Título: País vai devagar, devagarinho
Autor: Cássia Almeida e Aguinaldo Novo
Fonte: O Globo, 01/12/2006, Economia, p. 31

Brasil cresce só 0,5% no 3º trimestre e economia deve avançar menos de 3% no ano

Aeconomia brasileira pouco avançou no terceiro trimestre do ano. A expansão do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas no país) foi de apenas 0,5% contra os três meses anteriores, dentro das expectativas do mercado, mas insuficiente para alcançar os 3,2% esperados pelo governo brasileiro. Os números da economia do país, divulgados ontem pelo IBGE, mostraram que o PIB avançou 3,2% contra o terceiro trimestre de 2005. De janeiro a setembro, o crescimento está em 2,5% e, nos últimos 12 meses, de 2,3%.

O bom desempenho da demanda interna jogou a favor da alta do PIB, mas o aumento das importações acima do das vendas externas, refletindo o real valorizado, teve efeito negativo forte. Rebeca Palis, gerente das Contas Nacionais Trimestrais do IBGE, calculou que, para alcançar a taxa prevista pelo governo de 3,2%, a economia do país precisaria avançar 5,2% no fim do ano. A última taxa de crescimento acima de 5% foi no terceiro trimestre de 2004, de 5,9%, quando o Brasil teve comportamento bem superior ao de 2006, crescendo 4,9%:

¿ Para chegar aos 3% de expansão em 2006, a alta no fim do ano tem que ser de 4,4%.

Ambas as taxas são descartadas por economistas que acompanham a atividade econômica. Mesmo acreditando em desempenho melhor entre outubro e dezembro, as projeções giram entre 3% e 3,5%, contra o quarto trimestre de 2005:

¿ Acreditamos ser possível crescer de 2,7% a 2,8% este ano. Fatores pontuais que afetaram o desempenho do PIB entre julho e setembro vão desaparecer. E os estímulos para a economia doméstica devem se refletir com mais força. O aumento dos gastos correntes é demanda na veia. Sem contar o crédito e o corte de juros ¿ disse Elson Teles, economista-chefe da Corretora Concórdia.

O fraco desempenho da indústria foi um dos pontos a puxar para baixo a atividade econômica no terceiro trimestre. A alta frente aos três meses anteriores foi de 0,6%, e de 3% contra igual período de 2005. O resultado levou os industriais a reduzirem suas estimativas para o PIB no ano. Pelas contas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a variação mais provável agora é de 2,7%, contra 2,8% previstos até agosto.

Demanda doméstica deverá crescer 4%

Para o diretor do Departamento de Pesquisas Econômicas da Fiesp, Paulo Francini, nem o período de Natal, que concentra até 30% das vendas no varejo, terá força para mudar o PIB.

¿ Não há espaço e tempo para que aconteça algo diferente do que estamos vendo ¿ disse Francini.

Mas a agropecuária mostrou reação. Depois de queda de 2% frente a 2005 no segundo trimestre, registrou expansão de 7,8%, a maior desde setembro de 2003:

¿ Só a colheita de café, que representa 50% das safras desse período, aumentou 22%. Por ser uma cultura cíclica (produz mais em anos alternados), no ano passado teve queda de 13% ¿ explicou Rebeca.

No lado da demanda, o consumo das famílias avançou 3,4% frente a 2005, expandindo há 12 trimestres seguidos, mas o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) chama a atenção para alta de só 0,5% no terceiro trimestre. A causa possível: o elevado endividamento do consumidor.

¿ Enquanto o governo entender que é possível conciliar política de juros elevados e câmbio valorizado com crescimento econômico, o país não crescerá na velocidade necessária ¿ disse o diretor de Economia do Ciesp, Boris Tabacof.

Segundo Rebeca, do IBGE, a alta do consumo é amparada pelo aumento da massa salarial de 4,6% e de 28,1% no crédito para pessoa física. Os estímulos fiscais e de crédito, apesar de não aparecerem no número consolidado do PIB, tiveram reflexo expressivo na demanda doméstica. Pelas contas do economista Elson Teles, no ano o consumo interno crescerá 4%. Já o setor externo fará cair em 1,3 ponto percentual essa expansão interna:

¿ As importações cresceram muito. Isso vai dragar parcela significativa do crescimento interno. Em 2007, as compras externas devem aumentar menos, e a contribuição negativa deve baixar para 0,5 ponto percentual.

O efeito benéfico do câmbio valorizado apareceu na importação de máquinas e equipamentos, o principal impulso para a alta expressiva do investimento no terceiro trimestre. Esse ramo cresceu 2,5% na comparação com o período de abril a junho. Frente ao terceiro trimestre de 2005, a alta foi de 6,3%. Segundo Rebeca, do IBGE, o bom resultado da construção civil também contribuiu para a taxa alta:

¿ No trimestre, esse setor avançou 5,5%. Houve aumento de 25% nos recursos dirigidos para habitação. Mas o principal fator foi a importação de máquinas, e o câmbio, há muito tempo valorizado, ajudou.

Importação essa que, somada à de bens de consumo e intermediários, aumentou 20% frente ao terceiro trimestre de 2005 e 8,5% contra o segundo trimestre.

CÂMBIO TRAVA EFEITO DO CORTE DE JUROS NO PIB, na página 32