Título: Serra, Aécio e o PSDB
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/11/2006, O GLOBO, p. 2

O PSDB pode ser visto neste momento através de três entidades distintas: José Serra, Aécio Neves e os demais tucanos. Sobre todos eles paira o espírito de Fernando Henrique, mas esse já não pertence ao mundo da disputa de poder. Aproveitando-se das distinções, o presidente Lula tenta enfiar uma cunha no partido, atraindo alguns tucanos para uma política de distensão.

Ontem mesmo, ao dizer que só não conversará com ele quem não quiser ¿fazer política civilizada¿, afirmou ter uma relação muito boa com Aécio e Serra. Fernando Henrique nada perde ao recusar a conversa, mas os que ainda estão na estrada foram postos no dilema. E se houver mesmo o convite ao presidente do partido, Tasso Jereissati, para uma conversa ¿institucional¿ no Planalto? Isso alguns tucanões iriam discutir ontem à noite em São Paulo, numa reunião de que participaria FH.

Mas voltemos a Serra e Aécio, à impressão de distância que pode ser falsa. A especulação de que poderia deixar o PSDB e entrar no PMDB para disputar a Presidência em 2010, num acordo com Lula, persegue Aécio há alguns meses. Também por isso, para calar os intrigantes, na campanha ele carregou Geraldo Alckmin como um piano em Minas, embora ele tenha encolhido no segundo turno. ¿Milagres a gente não faz¿, disse depois. Mas, neste momento, Serra parece muito mais ¿descolado¿ do partido do que Aécio. Não por conta da especulação de que pretenda construir um outro partido de centro-esquerda. Fazer partido não é fácil, ainda mais a curto prazo. Nem só apenas pela discrepância com parte da bancada e com Fernando Henrique, ao dizer que está disposto a conversar com o presidente sobre assuntos de interesse do país. O descolamento se explicita mais é na formação de seu secretariado, composto por nomes de alto nível técnico, mas de tênue marca partidária. Quase todos o acompanham a longo tempo, como o secretário de Fazenda, Mauro Ricardo. São mais serristas do que tucanos, no dizer de um alckmista. Alckmin, por sinal, está amargurado com seu alijamento do processo de composição do governo. Tem dito que até o PFL foi mais ouvido do que ele. Mas, depois que tirou Serra da disputa presidencial com modos de trator, não poderia esperar indulgência. Quem conhece Serra sabe que, em breve, ele controlará o PSDB paulista, ainda muito ligado a Alckmin, ao mesmo tempo em que pilotará a poderosa máquina do governo paulista, mantendo ainda forte influência na prefeitura. Mas, para muitos, ele está adotando uma postura pouco partidária, que pode ser prejudicial a seus planos para 2010.

E o que faz Aécio? Tem sido muito mais solícito com o partido. Age fraternalmente com os governadores eleitos, cedendo ou indicando nomes para seus governos, dando-lhes consultoria sobre o choque de gestão que aplicou em Minas. E não faz isso só com tucanos, mas também com os de outros partidos, como Paulo Hartung e Sérgio Cabral, do PMDB. Neste fim de semana ele embarca para Washington levando Cabral junto. Vai lhe abrir algumas portas no BID, onde tem bons contatos. Vão jantar na casa do presidente da instituição, Luis Alberto Moreno. Ao mesmo tempo, articula com os outros governadores da oposição um movimento para exigir concessões do governo Lula na hora em que este precisar aprovar a nova DRU e a prorrogação da CPMF. Serra passa ao largo disso. Com Lula, Aécio tem sido mais áspero do que na hora dura da crise. ¿Pelo que tenho dito, acho que ele (Lula) não vai me chamar para conversar¿, disse por estes dias. Mas Lula vai chamá-lo, e em breve.

Não nos iludamos, entretanto, sobre as diferenças entre Aécio e Serra. Elas podem encobrir algo de que muitos desconfiam: um acordo que já teriam firmado com vistas a 2010 e que não vão explicitar agora. Quem viver verá