Título: TCU relaciona apagão aéreo a corte de gastos
Autor: Tavares, Mônica e Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 13/12/2006, Economia, p. 27

Relatório aponta retenção de R$523,5 milhões para Cindactas. Ministério da Defesa e Casa Civil rebatem acusação

BRASÍLIA. O governo federal repassou ao Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) ¿ setor da Aeronáutica responsável pelo funcionamento dos centros de monitoramento de aeronaves chamados de Cindactas e seus profissionais ¿ R$523,5 milhões menos do que o pedido pelo órgão nos últimos três anos. A conclusão, que contraria a convicção do governo de que não faltaram recursos para impedir a crise nos céus do país, é da auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), cujo relatório foi aprovado ontem. Trata-se do equivalente a 35% dos recursos efetivamente aprovados no Orçamento, R$1,494 bilhão entre 2004 e 2006.

Ainda segundo o TCU, há documentos ¿ as pré-propostas orçamentárias ¿ comprovando que o Decea alertou, em 2004 e este ano, para a necessidade de recursos para o setor, incluindo segurança.

O TCU levantou outra irregularidade: se for considerado o teto de R$90 milhões estabelecido pelo governo, a Infraero, desde 2000, ¿pode ter deixado de repassar R$582,37 milhões¿ da arrecadação com tarifas aeroportuárias ao Comando da Aeronáutica. Por isso, a estatal que administra os aeroportos terá que abrir os valores de recolhimento.

¿ Não houve planejamento por parte do governo, alguém negligenciou. Houve uma série de erros de vários setores do governo, que levou a esta situação caótica ¿ disse o ministro Augusto Nardes, relator da auditoria.

Falta articulação aos órgãos do governo, afirma Nardes

Para Nardes, a Casa Civil tem responsabilidade no apagão aéreo, pois determinou contingenciamento linear de recursos. Ele destacou que a operação, manutenção e desenvolvimento do sistema do espaço aéreo são custeadas, na maior parte, pelas receitas das tarifas do setor, ¿não havendo aporte de recursos ordinários do Tesouro¿.

O relatório apontou total falta de articulação dentro do governo, com responsabilidade de todos os envolvidos. Para vencer as graves falhas, o TCU fez diversas determinações aos órgãos que cuidam do planejamento e da fiscalização da aviação e do espaço aéreo.

Entre elas, está a criação de carreira exclusiva para controlador de vôo. Para o ministro Valmir Campelo, a sociedade não pode ¿entregar sua vida para um servidor com salário em torno de R$2 mil¿. Caberá ao governo definir se a carreira será civil ou militar, mas Campelo deixou implícito que ela deveria ser desmilitarizada, ao dizer que não é desculpa para a baixa remuneração o fato de um sargento não poder ganhar mais do que um capitão.

A criação de um sistema de utilização das aerovias no país, de forma a otimizar o espaço aéreo e aumentar a segurança, também foi sugerida pelo TCU. Além do atual distanciamento vertical (cada aeronave numa altitude), também deveria haver espaçamento horizontal. Segundo Nardes, se a medida estivesse em vigor, o acidente com o avião da Gol não teria ocorrido.

Dilma alega que aeroportos receberam R$3 bilhões

A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, rebateu o relatório e afirmou que o controle aéreo é uma responsabilidade do Ministério da Defesa e do Comando da Aeronáutica, não sua. Segundo ela, desde 1999 todas as atribuições em relação aos militares (como planejamento, gestão e pessoal) são da pasta comandada por Waldir Pires ¿ e Dilma lamentou que Nardes ¿não saiba disso¿.

Dilma afirmou ainda que ¿evitou um problema sério¿ nos aeroportos ao investir nos últimos anos R$3 bilhões em modernização.

O ministro da Defesa, Waldir Pires, por sua vez, atribuiu a crise nos aeroportos a falhas na ¿gestão de manutenção¿ do sistema e afirmou que a Aeronáutica está sendo alertada para corrigir esse problema. Ele rebateu diretamente o relatório do TCU e foi enfático ao dizer que o problema não é falta de recursos, e sim gerenciamento. Para ele, é preciso ¿um pouco de cuidado¿ com os equipamentos, por exemplo.

¿ Não foi por falta de recursos, porque existem inclusive recursos em caixa para isso. Nem é para pedir mais dinheiro ao governo.

Pires disse que abriu a Nardes os números do governo, mostrando que não há falta de recursos. Segundo ele, em 2006 não houve contingenciamento. Já em 2005, houve represamento de pouco menos de 4% e, em 2004, de apenas 3%.