Título: PAPA APÓIA ENTRADA DA TURQUIA NA UE
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Fonte: O Globo, 29/11/2006, O Mundo, p. 33

Pontífice inicia tensa visita ao país sob proteção de 15 mil policiais e surpreende ao pregar conciliação

ANCARA. Com um forte aparato de segurança e um surpreendente discurso conciliatório na bagagem, o Papa Bento XVI desembarcou ontem na Turquia para uma visita oficial de quatro dias, em meio à apreensão de católicos do mundo todo, aos protestos de islamistas e ao ceticismo de políticos e da imprensa turca. Assim que chegou, o Pontífice foi recebido, num encontro marcado de última hora, pelo primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan, e tratou de mostrar imediatamente que o tom de sua viagem era de diálogo e entendimento: afirmou que o islamismo é uma religião de paz e que apóia o ingresso da Turquia na União Européia (UE). Quando cardeal, Bento XVI se manifestou contrário à entrada dos turcos na UE.

- Queria vir à Turquia porque ela virou uma ponte entre religiões. O objetivo desta visita é o diálogo, a fraternidade, um compromisso entre as culturas, entre as religiões, pela conciliação - disse o Papa.

Erdogan recebeu o Pontífice na escada do avião, rompendo o protocolo e demonstrando uma receptividade que contrasta com a frieza de suas declarações anteriores à visita, alegando que não receberia o líder católico por motivo de agenda. Após o encontro, as declarações do primeiro-ministro deixavam claro que as tensões entre ambos deram lugar ao otimismo nas relações.

- A mensagem mais importante que o Papa deu foi para o Islã. Ele reiterou sua visão do Islã como pacífico e terno. Disse ainda que, apesar de não ser político, espera que a Turquia entre na UE - contou o primeiro-ministro.

Enquanto o campo diplomático foi marcado pelo tom amigável, no aeroporto e no trajeto do Pontífice em Ancara o esquema era de guerra. Cerca de 15 mil policiais e agentes de inteligência tomaram conta de ruas, estacionamentos, lojas e janelas dos prédios. Manifestantes foram revistados e uma equipe procurou bombas e armas em pontos estratégicos. Os policiais também montaram barreiras para evitar que as manifestações ficassem próximas dos locais por onde passaria a comitiva. Em vez do tradicional papamóvel, Bento XVI foi levado em um carro blindado fechado.

O forte esquema de segurança fez com que as manifestações reunissem apenas algumas centenas de pessoas e não registrassem incidentes. Segundo os jornais turcos, as primeiras palavras de Bento XVI ainda no aeroporto ajudaram a conter os manifestantes.

- Seu discurso na Alemanha apoiava um choque de civilizações, mas nas declarações de hoje ele aparentemente apóia uma aliança de civilizações. Isso é muito positivo - disse o ativista muçulmano Cemal Usak.

Além do encontro com o primeiro-ministro, o Papa conversou por telefone com o presidente turco, Ahmet Necdet Sezer, e visitou o mausoléu de Mustafá Kemal Ataturk, fundador da Turquia. No fim do dia, se reuniu com o diretor de Assuntos Religiosos do governo turco, Ali Bardakoglu, um dos mais fortes opositores da visita do Papa. No entanto, a exemplo do encontro com Erdogan, o clima também foi de conciliação.

- As religiões são feitas para a paz e a reconciliação e não deveriam ser interpretadas de outra maneira - declarou Bento XVI, num discurso improvisado, transmitido ao vivo pela TV turca.

Bardakoglu elogiou a atitude do Papa e disse que sua vontade de diálogo só pode ser vista como um sinal positivo.

- Nós também favorecemos o diálogo entre as religiões, que deve ser feito sobre bases sólidas. Sua atitude é muito importante - disse.

Hoje, o Pontífice visita as ruínas de Éfeso, onde se acredita que tenha morrido a Virgem Maria. Em Istambul, onde chega à noite, está um de seus compromissos mais importantes: um encontro com Bartolomeu I, patriarca de Constantinopla e líder espiritual de 250 milhões de cristãos ortodoxos, para tratar da unidade cristã. Segundo analistas, a união das igrejas cristãs é um dos temas mais importantes do pontificado de Bento XVI.

O objetivo da visita é o diálogo, a fraternidade, um compromisso entre culturas e religiões

BENTO XVI