Título: O estorvo
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 04/12/2006, O Globo, p. 2

Um fantasma ronda o cenário político que antecede o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: a anistia para o ex-deputado José Dirceu. Enquanto ganha a vida e aguarda pelo julgamento no STF, Dirceu faz pregação da própria anistia. Seus amigos e desafetos se encarregam até de dividir os candidatos a presidente da Câmara entre os que são contra e a favor da anistia.

Integrantes do governo e da direção petista não têm a menor disposição de patrocinar a anistia do ex-deputado. Mesmo os que consideram que o petista foi alvo de uma injustiça, e acham louvável sua busca por reparação, não sentem empolgação pela causa.

A pauta, de acordo com um importante dirigente petista, é de interesse individual de Dirceu, mas não corresponde às necessidades do governo Lula e do PT. No momento em que se prepara para encarar mais quatro anos de mandato, o presidente Lula precisa criar uma onda positiva que impulsione sua gestão. A anistia para Dirceu seria uma volta ao passado. O PT, que já tem muitos problemas para reerguer sua imagem depois do escândalo do mensalão e do dossiê, teria que conviver com mais esta. Até mesmo a oposição, que exibe a cassação de Dirceu como troféu, seria obrigada a reagir. A anistia traria todo o escândalo e a guerra política de volta. Quem quer isso?

Uma nota publicada pela titular desta coluna, Tereza Cruvinel, sobre a relação da anistia de José Dirceu e as eleições para a presidência da Câmara provocou reações diferentes do líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP) e do atual presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Nela, se diz que Dirceu estaria com Chinaglia porque este seria favorável à anistia, ao contrário de Aldo.

¿ Como alguém que já precisou da anistia pode ser contra a anistia política de alguém? ¿ pergunta o comunista Aldo Rebelo.

Chinaglia, segundo aliados, vê nessa vinculação entre sua candidatura e a anistia uma tentativa de inviabilizar sua pretensão.

¿ Todo mundo sabe que eu e Dirceu somos de posições políticas diferentes no PT. A proposta de anistia é um projeto de iniciativa popular. O único papel do presidente da Câmara nesse processo é submeter ou não o projeto a votação ¿ afirma Arlindo Chinaglia.

O incômodo que a proposta provoca dá a exata medida das dificuldades que enfrentará para ser aprovada. A menos, é claro, que a população saia às ruas clamando por anistia.