Título: Um veterano desconhecido contra Chávez
Autor: Renato Galeno
Fonte: O Globo, 03/12/2006, O Mundo, p. 60

Rosales aglutinou oposição, mas falta de carisma prejudicou sua campanha

CARACAS. Até 9 de agosto deste ano, Hugo Chávez tinha como adversário apenas a si mesmo. Com a derrocada dos dois grandes partidos políticos que dominaram a política venezuelana entre 1958 e 1998, tudo o que restava era um anti-chavismo desarticulado. Neste dia, no entanto, um nome pouco conhecido nacionalmente surgiu como o homem que tentaria derrotar um presidente cujo grupo político venceu dez eleições em oito anos: Manuel Rosales.

Uma salada de siglas com tendências tão distintas quanto o socialista Bandeira Vermelha, o democrata cristão Copei e o direitista Primeiro Justiça decidiram escolher um candidato único, e todos os pré-candidatos se retiraram para apoiar o governador do estado de Zulia.

¿ Três meses é muito pouco para que uma pessoa se torne conhecida nacionalmente. Mas acho que fizemos um bom trabalho e até agora a tendência das pesquisas é só de ascensão ¿ disse Rosales na semana final de campanha.

Um veterano da política

Rosales acabou sendo a maior ¿ e única ¿ surpresa da campanha. Ele e sua equipe escolheram slogan que rapidamente se tornou popular: ¿Atreva-se com Manuel Rosales¿. E, assim que Chávez cometeu o erro de calcar a campanha no projeto de conquistar dez milhões de votos, Rosales contra-atacou dizendo que seria o ¿presidente de 26 milhões da venezuelanos¿Ou seja, de todos, e não de um grupo.

¿ A mensagem da não beligerância foi muito bem recebida pelo eleitorado ¿ disse seu chefe de campanha, José Vicente Carrasquero. ¿ Os venezuelanos querem paz.

Pouco conhecido nacionalmente, Rosales, de 53 anos e com oito filhos, é um veterano da política venezuelana. Militou durante décadas na Ação Democrática. Mas após se eleger prefeito de Maracaibo, a segunda maior cidade do país, em 1996, decidiu deixar o partido que estava em plena decadência.

Papel polêmico em golpe

Em 2000, fundou seu atual partido, Um Novo Tempo, e conquistou o governo de Zulia. Apesar de ser o segundo estado mais populoso do país e o mais rico ¿ tem as maiores reservas de petróleo do continente ¿, o estado está isolado. Zulia fica na fronteira com o Colômbia e num país em que quase seis milhões de pessoas estão concentradas na região metropolitana de Caracas, seus 3,5 milhões de habitantes tornam-se poucos.

Seu nome se tornaria mais conhecido quando se tornou um dos dois únicos governadores opositores de Chávez em todo o país, ao se reeleger em 2004.

Como propostas, tem o polêmico e populista cartão de crédito popular que seria financiado pela estatal de petróleo, o Mi Negra. Numa tentativa de conquistar o voto mais conservador, tem um forte discurso de ordem, eficiente num país em que 90 mil pessoas foram assassinadas durante o governo Chávez. E prometeu manter os programas sociais chavistas.

Mas o desenrolar da campanha também mostrou algumas fragilidades de sua candidatura. Rosales é desprovido de carisma e, num país em que uma grande parcela da população fica praticamente em transe com os discursos de Chávez, suas declarações soam insossas.

Mas o calcanhar-de-aquiles do candidato parece ser sua controvertida participação no golpe que tirou Chávez do poder por 47 horas entre 11 e 13 de abril de 2002. Ele foi um dos signatários do documento, assinado no Palácio Miraflores, que reconhecia o empresário Pedro Carmona como presidente.

Pior foi sua emenda. O candidato afirma que pensava que o papel era uma mera lista de presença, e que não concordava com o golpe. Chávez, no último dia da campanha, respondeu com ironia:

¿ Ele estava só passando por acaso aqui ao lado do Miraflores, entrou para ver o que estava acontecendo e assinou um papel qualquer ¿ disse o presidente, rindo, para completar, subitamente sério. ¿ Mentiroso!