Título: DESEMBARGADORES SE RECUSAM A CORTAR SALÁRIOS
Autor: Carolina Brígido
Fonte: O Globo, 30/11/2006, O País, p. 15

Presidentes dos 20 tribunais que têm juízes e servidores ganhando acima do teto não vão cumprir determinação do CNJ

BRASÍLIA. Os presidentes dos 20 tribunais de Justiça que pagam salários superiores ao teto estadual do Judiciário, de R$22.111, se recusaram a cumprir a determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de cortar os excessos das folhas de pagamento. De acordo com um levantamento feito pelo conselho, há 2.978 servidores de tribunais, entre magistrados e funcionários da ativa e aposentados, recebendo supersalários. Ontem, os representantes dos tribunais questionaram o resultado do estudo do CNJ e anunciaram que vão refazer os cálculos para verificar se alguém foi incluído na lista de privilegiados indevidamente.

¿ Vamos recalcular o que o CNJ estabeleceu. O conselho não tem sempre razão. Se tiver, podemos tomar a providência pedida ¿ disse o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Celso Limongi. Ele comanda um tribunal onde há 1.208 magistrados ou servidores recebendo salários acima do teto. No TJ-SP é pago o maior salário do país, de R$34,8 mil, maior até que o de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

No Rio, 219 servidores e juízes ganham além do teto

Os presidentes comunicaram à ministra Ellen Gracie Northfleet, presidente do CNJ e do STF, a decisão de não acatar imediatamente a determinação superior. Segundo Celso Limongi, os cálculos deverão ser finalizados apenas em janeiro. Por isso, a determinação de efetuar os cortes nos salários a serem pagos em janeiro não poderá ser cumprida.

¿ O cálculo (do CNJ) pode ter sido feito sem considerar verbas a que se tenha direito. Vamos estudar caso a caso. Pode ser que haja verba que possa ultrapassar o teto ¿ disse Limongi, negando ao Conselho o direito de determinar medidas a serem cumpridas pelos tribunais.

O desembargador também informou que os servidores prejudicados com a ordem de redução salarial deverão entrar com ações na Justiça para manter a situação atual. Para Limongi, apenas o STF tem poderes para decidir se os cortes são ou não devidos. Os presidentes de tribunais divergem do CNJ por achar que os beneficiados com salários acima do teto têm direito adquirido.

¿ O STF vai dar a palavra final. Certamente, haverá ajuizamento de ação coletiva caso os tribunais avaliem que o CNJ não interpretou corretamente a determinação constitucional ¿ informou Limongi.

Na reunião de ontem, Ellen Gracie entregou a cada um dos presentes uma cópia do estudo feito pelo CNJ. No Rio, há 219 magistrados e servidores recebendo além do teto. Antes do encontro, no entanto, os presidentes dos tribunais já haviam combinado que não cumpririam a determinação sem antes averiguar se os números do conselho correspondiam à realidade.

Os dirigentes de dois Tribunais de Justiça, o do Amapá e o da Paraíba, não compareceram ao encontro. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, com sede em Recife, que também tem irregularidades na folha de pagamentos por pagar supersalários a 121 servidores, não foi representado na reunião.

Ao fim do encontro, Limongi explicou, em nome do grupo, que existem muitos benefícios que poderiam, somados aos salários, extrapolar o teto. É o caso do auxílio-moradia, por exemplo. Um outro caso exemplificado pelo magistrado atinge ele próprio: o de gratificação pelo exercício da presidência de tribunais. Segundo informou Ellen Gracie, o levantamento divulgado anteontem pelo CNJ já excluía esses casos. O conselho tem poderes para entrar com ações no STF contra quem desobedecer a ordem, mas ainda não se pronunciou sobre essa possibilidade.

O estudo do conselho foi realizado em todo o Judiciário, mas foram encontradas irregularidades apenas em 19 tribunais de Justiça e um TRF. Não foi divulgado o número de servidores e o de magistrados que extrapolam o limite de salários. A identidade dos contemplados também foi mantida em sigilo.

Não é a primeira vez que os presidentes dos tribunais de Justiça se rebelam contra o CNJ. Em 2005, o conselho baniu o nepotismo do Judiciário. Determinou a demissão de parentes de magistrados que ocupavam cargos de confiança nos tribunais. Alguns tribunais se recusaram a cortar os privilégios com o argumento de que os funcionários já tinham direito adquirido sobre o cargo. Grande parte dos parentes beneficiados com os empregos entrou com ações na Justiça para garantir a manutenção das posições.