Título: Bolívia: greve exige mudança na Constituinte
Autor: Renato Galeno
Fonte: O Globo, 01/12/2006, O Mundo, p. 39

Cinco dos nove departamentos do país param hoje para cobrar do governo de Morales alterações na Assembléia

BUENOS AIRES. Cinco dos nove departamentos (estados) bolivianos realizarão hoje uma greve para exigir do governo do presidente Evo Morales a modificação das regras de funcionamento da Assembléia Constituinte. A paralisação deverá ser mais expressiva nos departamentos de Santa Cruz, Beni, Pando e Cochabamba que, juntos, representam cerca de 60% do PIB boliviano (conjunto de riquezas produzidas pelo país). Mas também deverá será sentida em Tarija.

Mais uma vez, o centro do debate será o regulamento aprovado pelo Movimento ao Socialismo (MAS) e seus aliados na Assembléia, que deverá redigir a nova Constituição do país. O movimento fundado pelo presidente Morales tem 137 representantes na Assembléia e conseguiu impor um sistema de votação pelo qual os novos artigos da Constituição serão aprovados por maioria absoluta (128 de um total de 255 votos) e não por dois terços dos votos, como defende a oposição.

¿ As coisas não podem ser ambíguas. Ou estamos na nova Constituição ou não estamos ¿ disse ontem o presidente do Comitê Cívico de Santa Cruz, Germán Antelo.

Na véspera, o vice-presidente do país, Álvaro Garcia Linera, tentara aproximar posições com líderes cívicos regionais, mas a reunião, da qual não participaram representantes de Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija, fracassou. Depois do encontro, Garcia Linera afirmou que os comitês cívicos ¿não podem substituir os partidos políticos¿.

¿ A questão da Assembléia é uma questão que envolve os partidos políticos. Os comitês cívicos podem ajudar, podem criar uma plataforma de diálogo, mas os que devem resolver são os políticos ¿ declarou o vice-presidente boliviano.

Legalidade da votação é questionada na Justiça

Apesar da forte pressão que continua sendo exercida pelos opositores de Morales (além da paralisação de hoje, mais de 300 pessoas continuam realizando greves de fome), o governo conseguiu ampliar seu poder.

A aprovação da reforma agrária no Senado, terça-feira passada, representou um duro golpe para a oposição, que já começou a perder representantes tanto no Congresso quanto na Assembléia. Segundo o senador Guido Guardia, do MAS, oito senadores da oposição, entre titulares e suplentes, já decidiram ¿aderir às mudanças que estão sendo promovidas pelo governo¿.

O ex-presidente e líder do movimento de centro-direita Poder Democrático e Social (Podemos), Jorge ¿Tuto¿ Quiroga, pediu à população que ¿acompanhe as medidas de resistência civil, pacífica e democrática¿ a serem adotadas.

Em sua ofensiva contra o governo, o movimento Podemos apresentou uma denúncia à Justiça por suposta fraude na votação em que foi ratificado o polêmico regulamento da Assembléia. Segundo representantes do partido opositor, o voto de Jorge Arias, representante do Podemos na Assembléia, foi registrado sem que ele estivesse presente. No mesmo dia, o Senado aprovou a reforma agrária, em meio a denúncias de compra de votos.