Título: Oosição joga última cartadacontra Chávez
Autor: Renato Galeno
Fonte: O Globo, 02/12/2006, O Mundo, p. 48

Rosales encerra campanha com evento coordenado em várias cidades na tentativa de mostrar força para vencer presidente

CARACAS. A oposição venezuelana fez uma demonstração de força no encerramento da campanha das eleições presidenciais nas quais tentará tirar do poder o presidente Hugo Chávez. Na noite de anteontem, adversários do presidente em Caracas e diversas cidades venezuelanas soltaram fogos de artifício, enquanto carros buzinavam e as luzes de apartamentos piscavam para mostrar apoio ao candidato da coalizão Unidade Nacional, Manuel Rosales. No céu da capital venezuelana, o show político-pirotécnico durou mais de meia hora.

¿ Hoje é o ensaio do que vai acontecer no domingo ¿ disse Rosales, depois da manifestação. ¿ Se hoje a Venezuela retumba, no domingo retumbará muito mais fortemente.

Um olhar mais atento mostrava que a maioria dos carros que participaram da festa da oposição era de modelos luxuosos, e que as luzes que eram acesas e apagadas se concentravam nos bairros mais abastados da capital. Mas para quem não tinha sequer um candidato competitivo há quatro meses, isso já bastou para encher de esperança os adversários do presidente Hugo Chávez.

¿ Conseguimos uma liderança reconhecida e sem discussão, com unidade de comando e de critério ¿ disse o chefe da campanha de Rosales, José Vicente Carrasquero, um dos responsáveis pela união de uma boa parte da fragmentada oposição a Chávez em torno do ex-governador do estado de Zulia.

Chávez diz estar fazendo transição para o socialismo

O candidato encerrou a campanha concedendo entrevistas transmitidas ao vivo pelos canais RCTV e Globovisión (nesta última, realizada pela CNN em espanhol, que também a transmitiu), de oposição ao governo. Nelas, voltou a fazer acusações contra Chávez.

¿ A Venezuela não tem dono. Não é vermelha, vermelhinha, mas amarela, azul e vermelha ¿ disse Rosales, referindo-se ao principal slogan da campanha do presidente e às cores da bandeira venezuelana.

Rosales acusou Chávez de querer implantar um sistema ¿castro-comunista¿ na Venezuela, e acusou o presidente de sucatear a estatal petrolífera do país, a PDVSA.

¿ O governo não tem permissão para usar o petróleo do povo venezuelano e dar de presente para outros países, como Cuba.

Irônico, o candidato afirmou que ofereceria aos médicos cubanos que estão trabalhando no país ¿ recebendo salários menores que seus colegas venezuelanos, mas bem mais do que receberiam em Cuba ¿ o direito de se asilar, caso vença as eleições.

Rosales defendeu seu principal ¿ e polêmico ¿ projeto, o cartão de crédito Mi Negra, que destinaria 20% do lucro da PDVSA a até três milhões de famílias venezuelanas. Sua coalizão cadastrou e até forneceu o cartão para 2,5 milhões de pessoas durante a campanha. E garantiu que continuaria as misiones (missões), os programas sociais de Chávez nas comunidades carentes do país.

Já Chávez, que na tarde de quinta-feira concedera uma entrevista coletiva de mais de três horas, à noite recebeu ¿para uma conversa na minha casa¿ ¿ o Palácio Miraflores ¿ jornalistas das emissoras de TV Venevisión, Televen, Telesur e Venozolana de Televisión (estatal). Todas transmitiram a ¿conversa¿, só encerrada depois de 1h de ontem, ao vivo por mais de três horas. Nela, o presidente reforçou que os seus ¿oito primeiros anos de governo¿ foram uma transição para a implantação do ¿socialismo do século XXI¿. Perguntado o que seria este novo sistema, ele foi evasivo:

¿ Não sei, ainda estamos discutindo isso. Só sei que o capitalismo é o mal. Não faremos um sistema soviético, mas um que seja inspirado num indigenismo americano. Os povos indígenas têm sociedades comunais, socialistas. Quem trouxe o capitalismo para cá foram os europeus ¿ disse Chávez, que afirmou que Simón Bolívar, mito maior do país, era um ¿pré-socialista¿.