Título: Governo estuda restrição a pensões por morte
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 19/12/2006, Economia, p. 25

Técnicos têm como objetivo reduzir déficit da Previdência. Levantamento do Ipea diz que Brasil é mais benevolente

BRASÍLIA. Diante da resistência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em realizar uma nova reforma da Previdência Social, os técnicos do Governo vêm buscando saídas alternativas para corrigir distorções e dar sustentabilidade a esse sistema, que já registra um déficit de R$37 bilhões até outubro. Um dos focos de trabalho é o pagamento de pensões por morte. No Brasil, não há carência de idade ou tempo de contribuição para a concessão desse benefício, cujo valor pode até mesmo ser acumulado com outras pensões ou aposentadorias.

O próprio ministro da Previdência, Nelson Machado, já admitiu que muitas pessoas recebem pensões por morte no Brasil com pouquíssimo tempo de contribuição, o que aprofunda o desequilíbrio do regime. Segundo o estudo "Determinantes da sustentabilidade e do custo previdenciário: aspectos conceituais e comparações internacionais", preparado pelo economista Marcelo Caetano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o sistema brasileiro é o mais benevolente do mundo e precisa de reformas.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a pensão só é concedida à viúva ou viúvo a partir dos 60 anos de idade e não pode ser acumulada com a aposentadoria. Já na França, a idade mínima é de 55 anos, e o beneficiário deve ser casado com o instituidor há pelo menos dois anos. Neste caso, é possível acumular a pensão com aposentadoria mas, para receber o benefício, o pensionista deve ter renda inferior a 15 mil por ano.

Medidas para Previdência podem sair esta semana

O estudo diz que, em comparação a outros países, o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) brasileiro apresenta "regras de qualificação e fórmulas de cálculo da pensão por morte muito mais suaves, o que dificulta a obtenção da sustentabilidade de longo e curto prazos da Previdência Social". Segundo Marcelo Caetano, os gastos com pensão por morte correspondem a cerca de 20% do total de benefícios pagos no Brasil. Somente em outubro, esses desembolsos somaram R$2,7 bilhões.

Ele destaca que o Governo teria espaço para restringir um pouco mais as regras para o recebimento desse benefício, lembrando que isso já ocorreu no passado. Caetano destacou que, até 1990, as pensões por morte equivaliam a 60% do benefício, sendo que o valor subia 10% para cada dependente. De acordo com o especialista do Ipea, caso o Governo voltasse a essa regra, a economia de recursos poderia chegar a R$14 bilhões por ano a longo prazo.

Segundo técnicos da equipe econômica, é preciso fazer um debate mais amplo com a sociedade sobre a forma de modificar a concessão de benefícios como a pensão por morte. Apesar de o Governo estar trabalhando para incluir algumas medidas para a Previdência no pacote que será anunciado esta semana, visando a promover um crescimento mais forte da economia, o tema ainda é muito polêmico, e a equipe acredita que precisará de mais tempo para alinhavar todas as ações.

Estão na mesa de negociação, por exemplo, mudanças na forma de acompanhamento do pagamento de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. Isso porque entre 15% e 20% do total dos benefícios vão para esses pagamentos, o que é considerado um número extremamente elevado.

- Isso é um padrão anômalo. Esse volume só se justificaria se houvesse uma epidemia gravíssima ou se o país estivesse em guerra - disse um técnico.

Senado aprovou lei para frear gasto de auxílio-doença

O número de pagamentos saltou de 600 mil benefícios por mês em 2001 para 1,6 milhão em outubro de 2005 e chega hoje a 1,5 milhão. Um avanço nesse sentido já foi a aprovação no Senado, na última semana, de um projeto de lei que evita que o pagamento do auxílio-doença seja maior do que a renda dos trabalhadores na ativa, o que vinha acontecendo em alguns casos.

O Governo quer ainda colocar em prática o "fator acidentário previdenciário", que aumenta a alíquota do seguro de acidente de trabalho para empresas que têm maior incidência deste tipo de problema. Essa medida, que está prevista em lei mas ainda não é aplicada, seria uma forma de aumentar a arrecadação garantindo mais segurança para os trabalhadores.

Uma área mais delicada e que dificilmente deve sofrer mudanças é a definição de idade mínima para aposentadoria. No Brasil, como regra geral, hoje são suficientes 35 anos de contribuição para homens e 30 anos para mulheres. O valor dos benefícios é calculado pelo fator previdenciário, que considera a idade e o tempo de contribuição do beneficiário com base na expectativa de vida da população. No entanto, segundo o documento do Ipea, apenas no Brasil e na Itália é possível se aposentar sem idade mínima.

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