Título: Dilema do câmbio
Autor:
Fonte: O Globo, 17/11/2006, O país, p. 6

As reservas cambiais atingiram o patamar de US$80 bilhões, valor acima de todos os compromissos que o setor público tem a pagar no exterior. A dívida externa do setor privado também se tornou pouco expressiva face ao volume e a receita de exportações gerados anualmente.

Em decorrência desses números, o Brasil paga hoje os mais baixos prêmios de risco na contratação de empréstimos ou venda de títulos em moeda estrangeira, e está a dois degraus do chamado "grau de investimento", classificação que as agências internacionais avaliadoras de crédito atribuem às economias mais seguras para investidores.

Embora não seja um dos objetivos da política econômica, o Brasil vem registrando superávits seguidos em suas transações correntes com o exterior. Na prática, isso significa dizer que as receitas do país em moeda estrangeira, especialmente com exportações, são mais do que suficientes para cobrir os pagamentos de mercadorias e serviços feitos ao exterior. Portanto, sobram dólares na economia brasileira, e, desse modo, o real se mantém valorizado.

A taxa de câmbio no Brasil é determinada pelas condições de mercado (oferta e procura), mas é indesejável uma apreciação demasiada do real, pois o impacto sobre vários segmentos industriais (e mesmo para a agricultura) poderá ser muito negativo. A longo prazo, a cadeia produtiva voltada para as exportações seria atingida, e o país novamente ficaria vulnerável diante de crises no exterior. O Brasil não exporta apenas excedentes: já há diversos segmentos - cujo foco principal é o mercado internacional - que, para crescer e apostar no futuro, precisam investir.

No entanto, o próprio sucesso das exportações impede que o real seja artificialmente depreciado. As importações já vêm aumentando em ritmo acelerado, as taxas de juros estão em queda internamente - o que afugentaria capitais especulativos, mas que não são a causa da apreciação da moeda -, e tanto o Banco Central como o Tesouro têm comprado dólares no mercado para reforçar as reservas cambiais e resgatar antecipadamente a dívida externa. A essa realidade, todos forçosamente têm de se adaptar. Assim, é animadora a reafirmação oficial da manutenção da política cambial.