Título: Infância perdida
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 11/12/2006, O País, p. 3

Brasil piora sua colocação no ranking do Unicef de mortalidade infantil até 5 anos

OBrasil perdeu duas posições no ranking de mortalidade de crianças até 5 anos que o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) lança mundialmente hoje. O Brasil está em 86º lugar entre 193 países e territórios, a mesma colocação de Egito e Filipinas. No ano passado, era o 88º colocado. Pelos critérios do Unicef, o país em pior situação ocupa o primeiro lugar no ranking e o que tem os melhores indicadores de mortalidade infantil, o último. De cada mil crianças nascidas vivas no Brasil, 33 morrem antes de completar 5 anos, segundo o Unicef. Na América do Sul, apenas três países estão em situação pior do que a brasileira: Bolívia (64ª taxa mais alta), Guiana (66ª) e Suriname (78ª).

O ranking consta no relatório Situação Mundial da Infância 2007, publicação anual do Unicef cujo tema, neste ano, são as desigualdades entre homens e mulheres. A exemplo de relatórios anteriores, os dados de mortalidade infantil têm defasagem de dois anos, de modo que refletem a realidade de 2005. O Brasil vem perdendo posições desde 2003, quando sua taxa de 35 mortes para cada mil nascidos vivos passou a ser a 90ª mais alta do mundo. No mesmo período, a taxa brasileira caiu para 34 e 33, respectivamente. O ritmo de redução, porém, não foi suficiente para melhorar a situação do país no ranking.

¿ A mortalidade infantil brasileira diminuiu muito nos últimos dez anos. Mas outros países avançam mais rapidamente ¿ diz a representante do Unicef no Brasil, Marie-Pierre Poirier.

Procurado pelo GLOBO, o Ministério da Saúde informou que só vai comentar o relatório após ter acesso aos dados.

De 2004 para 2005, as Ilhas Salomão, um arquipélago na Oceania, e Belize, um pequeno país na América Central, passaram o Brasil no ranking. O Egito, que também aparecia em situação pior, igualou-se ao índice brasileiro. Por outro lado, a Micronésia, na Oceania, perdeu posições e ficou para trás, deixando o Brasil em 86º lugar.

Nesse ranking, o primeiro colocado é Serra Leoa, na África, que tem a maior taxa e, portanto, o pior desempenho: 282 mortes antes dos 5 anos, para cada mil crianças nascidas vivas. Cuba é o país latino-americano com a menor taxa (7), a 156ª mais alta do mundo, enquanto o Chile, com 10, é a nação sul-americana em melhor posição: 150ª. Andorra, Cingapura, Islândia e San Marino têm a taxa mais baixa: 3 mortes para cada mil crianças, e dividem o 190ª lugar, na verdade, o topo do ranking.

Indicador resume condições de vida

O Unicef prioriza a mortalidade até 5 anos por entender que esse indicador resume as condições de vida da população, medindo o acesso ao sistema de saúde, à educação, as condições de saneamento, nutrição e renda familiar. Embora seja a agência das Nações Unidas que cuida da infância, o Unicef escolheu o tema da igualdade de gêneros porque considera que a qualidade de vida das mulheres tem impacto direto em seus filhos.

¿ Estamos avançando, mas precisamos avançar muito mais. Não podemos tolerar taxas nesse nível, num país com a riqueza do Brasil. Não basta que tenhamos estratégias e programas bem desenhados no nível central. É preciso que as políticas cheguem na ponta ¿ diz a secretária especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire.

O relatório reúne ainda dados de mortalidade infantil de crianças com menos de 1 ano. Nesse caso, a taxa brasileira é de 31 mortes para cada mil bebês nascidos vivos, a 78ª mais alta entre 192 países e territórios com dados disponíveis.

Marie-Pierre lembra que a redução da mortalidade fica mais difícil à medida que o país avança. Taxas elevadas são prontamente reduzidas mediante ações como a vacinação infantil ou o uso do soro caseiro, prática incentivada pela Pastoral da Criança para combater mortes por diarréia. Ela diz que o desafio agora é melhorar os índices na Amazônia, no semi-árido do Nordeste e nas periferias das grandes cidades.

A representante do Unicef defende maiores investimentos no atendimento pré-natal. O relatório Situação Mundial da Infância informa que 52,2% das gestantes não tinham acesso a pelo menos seis consultas médicas antes do parto, número considerado ideal. No Norte, esse índice era de 73,9% e, no Nordeste, de 66,7%.

Outra causa da mortalidade infantil é a falta de saneamento básico. A última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostrou que 18% das residências brasileiras não eram atendidas por rede de água, enquanto 30% não contavam com esgoto.

O ministro das Cidades, Márcio Fortes, diz que o governo Lula pretende mais do que dobrar os investimentos no setor, saltando de R$4,6 bilhões, neste ano, para R$11 bilhões, em 2007. O relatório está disponível na página do Unicef na internet (www.unicef.org.br).