Título: Portp secos e abertos ao crime
Autor: Balieiro, Vera Teresa
Fonte: O Globo, 19/12/2006, Opinião, p. 7

Estudos e pesquisas, realizados por ocasião do plebiscito sobre a venda de armas de fogo, alertam para a existência de um verdadeiro arsenal clandestino entre a população. Afirma-se que mais de 17 milhões de armas de fogo circulam no Brasil, sendo que 90% estão nas mãos de civis, e mais da metade são armas ilegais, das quais cerca de quatro milhões (46%) estão em poder de criminosos.

Para combater esse arsenal, em grande parte responsável pelos altos índices de homicídios no país, o relatório da CPI do Tráfico de Armas, de autoria do deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), propõe que o governo intensifique a fiscalização e o controle aduaneiro em portos, aeroportos e travessias de fronteira, para recrudescer o combate ao contrabando e à entrada de armas.

Na contramão desta proposta está a Medida Provisória 320 que poderá ser votada no Senado Federal ainda esta semana. A chamada ¿MP dos Portos Secos¿ prevê a criação de ¿Centros Logísticos e Industriais Aduaneiros¿ (CLIA), que serão instalados sem licitação e poderão até mesmo funcionar sem a presença de fiscalização. Ao enfraquecer os controles aduaneiros, a MP 320 estará potencializando a entrada de armas clandestinas e comprometendo severamente a grave questão da violência urbana no país.

O que se observa, segundo escreve o deputado Paulo Pimenta, é que ¿evitar o ingresso de armas e munição contrabandeadas não se constitui em prioridade da Receita. O seu negócio é arrecadar sem prejudicar o comércio de importação e, principalmente, de exportação¿. Isso mesmo. Em nome de uma suposta agilidade do comércio exterior, a Receita Federal põe em risco a população com a possibilidade de abertura de novos portos-secos sem a presença dos órgãos de fiscalização do Estado.

O Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco) apresentou uma proposta alternativa ao texto da MP dos Portos-Secos. Essa proposta traz opções para melhorar a logística do comércio exterior, como quer o governo, mas não diminui a capacidade do Estado de proteger a sociedade de crimes tributários, de lavagem de dinheiro, de contrabando de armas e drogas, da concorrência desleal, da entrada de mercadorias perigosas para a saúde, o meio ambiente, a agropecuária, da retirada de nosso patrimônio artístico, cultural e de espécimes de nossa flora e fauna.

O Unafisco acredita que uma aduana mais inteligente, ágil e segura é possível. É essa aduana que interessa ao Brasil. É por essa aduana que estamos lutando.

VERA TERESA BALIEIRO é presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco) do Rio de Janeiro.