Título: Índices raros no interior de Pernambuco
Autor: Menezes, Maiá e Frazão, Heliana
Fonte: O Globo, 24/12/2006, O País, p. 3

Em Camutanga, apesar da pobreza, crianças estão na escola e são vacinadas

CAMUTANGA (PE). O município quase não é visto no mapa. Tem menos de oito mil habitantes e não consegue gerar nem 5% de sua receita, sobrevivendo à base de parcerias, convênios e repasses dos governos federal e estadual. A oferta de trabalho gira em torno do plantio de inhame, banana e principalmente da cana. Mas a lavoura açucareira só oferece serviço durante seis meses. No resto do ano, os trabalhadores dependem de programas sociais como o Bolsa Família. Apesar disso, Camutanga apresenta índice de mortalidade infantil inferior à média do estado, tem quase todas as crianças em idade escolar nas salas de aula, reduziu a evasão de alunos na rede municipal e oferece até pré-escola, coisa rara no ensino público do Brasil. Na cidade, localizada a 113 quilômetros de Recife, todas as crianças têm cobertura de vacinas e as gestantes recebem assistência pré-natal.

Por esse motivo, Camutanga acaba de ganhar o Selo Unicef ¿ Município Aprovado, sendo que em Pernambuco foi o que recebeu maior pontuação entre os 28 indicadores sociais avaliados pelos técnicos das Nações Unidas, que inscreveram 1.179 municípios do semi-árido brasileiro para a premiação e selecionaram apenas 156. Em Pernambuco, dos 103 que tentaram o selo, só 14,2% conseguiram. Camutanga foi um deles.

Segundo o IBGE, quase 80% das crianças do município vivem na pobreza, mas o GLOBO não registrou nas ruas um só pedinte mirim, cheira-cola nem batedor de carteira adolescente. É que, além da visita porta a porta para motivar os jovens a freqüentarem a escola e do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil ¿ que beneficia 328 crianças ¿ há outros dois programas sociais para os jovens na cidade. Um é o AABB Comunidade, em parceria com o Banco do Brasil, que beneficia mais 110 crianças que têm aulas de reforço, praticam esportes, ganham lanches e recebem material didático. O outro é o Desenvolver, voltado para a faixa etária de 11 a 19 anos, dedicado à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e a evitar a gravidez precoce.

A cidade tem uma Central de Alimentação, que atende a 180 famílias extremamente carentes por dia. Elas recebem munguzá (mingau de milho) pela manhã e um sopão à tarde. E no Centro Comunitário Elizabeth Correia da Silva, no Alto Santa Terezinha ¿ o bairro mais pobre do município ¿ as crianças desnutridas são assistidas, enquanto suas mães aprendem a importância da boa alimentação e a aproveitar melhor verduras e hortaliças, evitando desperdícios. Ainda se beneficiam com aulas de corte, costura, bordado e até confecção de bonecas de pano.

¿ Infelizmente as populações mais carentes são muito acomodadas. Elas vivem muitas vezes em situação de miséria e terminam por se habituar a conviver com o sofrimento. É preciso mudar essa cultura ¿ afirma Zilma de Albuquerque, secretária de Ação Social e escolhida pelo Unicef como articuladora do Selo Município Aprovado.

A prefeitura informa que a desnutrição no município, que era de 18,4% em 2000 está hoje em 1,34%. Segundo a coordenadora de saúde do município, Terezinha Oliveira, o custo mensal de assistência às crianças desnutridas não passa de R$33 por paciente. Pelos números do Unicef, a desnutrição de crianças entre zero e 23 meses caiu de 17,7% para 5,9%. Segundo Terezinha, os números da mortalidade infantil em Camutanga são ainda menores do que os do Unicef, que acusa 18 por mil nascidos vivos.

¿ Em 2003, tínhamos um índice de 13,33 óbitos por mil nascidos vivos. En 2006, registramos apenas uma óbito o que representaria, no modelo de cálculo feito pelo Ministério da Saúde, um indicador de 6,36 óbitos por mil, tendo em vista o número de nascimentos aqui registrados. Já a desnutrição caiu 89,9% em três anos ¿ afirma. Segundo o IBGE, a mortalidade infantil em Pernambuco é de 41,2 por mil nascidos vivos.