Título: Renovação de cara velha
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 17/12/2006, O País, p. 3

Estudo sobre Congresso eleito em outubro mostra que estreantes não chegam a 50

OCongresso que assume um novo mandato a partir de fevereiro ¿ já com os subsídios de R$24.600 recém-aprovado pelas Mesas Diretoras ¿ exibe nível escolar de Primeiro Mundo, está mais para liberal do que para social-democrata e desfaz um mito: o da renovação do Legislativo brasileiro. A renovação foi de quase 50%, mas os novos, de fato, não chegam a 50. As conclusões fazem parte de um estudo produzido pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) a partir das biografias e experiências políticas dos 513 deputados e 27 senadores eleitos em outubro.

O levantamento do Diap demonstrou que a tão propalada renovação da Câmara assemelha-se à história da meio copo d¿água, que é meio cheio ou meio vazio. Dos 243 ¿novos¿ deputados, que correspondem a uma renovação de 47%, 200 já exerceram algum mandato ou cargo público em alguma das três esferas de governo ¿ federal, estadual ou municipal.

É o caso, por exemplo, de Régis de Oliveira (PSC). Eleito por São Paulo, ele é considerado como ¿novo¿, mas já foi deputado federal e vice-prefeito de São Paulo durante o mandato de Celso Pitta. Ou o senador Aelton Freitas (PL-MG), que herdou metade do mandato do vice José Alencar, mas diante da dificuldade de se reeleger para o Senado, optou pela Câmara, onde figura na lista dos novatos.

Os outros 43 que efetivamente nunca exerceram função pública são de grupos: comunicadores (apresentadores de TV, radialistas, artistas e cantores), bispos e pastores evangélicos e os parentes de políticos, como Felipe Bornier (PHS-RJ), que freqüentará o mesmo plenário que o pai, Nelson Bornier (PMDB-RJ), reeleito.

Amapá e Distrito Federal propiciaram, percentualmente, a maior troca de cadeiras. Cada um tem direito a oito representantes e apenas dois no Amapá e dois no DF foram reeleitos. Goiás, ao contrário, manteve a maior parte dos deputados. Das 17 vagas, 14 continuaram com os mesmos titulares e três (17,65%) são novatos.

Na estatística, Congresso de elite

Estatisticamente, o novo Congresso será de elite. Em termos de escolaridade, a futura Câmara não deve nada aos parlamentos de países mais desenvolvidos: 413 dos 513 deputados declararam que têm curso superior (80,5%), e outros 37 (7,2%) têm formação superior incompleta, chegando perto dos 90% do total.

A maior parte dos deputados é de profissionais liberais. São 265, entre eles 87 advogados, 54 médicos, 47 engenheiros, 20 economistas e 15 administradores. A segunda maior representação será dos empresários (120). Os assalariados serão representados por 88 deputados, enquanto trabalhadores rurais e operários somam 19.

Para o coordenador-geral do estudo do Diap, o cientista político Antônio Augusto de Queiroz, o governo pode enfrentar dificuldades caso queira implementar reformas mais sociais.

¿ O novo conjunto de parlamentares é mais liberal do ponto de vista econômico e mais conservador do ponto de vista social. Se o governo quiser implementar um discurso mais à esquerda, poderá ter dificuldades.

Ganharam espaço as bancadas ruralista e empresarial. Perderam as dos sindicalistas e evangélicos. Os ruralistas, uma das categorias mais eficientes do Congresso, perderam em quantidade: caíram de 111 para 104 parlamentares. No entanto, ganham peso, segundo o Diap, porque elegeram personagens como Homero Pereira (PPS-MT), líder do tratoraço de junho de 2005 e do locaute ruralista que fechou rodovias em maio deste ano.

A bancada empresarial saltou de 102 eleitos em 2002 para 120 na próxima legislatura. Só perdeu, em quantidade, para a bancada eleita pelo empresariado em 1998, com 143 representantes. Enquanto os empresários aumentaram seu espaço, os sindicalistas perderam. A bancada oscilou de 74 para 60. Em 1998, era de 44. O Diap observou que a eleição de Lula, em 2002, foi responsável pelo expressivo número de sindicalistas eleitos.

Os evangélicos também perderam espaço. Dos 52 atuais parlamentares, 16 se viram envolvidos no escândalo da máfia das ambulâncias e perderam votos. Na legislatura que começa em fevereiro, apenas 36 parlamentares são identificados como evangélicos.

A bancada feminina no Congresso cresceu em relação a 2002, mais representa menos de 10% dos deputados. Foram eleitas 46 deputadas, por 20 estados e por 13 partidos, representando 8,97% das cadeiras da Câmara. Destas, 16 foram reeleitas. Em 2002, foram eleitas 42 deputadas (8,19%). No Senado, as mulheres aumentaram a bancada de oito para doze.

Regionalmente, dois aspectos se destacam. O PSDB, que os tucanos querem que seja mais nacional, voltou a ter predominância paulista entre seus deputados. Um quarto de sua bancada (18 dos 66) é proveniente de São Paulo. O PFL também manteve concentração regional, sobretudo no Nordeste e, mais ainda, na Bahia, seu principal reduto (13 dos 65).

No Senado, embora 20 dos 27 senadores que assumirão sejam considerados novos, todos têm experiência política anterior, inclusive de presidente da República, como o Fernando Collor (PRTB). Há pelo menos cinco ex-governadores, além de ex-deputados estaduais e federais e prefeitos.