Título: Futuro secretário acusado de compra de voto
Autor: Dimmi Amora, Fábio Vasconcellos e Luiz Ernesto
Fonte: O Globo, 24/11/2006, Rio, p. 20

Alcebíades Sabino, que assumirá pasta do Trabalho, pode ser impedido de assumir cargos públicos pelo TRE

O deputado eleito para a Assembléia Legislativa (Alerj) Alcebíades Sabino (PSC), apresentado ontem pelo futuro governador Sérgio Cabral como o próximo secretário estadual de Trabalho, responde a ação no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio por captação de sufrágio (compra de votos) nas últimas eleições. Nessas situações, a lei prevê que se condenado, o réu perca o mandato. O juiz também pode, na sentença, proibir o condenado a ocupar funções públicas por determinado período. Outro futuro secretário de Cabral, Júlio Lopes (transportes) enfrenta uma investigação no Supremo Tribunal Federal (STF) por uma operação no mercado financeiro.

Em caso de condenação ainda cabem recursos. Mas o TRE informou que, em casos como o de Alcebíades, o mandato ou cargo público não podem ser exercidos até o julgamento do mérito. A ação deveria ter sido julgada segunda-feira passado. Mas o desembargador Luiz Felipe Francisco, que relata o caso, adiou o julgamento para o dia 27 à pedido do advogado. O caso será submetido a dois desembargadores, dois juízes e dois advogados indicados pela OAB.

Sabino, duas vezes prefeito de Rio das Ostras e ex-subsecretário estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, diz que é inocente. E que provará isso na Justiça.

- Não tenho dúvidas sobre qual será o resultado do julgamento. Minha vida e minha conduta política sempre foram bem claras. Fui eleito com 66 mil votos em 87 municípios. Por que haveria irregularidades numa única cidade? - disse Alcebíades Sabino.

A denúncia contra o futuro secretário partiu do Ministério Público Eleitoral. Na representação ao TRE, o MP Eleitoral acusa Alcebíades Sabino e a deputada federal eleita Solange Almeida (ex-prefeita de Rio Bonito) de tentarem comprar votos em Silva Jardim. Como provas, o MP informava que apreendeu com integrantes da campanha lista contendo nomes, endereços de votação de eleitores, material de campanha e R$3 mil em notas de R$20.

Procurador pede inquérito sobre Júlio Lopes

Alcebíades Sabino não é o único secretário de Cabral com problemas fora do governo. Semana passada, a coluna de Ancelmo Gois, do GLOBO, revelou que em outubro a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) proibiu o deputado federal Júlio Lopes (PP) de exercer cargos em empresas de capital aberto por cinco anos. O motivo foi uma operação financeira feita por Júlio, em 1998 para comprar o Liceu Franco-Brasileiro, considerada irregular.

Júlio lançou R$12 milhões em debêntures (espécie de empréstimo de longo prazo) para comprar o Liceu. As debêntures seriam pagas ao longo de oito anos. Segundo ele, a compra foi contestada na Justiça e, depois de 3 anos e meio, os pagamentos foram suspensos.

Segundo ele, a ação na CVM trata das garantias dadas para a operação. O terreno do colégio, por ser muito antigo, tem problemas no registro e não foi aceito. Em maio, com as informações da CVM, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, pediu ao STF abertura de inquérito para investigar o deputado "pela emissão de debêntures sem a correspondente garantia real".

- A condenação da CVM foi relativa à garantias, que são os imóveis do colégio. Estou recorrendo na instância administrativa. O importante é que o dinheiro do empréstimo foi usado integralmente para a sua função, ou seja, a compra do colégio - disse Júlio que tornou-se deputado em 2002.

PSDB dividido na escolha de Paes

Sucessão de Cesar Maia estaria por trás de descontentamento

O convite de Sérgio Cabral ao deputado federal Eduardo Paes para a Secretaria de Turismo, Esporte e Lazer criou uma rusga na executiva do PSDB no Rio, que discutiu o assunto anteontem. Os tucanos se dividiram sobre a conveniência de o partido participar do governo. Entre os membros da executiva com mandato, apenas dois se disseram favoráveis. Mesmo assim, os dois eram nomes ligados a Eduardo Paes: a vereadora Andrea Gouvêa Vieira e o deputado estadual eleito Pedro Paulo. No encontro, foi sugerido que o ex-governador Marcello Alencar, presidente de honra do partido no Rio, que está internado, fosse consultado, o que não aconteceu.

- O convite de Sérgio Cabral não foi formulado ao PSDB, mas ao deputado Eduardo Paes - disse ontem o vice-prefeito do Rio, Otávio Leite.

Outro motivo de descontentamento do PSDB é que Paes será responsável pelo acompanhamento das obras dos Jogos Pan-Americanos e ganhará projeção para tentar disputar as eleições para a prefeitura em 2008. O PSDB tem quatro pré- candidatos: o próprio Eduardo Paes; o vice-prefeito e deputado federal eleito Otávio Leite; o deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha; e Andrea Gouvêa.

Paes deu outra versão:

- Tivemos uma ou outra manifestação contrária. O PSDB entende a necessidade e composição de forças.

Já Cabral elogiou seu secretário:

- Ele terá um desafio muito grande, que são os Jogos Pan-Americanos. Escolhi um político que tem a cara do Rio e já mostrou competência como administrador - disse Cabral, lembrando que Paes foi secretário municipal de Meio Ambiente e subprefeito da Barra.

Em meio à polêmica, o prefeito Cesar Maia, que teria enviado recados a Sérgio Cabral de que a relação entre ambos poderia azedar caso Eduardo Paes fosse confirmado secretário, negou ontem em público ter qualquer restrição a nomes:

- São atribuições exclusivas do governador escolher os seus secretários.

Em relação ao fato de Eduardo Paes ser pré-candidato à sua sucessão em 2008, Cesar Maia minimizou a situação:

- São quatro pré-candidatos: Luiz Paulo Conde, Benedita da Silva, Eduardo Paes e Carlos Minc. A disputa será entre eles para ver quem aparece mais.

Secretariado já tem dez políticos

Sete partidos foram contemplados com cargos na cúpula do próximo governo

Faltando apenas nomear para o primeiro escalão o futuro secretário de Fazenda, o governo de Sérgio Cabral terá, no total, 18 secretarias, nove a menos que o de Rosinha Garotinho. A redução poderia ter sido ainda maior. No primeiro dia após ser eleito, Cabral chegou a afirmar que pensava em 15 ou 16 secretarias. Mas a composição política pode tê-lo impedido de concretizar o plano.

Dos 17 secretários já apresentados, nove são políticos profissionais. São deputados federais, estaduais e ex-prefeitos, que pertencem a partidos que apoiaram a candidatura de Cabral. Foram contemplados PT, PSB, PSDB, PP, PSC, PMN além do PMDB, partido do futuro governador.

Mesmo atendendo às indicações políticas, Cabral conseguiu colocar técnicos em postos importantes, como nas secretarias de Segurança, Saúde e Educação. Se for mesmo confirmado na Secretaria da Fazenda, o ex-chefe do Tesouro Nacional Joaquim Levy será outro especialista a participar do governo.

De acordo com cientistas políticos, Cabral vem conseguindo unir políticos a especialistas de peso que estavam afastados da vida pública estadual.

Para o professor de ciência política Octavio Amorim Neto, da Fundação Getúlio Vargas, o secretariado de Cabral reflete realismo político, porque agrega boa parte dos partidos que participaram da campanha e também uma melhoria dos quadros técnicos. Neto considera importante o relacionamento do governador eleito com o governo federal. Segundo ele, esse sempre foi um dos grandes problemas do estado nas últimas décadas.

- É preciso quebrar esse ciclo, pois quem mais perde com ele é o Rio. É fundamental que os líderes fluminenses entendam que o estado está numa situação econômica muito frágil. E que cooperar mais com Brasília, ainda que não ajude a promover algumas ambições políticas, contribuirá para que o estado retome o crescimento econômico - diz Neto.

De acordo com o professor da FGV, além do desafio de administrar o Rio, a formação de um secretariado composto por personagens da política tradicional do estado pode também trazer problemas. Neto destaca principalmente a troca de favores.

- Apesar dos pontos positivos já apontados, o gabinete do futuro governador abriga representantes da tradicional política de varejo, preocupados mais com o uso de recursos orçamentários para fins políticos do que com programas que promovam o desenvolvimento sócio-econômico fluminense - explica.