Título: Presente
Autor: Vidor, George
Fonte: O Globo, 25/12/2006, Economia, p. 15

Por enquanto é só uma expectativa, mas não deixa de ser uma boa notícia, quase um presente de Natal para todos os brasileiros: economistas de grandes instituições financeiras começam a rever suas previsões para o crescimento da economia em 2007 projetando uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) acima de 3,5%. Alguns já especulam com um crescimento maior que 4%.

Essa revisão não é um desejo motivado pelo espírito natalino, mas sim um exercício estatístico baseado no comportamento de certos setores que têm grande impacto no conjunto da economia. É o caso da construção civil, influenciada positivamente pela queda nominal nas taxas de juros. Os bancos voltaram a se interessar em financiar empreendimentos imobiliários, até porque tendem a captar mais recursos nas cadernetas de poupança.

No ano que vem, os juros reais oferecidos pelos títulos públicos devem se aproximar de 8%, enquanto as cadernetas renderão 6,17% acima da inflação. Como os ganhos da intermediação financeira no Brasil foram enormes nos últimos anos, essa diferença é considerada muito pequena para quem se acostumou a lucrar com taxas de juros exorbitantes.

Então, o sistema financeiro será empurrado forçosamente para o crédito, e o financiamento da casa própria passa a ser de novo um bom negócio quando o ambiente econômico é de queda de juros, inflação baixa e mercado ativo (com valorização nos preços das casas e apartamentos), pois se houver necessidade de retomada do imóvel fica mais fácil revendê-lo sem risco de prejuízo.

O crescimento de 4% ou mais seria também resultando de incremento na construção pesada, com investimentos que estão deslanchando na infra-estrutura ou na indústria (siderurgia, por exemplo).

Além do crédito, vários desses investimentos serão viabilizados pela redução do custo de capital no Brasil. O mercado anda ávido por bons lançamentos de ações, o que é uma grande oportunidade para as empresas se capitalizarem. As companhias do setor imobiliário já descobriram esse filão.

Os lucros no mercado de ações foram responsáveis por grande parte dos bons resultados obtidos pelo BNDES nos últimos exercícios, o que não é surpresa para os executivos financeiros, já que a atuação do banco no mercado é considerada exemplar e transparente - o que é um fenômeno raro nesses dias em que escândalos envolvendo instituições públicas se sucedem.

A mesa de operações do BNDES em Bolsa segue uma regra simples, mas que nem sempre os investidores pessoas físicas têm tranquilidade emocional ou cacife para acompanhá-la: comprar na baixa e vender na alta.

O Brasil é o segundo maior produtor de soja do mundo e por conta das exportações o beneficiamento do grão segue mais a lógica do mercado internacional do que a do consumo interno (embora dois terços do óleo de soja aqui produzidos atendam aos brasileiros). O cerrado na região de Barreiras, na Bahia, por exemplo, se tornou um dos principais centros produtores de soja do país, mas como no estado não há indústrias esmagadoras, o grão vai para São Paulo e retorna sob a forma de óleo ou farelo. Por força desse passeio, a ração animal à base de soja na Bahia é uma das mais caras do Brasil.

Recém-chegado da Índia, onde foi participar de uma conferência internacional sobre empreendedorismo, o professor José Cesar Castanhar, da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas, desembarcou no Rio com a sensação de que vivemos numa Suíça. A conferência foi realizada em uma cidade de quatro milhões de habitantes, perto de Bangalore, na qual o professor só conseguiu avistar dois sinais de trânsito. Por isso, chega a ser impossível para um pedestre visitante atravessar as ruas.

Comparando os problemas e o nível de pobreza dos dois países, o professor Castanhar concluiu que, mesmo com o baixo crescimento da economia brasileira - enquanto a indiana vem se expandindo a taxas de 7% ao ano ou mais - o país tem ainda mais chances de se se tornar desenvolvido do que qualquer outro dos emergentes da Ásia apontados como candidatos ao Primeiro Mundo. Durante a conferência, o professor ficou pasmo diante do discurso de um empresário estrangeiro que, após DEZ anos de negociação, conseguiu se instalar na Índia.

Mas para crescer o Brasil terá de superar muitas idiossincrasias, que emperram os investimentos. Um exemplo: recentemente um grupo resolveu produzir biodiesel, usando sebo animal como matéria-prima nas instalações da refinaria de Manguinhos, no Rio, que estavam temporariamente desativadas por causa da defasagem entre as cotações internacionais do petróleo e os preços internos dos principais combustíveis. A refinaria obviamente tem licenciamento ambiental para refinar petróleo, mas o projeto do biodiesel atrasou porque não tinha sido liberada a licença para se fabricar biodiesel no mesmo lugar (e, como se sabe, um dos objetivos do programa é exatamente o de se reduzir a emissão de gases poluentes na queima do diesel tradicional).

Feliz Natal!