Título: VITÓRIA DE CORREA PROVOCA TENSÃO NO MERCADO
Autor: Mariana Timóteo da Costa
Fonte: O Globo, 28/11/2006, O Mundo, p. 29

Esquerdista amplia vantagem e reafirma propostas polêmicas. Consultoria classifica títulos do país como os mais arriscados

QUITO. Um dia após ser eleito presidente do Equador ¿ com uma vantagem que se confirmava, com 70% dos votos apurados, mais ampla do que a indicada nas pesquisas de boca-de-urna ¿ o nacionalista de esquerda Rafael Correa fez questão de reafirmar suas polêmicas propostas de governo, o que provocou tensão nos mercados internacionais e dúvidas internas se o novo governante conseguirá trazer estabilidade ao país e, principalmente, cumprir o mandato de quatro anos. Com 61,8% da preferência popular, contra 38,2% de Álvaro Noboa, segundo resultados parciais, Correa aproveitou para reafirmar a intenção de ¿mudar radicalmente, porém com serenidade e postura conciliatória¿, o país. Mas não são todos os que compartilham de sua certeza.

O novo presidente disse que não renovará, em 2009, o contrato com os EUA que permite a ocupação da Base Aérea de Manta, no oeste do país, usada como centro de operações contra o narcotráfico.

¿ Quero construir ali um aeroporto transcontinental, que ligará o Equador à Ásia e poderá ser usado por todos os países da América Latina para escoar seus produtos ¿ afirmou.

Correa já havia defendido ¿a soberania em Manta¿, dizendo que, ¿se os EUA quisessem continuar em solo equatoriano¿, teriam também que ¿deixar o Equador ter uma base em Miami¿. Outra questão abordada pelo presidente, que provoca calafrios nos investidores, é a pretensão de não pagar ou realizar uma auditoria na dívida externa, de US$12 bilhões. Como ministro da Economia, em 2005, Correa já havia mandado o ¿FMI tomar Valium¿ (calmante) e, agora presidente, diz que ¿há coisas mais importantes a fazer¿ ¿ como reduzir em até 12% os impostos e oferecer microcréditos aos equatorianos.

Noboa afirma que vai pedir recontagem dos votos

O mercado reagiu mal. A consultoria americana Credit Market Analysis divulgou ontem um cálculo de que os títulos da dívida externa do Equador se tornaram os mais arriscados do mundo para os investidores.

¿ Algumas idéias de Correa são bastante interessantes, mas ele terá que tomar cuidado com o que diz e faz, se quiser permanecer no cargo e realmente levar o Equador ao desenvolvimento ¿ afirmou ao GLOBO o cientista político e ex-ministro de Governo Vladimiro Álvarez.

Na política externa, outra preocupação: como Correa renegociará os contratos das empresas petrolíferas que têm investimentos no país, como a Petrobras. O novo presidente da Petroecuador, já nomeado por Correa, é Carlos Pareja, que disse que ¿o país buscará contratos com exploradoras e empresas de refino que forem mais vantajosos para o país¿. Como o Equador não tem a infra-estrutura para explorar nem refinar petróleo, precisará atrair empresas estrangeiras.

¿ Pode ser a PDVSA (venezuelana), a Petrobras ou empresas americanas ¿ afirmou.

Mas nenhum desafio à estabilidade é maior do que a intenção de Correa de convocar uma consulta popular para criar uma Assembléia Constituinte.

¿ Estamos tensos sobre como ele fará isso, já que, pela própria Constituição, o Congresso precisa estar de acordo com uma consulta popular ¿ afirma Álvarez, lembrando que o partido de Correa, a Aliança País, não tem bancada no Parlamento.

Enquanto isso, o candidato do Prian, Álvaro Noboa, continuou recusando-se a reconhecer a derrota e a insistir que foi vítima de fraude ¿ o que foi completamente descartado pela Organização dos Estados Americanos. Noboa solicitou a seus simpatizantes que esperassem até o resultado oficial, previsto para hoje. O candidato afirmou que pedirá recontagem.