Título: Artistas se mobilizam contra a lei do esporte
Autor: Marinho, Antônio
Fonte: O Globo, 11/12/2006, O País, p. 8

Atores, diretores e produtores se encontram hoje com o ministro da Cultura e querem pressionar os senadores

Representantes da classe artística se reuniram ontem à tarde no Rio para tentar encontrar uma maneira de impedir a aprovação no Senado da chamada Lei do Esporte. O projeto cria incentivos fiscais ao patrocínio de eventos esportivos e, segundo artistas, produtores e diretores, vai reduzir os investimentos em atividades culturais.

O projeto de Lei do Esporte prevê que pessoas físicas possam doar até 6% do imposto devido para patrocínio em esporte. Pessoas jurídicas (empresas) poderiam doar até 4%, o mesmo percentual para projetos culturais. No encontro, realizado na casa do presidente da Associação de Produtores Teatrais do Rio, Eduardo Barata, estavam Fernanda Montenegro, Nathalia Timberg, Tônia Carrero, Otávio Müller, Ney Latorraca e Louise Cardoso, entre outros.

Lula vai convocar reunião para discutir projeto

Hoje, uma comissão de artistas (formada por Fernanda Montenegro, Ney Latorraca, Louise Cardoso, Marília Pêra, Bianca de Felippes, Norma Thiré, Hugo Barreto e Eduardo Barata) tem reunião, às 11h, com o ministro da Cultura, Gilberto Gil, no Palácio Gustavo Capanema, no Rio, para buscar uma saída para o impasse. Os artistas também pretendem ir a Brasília acompanhar a discussão no Senado. Gil disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai convocar hoje uma reunião com os secretários-executivos dos ministérios da Cultura e do Esporte.

O senador Wellington Salgado (PMDB-MG), presidente da Comissão de Educação da Câmara e relator do projeto, quer colocá-lo em votação ainda esta semana.

Os representantes da classe artística não entendem a necessidade de urgência para a aprovação a lei. Na reunião, Fernanda falou ao telefone com Gil. Ele garantiu que Lula está atento ao problema.

¿ Eu já passei ao presidente a preocupação da classe artística com relação à Lei do Esporte. Ele vai compreender a dificuldade da convivência de duas leis, a de incentivo à cultura e a do esporte, sob o mesmo guarda-chuva fiscal. A Lei do Esporte deveria atender os esportes amadores ¿ disse o ministro pelo telefone.

Para artistas, esporte deveria ter outros incentivos

Fernanda disse que a classe artística não é contra o incentivo ao esporte:

¿ O esporte terá muito mais se lutar por algo que lhe seja próprio e satisfaça suas necessidades. Não temos nada contra o esporte.

Segundo dados do Ministério da Cultura, 1.964 organizações patrocinam projetos culturais no país, apenas 7% do total. Isso ocorre porque para patrocinar a cultura a empresa tem que declarar imposto sobre o lucro real e não sobre o presumido. Para Fernanda, se a Lei do Esporte for aprovada, os patrocínios para a cultura podem cair ainda mais.

¿ O patrocinador quer visibilidade. E, se tiver que escolher entre cultura e esporte, não terá dúvidas em preferir o esporte. Os atletas podem ter os nomes dos patrocinadores em todo o corpo. Uma orquestra e um ator não podem fazer isso. Já lutamos por nossa sobrevivência com as leis que nos patrocinam. Juntar o esporte nesse bolo será o caos total. Estamos dispostos a lutar para o esporte ter mais apoio, sucesso e sua própria lei. Não pode despir um santo para vestir o outro.

Tônia Carrero lembrou que é formada em educação física e a favor do esporte, mas disse que a cultura não pode perder algo que teve dificuldade para conseguir. Para Nathalia Timberg, é preciso sustar a lei.

¿ Do jeito que a Lei do Esporte está, não pode ser aprovada. Ela vai invadir outra, será uma pororoca. Temos várias instituições culturais falidas. Queremos o esporte pujante, sem acabar com o teatro, a dança, as orquestras, o cinema e outras atividades. Essa lei foi feita sem a ampla discussão dos representantes do esporte e da cultura.

Barata concordou.

¿ Não somos contra a Lei do Esporte, mas não pode pegar a pequena fatia da cultura. Precisamos sensibilizar a Receita Federal e o Poder Legislativo para manter os 4% da cultura. O esporte deveria ganhar outra alíquota, uma nova isenção fiscal ¿ disse.

Ele lembrou que, no final de 2005, muitas empresas deixaram de investir em cultura em função da Copa do Mundo.

¿ A Lei do Esporte prevê que os investimentos tenham dedução de 100% em todas as atividades. Isso não acontece com a cultura. Esta lei é meio desleal, principalmente às vésperas do Pan-Americano.