcançar seus objetivos. Se a homenagem é justa, os senhores e as senhoras poderão avaliar. O que posso dizer é que ela me deixa imensamente feliz."