Título: Contadores de grupos rivais serviram a Castor
Autor: Martins, Marco Antônio
Fonte: O Globo, 24/12/2006, Rio, p. 15

Velhos conhecidos, responsáveis pelo dinheiro das duas máfias de caça-níqueis se falam e até negociam

A guerra entre as quadrilhas de Rogério Andrade e Fernando Iggnácio, que já causou 50 mortes na Zona Oeste da cidade, não passa perto dos contadores dos dois grupos. Os responsáveis pelo dinheiro das duas organizações são velhos conhecidos. Hoje se falam e até negociam. Antes, todos trabalhavam para apenas um chefe: Castor de Andrade.

A morte do ¿capo¿ em 1997 separou os grupos. Uns preferiram seguir o genro de Castor, Fernando Iggnácio, enquanto outros ficaram com Rogério Andrade. Um dos casos é de Ruth Sara Machado de Oliveira. Dona Ruth, como é chamada, era uma das pessoas de confiança de Castor e que está do lado de Rogério. É para ela que Rogério dá as ordens para pagamentos de propinas a policiais e integrantes da quadrilha presos.

Os outros contadores das duas quadrilhas têm uma relação mais estreita do que Ruth. É o caso de Carlos Henrique de Jesus, preso na semana passada, e ligado a Iggnácio, e Maria do Socorro Gadelha, a Rogério.

Tanto Iggnácio quanto Rogério investem em café

De acordo com as investigações da Polícia Federal, tanto Henrique como Maria do Socorro são responsáveis por lavar o dinheiro obtido com os caça-níqueis. Curiosamente, tanto Iggnácio quanto Rogério investem em café. Gravações telefônicas, obtidas com autorização judicial, mostram que Rogério chegou a gastar R$40 mil em sacas de café.

Um dos mais antigos colaboradores das quadrilhas é João Machado Cafezeiro. Segundo policiais, ele foi contador de Castor e uma das testemunhas de Iggnácio na constituição da CWA Patrimonial Empreendimentos e Participações. Ele ainda seria procurador da Rhondda Sociedad, no Uruguai.

Cafezeiro, chamado de Café pelo grupo, sofreu um problema neurológico e teve a cirurgia paga por Iggnácio. Custou R$200 mil.

A guerra pelo controle dos pontos de caça-níqueis na Zona Oeste não impediu que Rogério e Iggnácio deixassem de investir no negócio. Ao mesmo tempo em que planejavam destruir os ¿brinquedos¿, como as máquinas são chamadas, eles investiam na compra dos componentes para as montagens delas. São os chamados ¿noteiros¿, os valiosos equipamentos de leitura das notas introduzidas nas máquinas pelos apostadores e que são cotados em dólar. De acordo com as investigações, eles viriam da China ou Taiwan para um comerciante em São Paulo. De lá, para o Rio.

O acompanhamento feito pelos policiais federais sobre as duas quadrilhas descobriu que, em 22 de setembro, havia ¿noteiro¿ para 800 máquinas. Os gastos do grupo pelo pacote chegariam a R$160 mil. Peritos da PF comprovaram, através de exames, que o equipamento é contrabandeado.

As investigações descobriram que, para evitar a apreensão das máquinas, os contraventores falsificam notas fiscais, além de oferecer propinas. Em um dos casos, acompanhados pelos policiais federais, os contraventores tentam obter ¿notas frias¿. Todas essas negociações são conduzidas pelos contadores das duas quadrilhas.

No caso de Iggnácio, o responsável é o contador Ulisses Rezende, que está foragido. Com Rogério, essa função caberia a Ruth Oliveira.

No último dia 15, a PF deflagrou a Operação Gladiador. Durante sete meses, policiais federais investigaram a atuação das quadrilhas que investem no caça-níquel na Zona Oeste. A investigação comprovou a participação de policiais, advogados e contadores com Iggnácio e Rogério. De acordo com policiais federais, inspetores da Polícia Civil apoiariam com proteção as ações da máfia dos caça-níqueis. As investigações da Polícia Federal apontam o ex-chefe de Polícia Civil Álvaro Lins, deputado estadual eleito, como chefe dos policiais envolvidos com o crime. São conhecidos na polícia como os ¿inhos de Lins¿. A PF descobriu ainda que, mesmo presos, Rogério e Iggnácio controlavam os seus negócios.

* Do Extra