Título: Uma Paris nobre e à venda
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 17/12/2006, O Mundo, p. 41

Estado se desfaz de imóveis luxuosos para reduzir dívida pública

Adívida pública pesa: 1,1 bilhão. Então, como fazem muitos endividados, a França começou a se desfazer de seus imóveis. Uma dezena de chateaux e hotels particuliers (mansões históricas), foi vendida este ano. E a riqueza imobiliária do Estado não é pequena: são 26 mil propriedades, de pequenos bens rurais e imóveis históricos, em Paris, a fortes ¿ num patrimônio avaliado em 38 bilhões.

Em 2003, o governo criou um programa especialmente para o assunto, e, desde então, as vendas estão sendo aceleradas. Em 2005, foram 630 milhões. Este ano, o montante ficou em 480 milhões. Alguns imóveis ocupados por órgãos do governo em prédios nobres de Paris estão sendo passados à frente do jeito em que se encontram: ocupados por departamentos públicos.

Estado continua a pagar aluguel

É o caso de três monumentos anunciados em setembro pelo Ministério da Cultura: uma mansão de 3 mil metros quadrados do século XVIII e outras duas num total de 3,8 mil metros quadrados do final do século XVII. Todas em bairros nobres de Paris.

O Ministério da Cultura só vai liberar esses lugares em 2008. Num deles, por exemplo, funciona a direção de Música, Dança, Teatro e Espetáculo do ministério. Noutro, a mediateca onde estão arquivados documentos sobre os monumentos históricos da capital francesa. Para compensar o comprador, o Estado se compromete a pagar aluguel até conseguir desalojar seu pessoal. Como só 15% do que é vendido é usado para cobrir a dívida (o restante fica com o órgão público que foi desalojado), os críticos perguntam para que tanta pressa em se desfazer dos imóveis. ¿A obsessão em obter dinheiro conduz à venda de bens que podem ser valorizados¿, concluiu relatório do Instituto Montaigne.

Assim, parte da burocracia estatal vai saindo do rico centro de Paris para a periferia. E não só o Estado vende o que pode, as estatais também. A SNCF, empresa responsável pela rede ferroviária do país, terá vendido este ano 350 milhões em bens, que vão de restaurantes ao lado de estações de trem a hotéis. O fundo de pensão americano Westbrook, por exemplo, comprou da SNCF o Hotel Concorde da estação Saint Lazàre, por 101, 5 milhões.

Imóveis rurais também na lista

A Prefeitura de Paris também está empenhada e já vendeu terrenos como o do hotel Sofitel ¿ por 25 milhões para uma filial do grupo Accor. Em 2005, a venda de ativos e imóveis da cidade já tinha atingido um nível recorde: 118 milhões, contra 73 milhões em 2003, com o objetivo de alcançar125 milhões este ano. A prefeitura diz que está colocando à venda patrimônio que considera ¿inútil¿ para os parisienses.

O escândalo de 1995, que revelou que o então primeiro-ministro Alain Juppé deu ordem para baixar o aluguel de um apartamento da prefeitura de Paris ¿ na bela rue Jacob ¿ ocupado por seu filho Laurent, fez acelerar as vendas. Em 2002, a Prefeitura de Paris era proprietária de cerca de 300 imóveis e mais de 800 apartamentos de luxo, todos em bairros nobres da cidade. Hoje restam cerca de 150. Com os aluguéis e preços de imóveis cada vez mais altos em Paris, a classe popular está sendo empurrada para a periferia. Alguns partidos de esquerda, como o Partido Verde, condenam as vendas dos apartamentos públicos, dizendo que os lugares deveriam ser transformados em alojamentos sociais, isto é, para pessoas em dificuldades financeiras.

Mas Paris não está vendendo só seus apartamentos. A prefeitura tem terrenos e até florestas em vários lugares da França. Desde 2003, a prefeitura vendeu três centros de colônia de férias por 1,7 milhão ¿ nos Pirineus, em Indre-et-Loire e Savoie.