Título: Tensão e bate-boca na reunião de líderes
Autor: Lima, Maria e Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 21/12/2006, O País, p. 3

Nem meu filho acredita que eu recebo, líquidos, R$8.500, disse o líder do PTB

BRASÍLIA. A encruzilhada criada pela reação popular à proposta de aumento de 90,7% dos subsídios de parlamentares elevou a temperatura na reunião de líderes com o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), ontem de manhã, para tentar solução menos desgastante. Coube a Aldo, o mais atingido pela crise, propor a revisão da proposta de aprovar R$24.500. Muitos deputados já reconheciam a necessidade de ouvir as ruas.

- Se há uma Casa sensível à sociedade, essa Casa é a Câmara. A proposta que aprovamos na outra reunião, do teto de R$24.500, tem que ser revista - reconheceu Aldo.

Quem, na reunião passada, apoiara sem ressalvas o teto, como o líder do PDT, Miro Teixeira (RJ), ontem passou a defender o fim da verba indenizatória de R$15.000, provocando bate-boca na reunião. Miro disse que eles perderam a guerra da comunicação, porque a imprensa passou a divulgar o valor do aumento, e não o "princípio".

- Aumentar o subsídio e manter a verba é um absurdo! - disse Miro.

- E por que você não foi contra na outra reunião, quando apoiou o teto sem cortes, e vem com essa conversa agora, depois da repercussão negativa? - interpelou o líder do PV, Fernando Gabeira (RJ), que acusa o pedetista de tentar desmoralizá-lo com a divulgação do montante usado por ele de verba indenizatória.

Quando o líder do PSOL, Chico Alencar (RJ), sugeriu que a melhor solução seria o congelamento dos subsídios e a discussão na próxima legislatura, novo embate com Miro.

- Aí a manchete do meu jornal seria: "Câmara recua para aprovar o aumento em fevereiro" - disse Miro.

O líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), chegou a sugerir que, na presidência, poderia resolver dificuldades caso acabassem com a verba indenizatória e não conseguissem aprovar o teto de R$24.500.

- É melhor votar tudo nesta legislatura. Se cair a verba e não tiver o aumento, a próxima Mesa pode resolver dificuldades que os deputados possam ter - disse Chinaglia, ao defender a proposta de votar o fim da verba indenizatória, do 14º e 15º salários e depois definir o subsídio.

Líderes enxergam manobra para aprovar teto

Os líderes de PTB, PPS, PV, PSB e PSOL viram na solução uma manobra para aprovar os R$24.500 e passaram a defender que não votassem o aumento nessa legislatura. Gabeira alertou que nada impediria que, derrubada agora a verba indenizatória para abrir caminho para o teto, em fevereiro o presidente da Casa poderia recriá-la com um simples ato da Mesa.

- Nem meu filho acredita que eu recebo líquidos R$8.500. Mas, diante da confusão, o mais sensato é não discutir este ano - apoiou o líder do PTB, José Múcio Monteiro (PE).

O líder do PP, Mário Negromonte (BA), favorável aos R$24.500 e à verba indenizatória, protestou:

- Já vivi situações aqui de deputado dormir no próprio gabinete e ter de andar de ônibus. O que querem? Então vamos aprovar um salário mínimo para os deputados...

- É demagogia ser contra o teto. Antes ninguém era contra, agora estão todos com medo? - emendou o líder do PTC, Carlos William (MG).

Considerado o rei do baixo clero, até mesmo o primeiro secretário Inocêncio Oliveira (PL-PE) se rendeu aos ruídos das ruas e alertou para a necessidade de sepultarem o tema aumento, pelo menos por enquanto.

- Vamos para o plenário votar o fim dos CNEs (cargos de natureza especial). Com esse grau de confusão, é insensato a Casa deliberar agora.

Ao fim da reunião, quando a discussão atingiu um grau quase de descontrole, Aldo tentou encerrar a reunião com um consenso, sem sucesso:

- Companheiros, fomos submetidos a uma dura prova. Vamos decidir votar primeiro o fim da verba indenizatória, do 14º 15º salários e depois o valor do subsídio. Nesta ou na próxima legislatura.