Título: Ano Novo obriga agências dos EUA a liberar arquivos
Autor: Shane, Scott
Fonte: O Globo, 23/12/2006, O Mundo, p. 41

Ordem de Bill Clinton tornará públicos centenas de milhões de documentos confidenciais à meia-noite do dia 31

WASHINGTON. À meia-noite de 31 de dezembro, centenas de milhões de páginas de documentos secretos serão imediatamente liberadas, inclusive muitos arquivos do FBI do período da Guerra Fria, sobre investigações de pessoas suspeitas de serem simpatizantes do comunismo. Depois de anos de adiamentos conseguidos por agências federais americanas, o fim de 2006 significa a primeira liberação automática de documentos.

Documentos secretos com 25 anos ou mais perderão o caráter sigiloso, a não ser que alguma agência busque uma exceção se provar que o assunto em questão deve permanecer secreto.

O limite de tempo foi criado pelo ex-presidente Bill Clinton. E, a partir de agora, milhões de outros documentos serão liberados automaticamente quando atingirem o limite de 25 anos, invertendo a prática tradicional de liberar apenas o que acadêmicos requerem.

Muitos historiadores esperavam que o presidente Bush eliminasse a data limite. Seu governo tornou novamente sigilosos muitos arquivos históricos e restringiu o acesso a documentos presidenciais de governos anteriores, assim como registros atuais. Mas ele não eliminou a data. O único problema deve ser o acúmulo de registros no Arquivo Nacional, que pode fazer com que alguns documentos levem meses para serem liberados.

Informações sobre América Latina são aguardadas

Preparando-se para rever antigos relatórios para respeitar a data limite, agências governamentais já liberaram mais de um bilhão de páginas, lançando luz sobre a Crise dos Mísseis, a Guerra do Vietnã e a rede de agentes soviéticos dentro do governo dos EUA.

Que surpresas os documentos guardam é algo impossível prever.

¿ Levará uma geração inteira de acadêmicos para analisar o material liberado neste processo ¿ disse Steven Aftergood, que participa de um grupo de análise de segredos do governo da Federação dos Cientistas Americanos. ¿ Praticamente todas as manchetes atuais têm um eco no passado que está sendo liberado, seja no modo como se lida com armas nucleares, o entendimento do Oriente Médio ou ditaduras e democracias na América Latina.

Anna Kelson, uma historiadora da Universidade Americana, diz esperar que os arquivos esclareçam o papel da CIA no Irã.

¿ Os americanos precisam conhecer a sua história, e a história está nesses documentos ¿ diz ela.

A primeira data limite foi imposta por uma ordem executiva de Bill Clinton de 1995, quando funcionários descobriram que os contribuintes estavam pagando milhões de dólares para proteger uma montanha de documentos da Guerra Fria.

A ordem dava cinco anos para as agências liberarem os documentos ou mostrarem a necessidade de manter o status de secreto. O prazo foi estendido para 2003 e Bush o esticou novamente até agora.

¿ O governo Bush poderia ter dito: ¿essa é uma coisa do Clinton¿ e abandonar o programa ¿ disse Aftergood. ¿ É preciso reconhecer e dar o crédito a ele. Isso não foi feito.

A Agência de Segurança Nacional, responsável por grampos e decodificação de códigos, já liberou 35 milhões de páginas, entre elas uma grande quantidade de documentos relativos ao incidente da Baía de Tonquim, que levou à escalada da participação americana na Guerra do Vietnã. Para o início do ano que vem, a agência pretende liberar informações sobre o ataque israelense ao navio espião americano Liberty, em 1967.

O FBI, em contraste, tentou conseguir que todos os seus documentos não fossem liberados em 1995 e, só ano passado, entendeu que estaria obrigado a torná-los públicos. Correu para tentar impedir a liberação de 50 milhões de páginas com informações de espionagem, contra-espionagem e terrorismo, mas deixou que 270 milhões de páginas sejam automaticamente liberadas agora.