Título: Sem trabalho, mas com 13º
Autor: Chico de Gois
Fonte: O Globo, 22/11/2006, O País, p. 3

Senado aprova "gratificação natalina" para o Bolsa Família, Sem receita no Orçamento

Depois de passar a campanha eleitoral cobrando redução de gastos do governo federal, a oposição, capitaneada pelo PFL, impôs ontem uma derrota ao governo Lula ao aprovar no Senado o projeto de Efraim Morais (PFL-PB) que concede um 13º pagamento aos 11,1 milhões de beneficiários do Bolsa Família. Se confirmada pela Câmara, a vitória dos oposicionistas no Senado vai significar um aumento de despesas de R$683 milhões (custo mensal) aos cofres públicos por ano. O governo já gasta quase R$9 bilhões com o programa.

O autor do projeto dizia que a proposta da gratificação natalina era séria e para valer, mas os risos de seus colegas em plenário denunciavam a intenção de impor ao presidente Lula a tarefa de vetar a medida. No plenário do Senado, os governistas desistiram de derrubar a proposta quando viram a oposição unida em torno de sua aprovação.

- O projeto vai aumentar a renda das pessoas e contribuir para a economia - disse Efraim: - Não é muito dinheiro em relação ao Orçamento da União e em se tratando de benefícios. Por acaso o governo está arrependido do Bolsa Família? Temos de colocar os discursos em prática.

Para justificar o projeto, Efraim afirmou ainda:

- Devo dizer que apresentei esse projeto com a consciência tranqüila de quem realmente quer ajudar os que mais precisam. Ainda devo deixar claro que essa idéia surgiu de um cidadão do povo, beneficiário do Bolsa Família, morador da Serra dos Brandões, da cidade de Picuí, na Paraíba. Espero que os companheiros da Câmara, ainda nesta Legislatura, possam, em caráter de urgência, aprovar essa matéria, que irá beneficiar milhões de brasileiros.

Semana passada, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) criticou duramente o Bolsa Família por ser um programa "que vicia", provoca acomodação e não estimula os beneficiários a procurar emprego.

"É uma matéria festiva, Sem efeito"

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), qualificou o projeto de inconstitucional porque, em sua opinião, tem vício de origem, isto é, o Legislativo não poderia criar despesas continuadas para o Executivo Sem apresentar a devida receita. Jucá disse que a aprovação é uma ação política da oposição.

- Este projeto não pode ser levado a sério. É uma matéria festiva, que não terá efeito prático -- afirmou o líder, adiantando que o governo vai trabalhar para derrubá-la na Câmara e que, se necessário, está disposto a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) argumentado sua inconstitucionalidade.

Para que o benefício passe a valer a partir do ano que vem, tem de ser aprovado ainda este ano na Câmara.

O projeto de Efraim Morais foi apresentado em setembro, a poucos dias do primeiro turno das eleições, quando as pesquisas, àquela altura, projetavam a vitória de Lula ainda no primeiro turno. Mas o pefelista refuta a acusação de que sua intenção tenha sido apenas criar um embaraço para o governo:

-- Se o senhor Geraldo Alckmin (PSDB) tivesse vencido as eleições, eu seria governo e, mesmo assim, não retiraria o projeto da pauta.

A matéria estava trancando a pauta e tinha de ser votada ou retirada do plenário. O projeto não passou pelas Comissões de Constituição e Justiça e Assuntos Econômicos, como é praxe, porque o plenário havia aprovado regime de urgência. O líder do governo ainda tentou ontem conseguir a aprovação de um parecer de plenário da CCJ para que algum senador atestasse a inconstitucionalidade da medida, mas não conseguiu.

No encaminhamento da votação, o senador Álvaro Dias, do PSDB, sugeriu que sua bancada aprovasse a proposta. Ney Suassuna, líder do PMDB, liberou a bancada, mas informou que era pessoalmente favorável à medida "em solidariedade ao conterrâneo". O líder do PDT, Osmar Dias (PR), também se mostrou favorável ao projeto, mas liberou sua bancada.

Quando o projeto foi apresentado, o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), disse que sugeriria que seu partido se posicionasse contrariamente. O PSDB, durante a campanha, pregou a redução de despesas do governo federal. Ontem, Virgílio saiu do plenário momentos antes da votação. A atitude do tucano se deu no sentido de não confrontar o PFL e não provocar um racha na oposição. Mas seus liderados comemoraram a derrota do governo.

-- O presidente não disse que queria melhorar o Bolsa Família? -- dizia, sorrindo, Lúcia Vânia (PSDB-GO).

Bancada petista não estava no plenário

Na oposição, o clima era de festa. Efraim Morais foi cumprimentado festivamente por Heloísa Helena (PSOL-AL), por exemplo. Não faltaram discursos inflamados, sorrisos e abraços de senadores apoiando a proposta de Efraim de ajuda aos mais necessitados.

Na hora da votação, a maioria da bancada do PT não estava em plenário. A líder, Ideli Salvatti (SC), estava ausente, preocupada com a CPI dos Sanguessugas, como disse depois. Sobrou para Sibá Machado (AC).

- Disse que o PT era contrário, mas quando a água corre para um lado, não adianta lutar contra -- afirmou Sibá.

COLABOROU: Adriana Vasconcelos

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