Título: JOAQUIM BARBOSA ACUSA EX-PRESIDENTE DO SUPREMO DE TRÁFICO DE INFLUÊNCIA
Autor: Carolina Brígido
Fonte: O Globo, 24/11/2006, O País, p. 13

Segundo o ministro, Maurício Corrêa ligou para sua casa e pediu pressa em ação

BRASÍLIA. A sobriedade do Supremo Tribunal Federal (STF) foi quebrada ontem por um desentendimento entre o ministro Joaquim Barbosa e o ex-presidente da Corte Maurício Corrêa. Durante o julgamento de uma desapropriação de terras feita pelo Incra, Barbosa acusou Corrêa, um dos advogados da causa, de tráfico de influência.

O ministro contou, indignado, que recebeu em casa um telefonema do advogado pedindo para colocar o caso em pauta logo. Corrêa se ofendeu com os comentários e anunciou que pretende "tomar providências legais" contra o ministro.

- Ele tomou a liberdade de ligar para a minha casa pedindo urgência para esse caso. O tribunal precisa tomar medidas sérias com relação a esse tipo de tráfico de influência. Se ele está atuando indevidamente, está praticando tráfico de influência e isso deve ser apurado - afirmou Barbosa, em tom exaltado, durante a sessão de ontem.

Quando o ministro fez a acusação, Corrêa não estava no plenário, e sim um outro advogado da causa. Avisado por telefone, o ex-ministro se deslocou até o tribunal a tempo de acompanhar o restante da sessão. Um funcionário do cerimonial chamou-o para conversar reservadamente com a presidente da corte, ministra Ellen Gracie Northfleet, para quem o ex-ministro entregou um documento comprovando ser advogado autorizado a atuar na causa. Ellen Gracie teria convencido Corrêa a não estender a discussão no plenário, para não criar um constrangimento ainda maior.

Após a sessão, Corrêa cumprimentou os demais ministros e deixou o plenário na direção oposta de seu algoz. Ao sair, o ex-ministro não escondeu a indignação provocada pelos comentários de Barbosa. Afirmou que estuda entrar com representações contra o ministro no próprio STF, no Ministério Público Federal ou na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

- Achei que foi uma descortesia, uma irresponsabilidade de um ministro que ficou com os autos bastante tempo. Ele fez uma afirmação desprimorosa sem nem ter lido os autos direito - disse.

O ex-ministro admitiu ter telefonado a Barbosa, mas negou ter feito qualquer tipo de pressão. Disse que ligou apenas uma vez, para saber quando o caso seria julgado. Alegou ainda não saber de onde era o telefone Ö se da residência ou do gabinete.

Maurício Corrêa aposentou-se compulsoriamente do STF em maio de 2004, quando completou 70 anos de idade. De acordo com a reforma do Judiciário, promulgada em dezembro de 2004, juízes só poderiam advogar em tribunais que atuaram pelo menos três anos após a aposentadoria. Como Corrêa deixou o STF antes da reforma, a regra não valeria para ele. O ex-ministro concorreu nas eleições deste ano ao cargo de vice-governador do Distrito Federal pelo PMDB. Saiu derrotado.

Na ação discutida ontem, ex-donos de terras desapropriadas no Paraná, em 1974, pedem para ser indenizados pela União. As cifras podem chegar a R$100 milhões. Quatro ministros concordaram com o pagamento. Barbosa votou contra e o julgamento foi interrompido por um pedido de vista da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha.