Título: O TSE, com ressalvas
Autor: Filippi, José de
Fonte: O Globo, 16/12/2006, Opinião, p. 7

Aaprovação das contas da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Tribunal Superior Eleitoral e a indicação de somente uma falha residual na prestação de contas do Comitê Financeiro Nacional do PT vieram confirmar a lisura e o zelo com que procuramos realizar a coordenação financeira da campanha presidencial de 2006.

Foi um trabalho árduo e criterioso, com magnitude proporcional às dimensões do processo eleitoral no Brasil. Os objetivos estabelecidos no início da campanha foram amplamente alcançados. Adotamos uma postura institucional no contato com potenciais doadores, sem oferecer qualquer benefício ou compromisso com seus eventuais interesses em relação às decisões de governo. Contatamos mais de 6 mil empresas, realizamos 60 mil ligações telefônicas e o processo de registro contábil das doações e despesas abrangeu mais de 50 mil operações.

Sinceramente, não posso aceitar, sem protesto, a decisão da Corte Superior Eleitoral, que rejeitou as contas do Comitê Financeiro Nacional do PT por causa de R$10 mil. Podemos discutir o mérito, pois, dependendo da interpretação, a empresa Deicmar S.A. poderia ou não ser considerada uma fonte vedada. Vamos admitir que tenha sido um erro, como indicou o TSE.

Como se posicionou o Ministério Público Federal? A Procuradoria analisou este caso e afirmou que o valor era muito pequeno e não caracterizava abuso de poder econômico.

Como foi em 2002? Numa situação semelhante, a campanha do presidente Lula recebeu a doação de R$50 mil de fonte apontada como vedada. Naquela ocasião, o voto da ministra relatora Ellen Gracie, aprovado por unanimidade pelo TSE, não deixou margem a dúvidas ao afirmar que ¿a falha não compromete a regularidade das contas, uma vez que o valor das doações de origem vedada representa apenas 0,2839% do total de recursos declarados¿.

Já em 2006, a doação da Deicmar ao Comitê Financeiro do PT representou somente 0,01% do total de recursos arrecadados. Portanto, se o valor doado em 2002 foi considerado irrisório e incapaz de comprometer a regularidade das contas, como poderia o tribunal rejeitar as contas do nosso Comitê Financeiro em função de uma única doação que proporcionalmente é quase 30 vezes menor que há quatro anos?

O TSE pretendeu neste ano, aparentemente, não tolerar qualquer erro, como se seus membros fossem seres superiores infalíveis. Mas seus próprios técnicos, da Secretaria de Controle Interno, cometeram erros graves durante a análise preliminar de nossas contas. Baseados em ilações e consultas superficiais na internet, arrolaram equivocadamente diversas empresas como fontes vedadas, o que não se confirmou. Pior ainda, apontaram como despesas não-contabilizadas duas notas fiscais que não eram da campanha Lula, mas sim do candidato Geraldo Alckmin.

Um dos ministros justificou esses erros dizendo que os técnicos trabalharam muito, sob tensão e com sono. Mas nossa equipe também trabalhou assim. Se o tratamento destinado ao PT foi tão diferente, talvez isso decorra do constrangimento a que foram submetidos os ministros do TSE pelas declarações extemporâneas de seu presidente, ministro Marco Aurélio de Mello, afirmando que não aceitava a ¿coluna do meio¿, ou seja, a aprovação com ressalvas. Ora, se a lei é clara ao prever a possibilidade da ¿aprovação com ressalvas, quando verificadas falhas que não lhes comprometam a regularidade¿, não cabe ao presidente da corte rejeitá-la por antecipação.

Dentro das limitações da legislação atual, tenho plena convicção de que fizemos o melhor. A aprovação das contas do presidente Lula está coroando trajetória política de êxitos e muitos votos. Por delegação do povo brasileiro, a Justiça Eleitoral diplomou anteontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para mais quatro anos de mandato.

Com certeza, uma das ações mais importantes na busca de melhores condições de vida para a população brasileira será a execução de reforma política que apresente avanços no sistema eleitoral. Legislação mais clara, sistema eletrônico de prestação de contas aprimorado, financiamento público e mais transparência são algumas das medidas que poderão ser adotadas, com base no aprendizado que a sociedade brasileira teve nestas eleições.

Assim espero, pelo aperfeiçoamento de nossa democracia.

JOSÉ DE FILIPPI é prefeito de Diadema (SP) e foi coordenador financeiro da campanha de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.