Título: O pior dia da história da aviação
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 06/12/2006, Economia, p. 27

Pane em sistema de rádio causa atrasos, e vôos noturnos de três aeroportos são cancelados

OBrasil viveu ontem o pior dia da história da sua aviação civil. Uma pane no sistema de comunicação por rádio entre torres de controle e aviões paralisou os aeroportos do Sudeste e do Centro-Oeste por três horas durante a tarde, causando atrasos em quase todos os vôos e cancelamento de todas as decolagens noturnas de três dos maiores do país: Congonhas (SP), Brasília (DF) e Confins (MG). Os saguões viraram verdadeiros formigueiros humanos. A Aeronáutica abriu investigação para determinar as causas do colapso e não descarta a possibilidade de sabotagem.

Segundo o presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Milton Zuanazzi, o caos está instalado ¿ embora os números elaborados pelo órgão registrem só 28,3% dos vôos atrasados por mais de uma hora:

¿ Nunca houve um colapso no sistema aéreo desta magnitude no país. Praticamente todos os vôos atrasaram. A nossa previsão é de problemas para esta quarta-feira (hoje), principalmente pela manhã. Não podemos prever quando o sistema voltará ao normal.

Ontem, houve duas panes distintas no Cindacta 1, principal centro de controle, que gerencia o tráfego aéreo de Sudeste e Centro-Oeste. Na primeira, pela manhã, os aviões ficaram por 15 minutos sem comunicação com as torres. Isso fechou o aeroporto da capital e gerou a primeira onda de atrasos.

Quando a comunicação estava sendo restabelecida, outra pane ocorreu, às 12h50m, deixando as aeronaves incomunicáveis no ar até as 15h30m. Nesse período, os aeroportos das duas regiões do Brasil, exceto o tráfego da ponte aérea Rio-São Paulo e as decolagens de São Paulo para o Sul, foram paralisados. Só os aviões que estavam no ar foram autorizados a pousar. Outros vôos retornaram no meio do caminho, e muitos fizeram pousos em aeroportos que não estavam na rota.

No fim do dia, para evitar mais transtornos, a Anac cancelou os vôos que partiriam a partir das 19h30m de Congonhas, Confins e Brasília. A exceção foi a ponte área, que tem controle independente do Cindacta 1. Não havia, ontem, previsão oficial dos vôos cancelados com a medida nem quantas pessoas seriam afetadas.

Outra medida foi a permissão para que Congonhas operasse durante toda esta madrugada. O horário permitido é até as 23h e ele já havia sido estendido até 0h30m. A Anac decidiu ainda que as empresas aéreas estão liberadas para, hoje, alterarem livremente rotas e escalas e decidirem o melhor uso das aeronaves.

Os órgãos oficiais e os próprios controladores afirmaram que a ocorrência foi um problema técnico, sem relação com a operação-padrão dos controladores no fim de outubro e em meados de novembro, que provocou uma crise no setor. Na ocasião, os profissionais aumentaram o tempo entre pousos e decolagens e limitaram a 14 o número de aviões no ar pelo qual cada controlador ficaria responsável.

Apesar dessa defesa veemente, cresceram os rumores de que a pane pudesse ter sido causada por sabotagem. O Comando da Aeronáutica não descartou a hipótese. Os militares, inclusive, chegaram a pedir auxílio à Polícia Federal para investigar a origem da falha.

¿ Eu, como comandante do Cindacta 1, refuto os que insinuam que os controladores tenham feito isso (sabotagem). Eles são qualificados e leais, confio nos meus homens. Mas vamos abrir uma sindicância e, em 30 dias, saberemos as causas da pane, se foi falha externa (fora do sistema). Então, poderemos abrir um inquérito policial militar. Só então saberemos se minha hipótese, de falha, estará correta ¿ disse o coronel Carlos Vuyk de Aquino.

A ausência de comunicação por rádio é o pior problema que pode existir no controle. Os aviões aparecem no radar, mas não se comunicam com o centro de controle. Em um caso extremo, se houvesse a possibilidade de choque de duas aeronaves em direção contrária, elas bateriam por falta de aviso. Controladores ouvidos pelo GLOBO disseram que uma hipótese para a falha é a manutenção precária dos equipamentos. Mas não descartam que tenha ocorrido uma fatalidade.

¿ O rádio é o mínimo. Podemos atuar sem radar. Alguns países, como a Austrália, fazem isso em alguns trechos, mas nunca sem rádio ¿ disse um controlador.

COLABOROU Jailton Carvalho

PASSAGEIROS CULPAM GOVERNO E COMPANHIAS, na página 28