Título: Satisfeitos ou conformados?
Autor: Dimmi Amora e Ruben Berta
Fonte: O Globo, 03/12/2006, Rio, p. 27

Pesquisa mostra que pais aprovam escolas públicas, mas preferiam os filhos na rede privada

Uma pergunta fica no ar ao se tomar conhecimento de uma pesquisa realizada pelo Ibope com pais de alunos de escolas públicas do Estado do Rio: os responsáveis estariam satisfeitos ou conformados com a qualidade do ensino? Dos entrevistados, 54% acham que o colégio dos filhos é bom, muito bom ou excelente e 45% acreditam que a qualidade do ensino está melhorando. Em compensação, 63% disseram que, se não tivessem que arcar com as mensalidades, optariam por uma escola particular.

Os pais se mostram duros na avaliação dos governos e dos professores. Dos entrevistados, 74% disseram que as escolas carecem de infra-estrutura como bibliotecas, laboratórios e equipamentos de informática. A maioria (62%) afirma que os professores faltam com freqüência e que deveriam ganhar pelo desempenho (68%). Dos pais ouvidos, 55% acham que a disciplina é o fator mais importante na escolha do colégio. Mas 53% não concordam com a expulsão dos filhos por problemas disciplinares graves. Em compensação, 69% dos entrevistados querem os filhos reprovados por notas baixas.

Pais não sabem notas dos filhos

Cláudio Mendonça, ex-secretário estadual de Educação e consultor da pesquisa, vê, em várias das respostas, um indicador de que os pais acabam por aprovar a escola dos filhos por não terem opção. Segundo ele, isso pode ter ocorrido por causa da baixa escolaridade (40% só completaram a 4 ª série) e porque a maioria está muito distante das escolas.

¿ Uma medida importante seria fazer chegar aos pais as notas dos testes como o Prova Brasil. A pesquisa mostrou que eles sabem que o instrumento existe, mas desconhecem o desempenho dos filhos. Se soubessem e pudessem comparar, seria uma revolução. Todos seriam cobrados ¿ acredita Mendonça, que comparou a pesquisa com uma feita no Chile, onde houve resultados semelhantes no índice de aprovação das escolas públicas.

Luciane Barbasson, diretora do Ciep Graciano Carriello Filho, em Santa Maria Madalena, um dos primeiros colocados do Prova Brasil de 2005, diz que uma das receitas do sucesso da escola é a participação dos pais. A pesquisa mostra que as escolas do interior têm uma aprovação levemente superior às demais. Segundo Luciane, a proximidade dos pais ajuda a resolver os principais problemas do colégio:

¿ As famílias participam de todos os eventos. No interior, isso fica mais fácil ¿ disse ela.

O último Prova Brasil mostrou que o caminho da qualidade ainda é longo. Na 8ª série do ensino fundamental, alunos de 60 dos 92 municípios fluminenses tiveram desempenho crítico ou muito crítico no exame de matemática. O mau desempenho foi verificado inclusive na capital. Em português, o mesmo ocorreu em 24 cidades, com problemas graves de alfabetização.

Na rede estadual, um dos grandes desafios é conter a evasão escolar. Segundo dados do site EdudataBrasil, do Ministério da Educação, a taxa de abandono no ensino médio subiu de 19,5% em 1999 para 20,3% em 2004. No Brasil, a média nas redes estaduais caiu de 18,7% para 18,1% no mesmo período.

O secretário estadual de Educação, Arnaldo Niskier, avaliou como favorável à escola pública o resultado da pesquisa do Ibope. Ele disse que defeitos apontados, como falta de equipamentos e ausência de professores, estão sendo combatidos. A prefeitura, por sua assessoria, encaminhou resposta no mesmo sentido.

¿ Estamos deixando 441 novos laboratórios de informática nas escolas. Hoje em dia, o professor também não pode mais faltar e apresentar uma receita médica qualquer. É preciso passar por uma avaliação ¿ disse Niskier.

O secretário adiantou que vai propor ao futuro secretário, Nelson Maculan Filho, desvincular os resultados do Nova Escola (programa do atual governo que avalia professores e dá gratificações conforme o resultado) dos vencimentos dos docentes. Há 11 anos os professores estão sem aumento. Se as gratificações do Nova Escola foram incorporadas, isso representará um aumento de R$117 por professor.

O Sindicato dos Profissionais da Educação (Sepe) viu os resultados da pesquisa de forma reticente, principalmente em relação à avaliação dos professores. Beatriz Lugão, coordenadora da entidade, acha que o fato de uma pergunta (se os vencimentos devem variar segundo o desempenho) ter vindo após outra sobre se os professores devem ser avaliados induziu a resposta dos pais. Ela também afirmou que a pergunta sobre os professores faltosos esconde o déficit de docentes:

¿ Faltam 26 mil professores na rede e o número de docentes em licença médica só aumenta, por causa da falta de estrutura. Nas escolas, os pais costumam reclamar mais. Essa boa avaliação se deve certamente aos professores que muitas vezes se sacrificam para manter as escolas funcionando ¿ disse Beatriz.

A situação de cada escola influencia as respostas da pesquisa. Se o pedreiro José Ricardo Rodrigues da Silva, pai de um aluno da 5ª série do Colégio Estadual Parada Angélica, em Caxias, tivesse opinado, com certeza diria que o ensino público é péssimo. A unidade funciona improvisadamente nas instalações de uma igreja evangélica. O prédio original foi depredado e a reforma é esperada desde 2002. A Secretaria de Educação informou que a obra já foi autorizada e está em processo licitatório.

¿ Na propaganda, os governantes dizem que vão fazer e acontecer na saúde e na educação. Na prática, é uma vergonha ver o estado do nosso ensino público ¿ disse José.

`O ensino evoluiu¿, diz mãe de aluna

Já na Escola Municipal Max Fleiuss, na Pavuna, não é difícil encontrar pais que fazem elogios. Norma Silvana Pereira, de 39 anos, estudou no colégio e hoje sua filha Maria Carolina é aluna da 2ª série. A mãe elogia seu período na escola, mas acha que agora ela é melhor:

¿ O ensino evoluiu. Hoje os alunos aprendem de outras formas, com trabalhos como mostras literárias, visitas a eventos culturais.

Alexandre da Cunha, de 33 anos, também ex-aluno da Max, é pai de Lucas, de 9, que estuda lá. Carroceiro, ele diz que a escola tem qualidade, mesmo sem saber exatamente o que destacar. No caso dele, a evolução do filho ¿ que se livrou de problemas de locomoção e de dicção após ingressar no jardim ¿ são os melhores parâmetros. Alexandre diz que o garoto não sairá cedo da escola como ele:

¿ Tem que estudar, senão vai puxar carroça como eu.

Apesar de os pais aprovarem, a escola está longe de ter infra-estrutura adequada. Funciona num prédio antigo, com problemas no telhado que causam infiltrações. Há biblioteca, TV e DVD, mas os alunos não têm acesso a computadores. Também não há quadra esportiva. Para as professoras, a diferença está no projeto pedagógico implantado na Max:

¿ Damos ênfase à cidadania e a outros valores. Ensinamos as disciplinas normais dentro de projetos educacionais, como mostras literárias. É difícil, mas recompensa ¿ disse Patrícia Fernandes, professora da 1ª série.