Título: Com verba pública, em causa própria
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 15/11/2006, O País, p. 3

Comissão de Orçamento aprova aumento de emendas e até destinação para parentes

Os interesses paroquiais mais uma vez prevaleceram no Congresso na votação do relatório preliminar do Orçamento de 2007. A Comissão Mista de Orçamento aprovou, em sessão na noite de anteontem, o aumento do valor das emendas individuais dos parlamentares, de R$5 milhões para R$6 milhões, ampliando essa despesa em R$594 milhões. No auge dos escândalos de corrupção, cogitou-se até o fim das emendas parlamentares, foco de fraudes. Mas agora o Congresso tratou foi de aumentar o valor. Para aprovar o texto, o relator, Valdir Raupp (PMDB-RO), teve que fazer várias concessões, e a principal foi flexibilizar os critérios de repasse de recursos das emendas parlamentares para entidades privadas, em especial as organizações não governamentais (ONGs). Por reComendação da CPI dos Sanguessugas, o relator havia incluído dispositivo no relatório, vetando o repasse de recursos para entidades controladas por parlamentares ou parentes em linha reta ou colateral - ou seja, irmãos, primos, primas etc. A versão aprovada na Comissão Mista restringe o repasse apenas às entidades ligadas diretamente ao parlamentar, ao cônjuge ou a pessoa Com quem mantenha união estável. A medida tem Como objetivo impedir o desvio de recursos do Orçamento por meio dessas entidades, o que foi constatado durante as investigações da CPI das Sanguessugas. No entanto, o relator teve que ceder ao apelo dos próprios líderes dos partidos e tornar as restrições mais brandas. Eles consideraram a regra demasiadamente rígida, citando santas casas e outras entidades Com fins filantrópicos que poderiam ser prejudicadas Com essa norma. O relator-geral do Orçamento era contra o aumento do valor das emendas individuais, mas foi derrotado por parlamentares do governo e da oposição. - Com certeza esse será um Complicador a mais para fechar as contas do Orçamento. O aumento do valor das emendas individuais não vai diminuir as pressões por emendas coletivas - disse Raupp. Ano passado, o então relator do Orçamento, Carlito Merss (PT-SC), já havia negociado um aumento do valor das emendas individuais, cedendo a pressões dos parlamentares. Elas passaram de R$3,5 milhões para R$5 milhões. Mais tarde, o próprio Merss declarou que havia se arrependido de ter feito o acordo, diante das dificuldades para fechar as contas. - O Carlito se arrependeu. Eu fui voto vencido - disse Raupp. O relator estima que precisará "arrumar" cerca de R$10 bilhões em receitas extras ou remanejar recursos da proposta encaminhada pelo governo para fazer frente a despesas do Orçamento ainda sem fontes de recursos asseguradas. A maioria desses recursos seria para as emendas coletivas, em torno de R$7,8 bilhões.

Vice-líder do governo ajudou

O presidente da Comissão Mista de Orçamento, Gilmar Machado (PT-MG), disse que foi contra a flexibilização das regras para emendas para parentes e também contra o aumento do valor das emendas individuais, mas não conseguiu apoio junto à base governista para derrotar a proposta, apresentada pelo deputado Zé Gerardo (PMDB-CE) e defendida pelo deputado Jovair Arantes (PTB-GO). - Fomos derrotados Com votos tanto da base Como da oposição - reconheceu Machado. Entre os que votaram a favor do aumento do valor das emendas está o deputado João Leão (PP-BA), um dos vice-líderes do governo na Câmara. O resultado da votação mostrou que, Com um pouco mais de esforço, o governo poderia ter impedido o aumento do valor das emendas. A proposta foi aprovada na Comissão Com apenas um voto de vantagem sobre os que eram contra o aumento. O presidente da Comissão ainda acredita que poderá Compensar esse acréscimo nas despesas Com um corte no valor das emendas coletivas, hipótese praticamente descartada pelo relator. Para o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, o aumento dessas despesas pode se transformar num "tiro no pé" para o Congresso. Segundo ele, os parlamentares acabarão aumentando receitas para aComodar as despesas novas e o governo, lá na frente, deve cortar essas emendas. - O Congresso tornou o Orçamento rígido e há cada vez menos espaço para investimentos e emendas. O Congresso tem que escolher: ou torna o Orçamento mais flexível ou faz esse jogo de mentirinha, tornando-o uma peça de ficção - afirma Velloso.

PMDB fica Com infra-estrutura

No relatório, Raupp destinou R$5,2 bilhões para Compensar os estados Com as perdas da Lei Kandir, ampliando em R$1,3 bilhão a parcela já destinada pelo governo a esse fim. O aumento faz parte de um acordo Com os governadores, que não aceitam receber em 2007 menos do que a parcela paga este ano para Compensar essas perdas. O presidente da Comissão disse que, da forma Como ficou o texto, há espaço até para elevar ainda mais esse repasse para os estados. Com a aprovação do relatório preliminar, a Comissão Mista pôde abrir o prazo para apresentação das emendas dos parlamentares, que Começou ontem e se encerra no dia 28 deste mês. Também foram escolhidos os relatores setoriais, ficando a sub-relatoria de infra-estrutura mais uma vez Com o PMDB. Na disputa Com o PT, o partido foi vitorioso e nomeou para o cargo de relator setorial o deputado Pedro Novaes (PMDB-MA), que vai cuidar de todas as verbas de infra-estrutura da proposta orçamentária. O relatório ainda tem de ser aprovado no plenário.