Título: CPI pode acabar sem descobrir origem do dinheiro
Autor: Bernardo de la Peña e Anselmo Carvalho Pinto
Fonte: O Globo, 14/11/2006, O País, p. 5

Investigações sobre a participação do governo e de prefeituras na máfia dos sanguessugas também não avançaram

BRASÍLIA e CUIABÁ. A CPI dos Sanguessugas corre o risco de chegar ao fim sem avançar nas investigações sobre a origem do dinheiro que seria usado para comprar o dossiê contra os tucanos e as ramificações no governo federal e nas prefeituras da quadrilha que superfaturava ambulâncias. Pelo cronograma estabelecido, a CPI tem reunião administrativa hoje - que dificilmente terá quórum por causa do feriado de amanhã.

Na semana que vem, deverão ser ouvidos os envolvidos. Na reunião seguinte, deve ser ouvido o empresário Abel Pereira, acusado por Luiz Antônio Vedoin, chefe do esquema dos sanguessugas, de ser intermediário da Planam, sua empresa, durante a gestão do tucano Barjas Negri no Ministério da Saúde. Abel nega a acusação e a relação com a Planam. Depois, os trabalhos da CPI ficariam restritos à discussão do relatório final.

Preocupados com os poucos resultados desta segunda fase da CPI, representantes do PPS, do PV e do PSOL se reúnem hoje para discutir a prorrogação dos trabalhos até janeiro.

- Estamos avaliando a possibilidade de prorrogação. Tentamos oferecer resistência para evitar que a segunda fase não dê em nada. Vou procurar os líderes de PSDB, PFL, PMDB e do PT para dizer que isso perante a opinião pública pode ter um custo muito alto se tentarem transformar a CPI num acordão - disse o vice-presidente da CPI, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), que se reúne hoje com o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) e com a senadora Heloísa Helena (P-SOL-AL).

Para ele, as dificuldades não são provocadas por um acordo entre os partidos para inviabilizar as investigações da CPI.

- Não acho que exista acordo. Mas o esfriamento tem efeito equivalente, ainda que não tenha sido combinado.

A CPI já ouviu os últimos três ex-ministros da Saúde. Mas os depoimentos não trouxeram revelações. Barjas Negri, último a ocupar o posto no governo Fernando Henrique, negou irregularidades em sua gestão, mas admitiu ter recebido em seu gabinete Abel Pereira, que teria ido tratar de um convênio para uma obra em Mato Grosso.

Humberto Costa, primeiro ministro da gestão petista, admitiu ter tido encontro com Vedoin no ministério, mas disse que ele foi levado pelo ex-deputado Benedito Domingos (PP-DF). Costa defendeu a regularidade de um pagamento de R$8 milhões à Planam. O ex-ministro Saraiva Felipe (PMDB) disse que nomeou Maria da Penha Lino, ex-funcionária da Planam, para sua assessoria a pedido do deputado José Divino (PMDB-RJ).

A CPI tenta obter na PF mais dados sobre o dossiê. Ontem, Gabeira se reuniu em Cuiabá com o delegado Diógenes Curado, responsável pelo inquérito na PF. Gabeira disse que é grande a possibilidade de o dinheiro ter saído do caixa dois do PT.

- Quem poderia levantar este dinheiro? De modo geral, dinheiro assim vem de afinidades políticas. O problema é que, se de um lado o dossiê interessava em tese ao candidato ao governo de São Paulo (Aloizio Mercadante), de outro o processo foi dirigido por uma equipe do PT. É uma questão delicada - disse.

Piloto que levaria dinheiro trabalha em governo do PT

Os parlamentares requisitaram à PF cópia dos depoimentos do ex-presidente do PT Ricardo Berzoini e do piloto Tito Lívio Ferreira Júnior, que seria o responsável por levar o dinheiro de São Paulo para Cuiabá. Ontem, em Campo Grande (MS), surgiu a informação de que Tito Lívio é funcionário do governo petista no Mato Grosso do Sul. A confirmação foi feita pelo Diário Oficial, que publicou portaria transferindo o piloto, que estava lotado na Agência Estadual de Empreendimentos, para a Assembléia Legislativa. Tito ganha mais de R$4 mil por mês e seu salário continuará sendo pago pela Agência.

Tito não deu essa informação no depoimento que prestou ao delegado Diógenes Curado, na Superintendência da Polícia Federal. Tito disse apenas ter prestado serviço ao governo do estado, até a gestão do governador Wilson Barbosa Martins (PMDB), entre 1995 e 1998.

(*) Especial para O GLOBO