Título: Deflação inédita na cesta básica
Autor: Rosa, Bruno
Fonte: O Globo, 28/12/2006, Economia, p. 19

Após alta de 60% em alguns itens em 2005, preços caem até 43% na 1ª queda desde 2000

A redução nos preços das commodities agrícolas, a crise sanitária na pecuária e o dólar mais barato ao longo de 2006 garantiram a primeira queda no custo da cesta básica dos últimos sete anos. Enquanto a inflação oficial no país, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) aponta alta na faixa de 3%, a cesta de compras registra deflação de 2,45%. Segundo a Fecomércio-RJ, o valor dos 39 itens mais consumidos no Rio passou de R$304,65, na segunda semana de dezembro de 2005, para R$297,19 no mesmo período deste mês.

Entre 1999 ¿ quando começou a série da Fecomércio-RJ e o governo implantou o regime de metas de inflação ¿ e 2006, o custo da cesta de compras acumula alta de 54,39%, contra 64,41% do IPCA. Este ano, a boa safra permitiu quedas de até 43,5% nos preços de carnes, cebola, batata, feijão e tomate em relação ao ano passado, quando os itens tiveram altas de quase 60%. Dos 39 itens pesquisados pelo instituto, 20 apresentam queda nos preços em 2006.

Para economistas, porém, o bom resultado deste ano não deve se repetir em 2007. Espera-se um cenário de alta moderada nos preços. Há várias razões: demanda internacional maior, pressionando as cotações de produtos como açúcar, milho e trigo; o fim dos embargos na exportação de carnes; e safra menor em 2007, após os bons resultados obtidos este ano.

Segundo Paulo Brück, coordenador de Pesquisas da Fecomércio-RJ, a gripe aviária e a febre aftosa ocorridas este ano derrubaram os preços de carnes, aves e derivados de porco entre 4% e 15%. Com os embargos do mercado externo, sobraram mais produtos no país, aliviando os preços. Em 2005, o custo da carne subiu 0,86%, contra deflação de 2,86% este ano.

¿ Além disso, o inverno tranqüilo se traduziu em menores preços dos produtos in natura, como batata, cebola e feijão. Em 2005, estes itens foram os vilões da inflação, com altas de até 58,6%, caso do tomate. Produtos de higiene e beleza também ficaram mais baratos em relação ao ano anterior, como creme dental e desodorante. O consumidor sentiu a queda nos preços devido à desvalorização cambial ¿ explica Brück.

Em 2007, preços voltarão a subir

As promoções também ajudaram. O casal de atores Ivany Guimarães e Helio Behring aproveitou os descontos para comprar mais.

¿ Ainda pesquiso. Senti alguns preços menores este ano, mas alguns itens tiveram fortes altas, como pão e açúcar. Acho que, no fim das contas, ficou tudo igual ¿ diz Ivany.

A pesquisa nos supermercados do Rio revela que nem todos os itens de primeira necessidade foram heróis na guerra dos preços. O consumidor sentiu a forte alta nos preços do açúcar, arroz e farinha de trigo nas gôndolas. Vilões, os preços registraram altas de até 17%. A farinha de trigo, por exemplo, que registrou deflação de 5,84% em 2005, subiu 10,74% este ano. Outro item com forte alta foi a banana prata (12,17%), afetada por uma peste no primeiro semestre deste ano, que levou à proibição da entrada no Rio do produto plantado no Nordeste.

Para Brück, as altas foram motivadas pelo crescimento da demanda do mercado internacional, que levou a uma oferta interna menor:

¿ A demanda internacional está muito forte.

A pesquisa revela ainda que as famílias mais beneficiadas com o recuo nos custos dos alimentos foram aquelas que recebem mensalmente até três salários mínimos, em que a queda chegou a 3,03%. Brück explica que essa faixa de renda consome mais os produtos que estão em queda e menos os que estão em alta.

O funcionário público Edson Gerônimo confirma os números da pesquisa. Com a queda no preço das carnes, por exemplo, passou a comprar maior quantidade do produto e diminuiu, por outro lado, o consumo de banana e arroz.

¿ Passei a consumir mais carne, por exemplo. Por outro lado, notei que o preço do arroz subiu. Por isso, para driblar a alta, passei a pesquisar preços, além de aproveitar as promoções ¿ diz Gerônimo.

O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revelou que os preços, este ano, registraram uma das menores variações calculadas pela instituição, que acompanha os valores de 13 itens de primeira necessidade.

¿ É um dos melhores resultados da história. A combinação de preços menores e alta do salário mínimo resultou em um número menor de horas trabalhadas para comprar os produtos da cesta básica. Passou de 130,36 horas, em novembro do ano passado, para 112,34 horas, no mês passado ¿ diz José Maurício Soares, técnico responsável por cesta básica do Dieese.

Para Aylton Fornari, presidente da Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj), os preços estão em um nível muito baixo. Por isso, ressalta, a tendência para 2007 é de alta moderada. Luiz Roberto Cunha, economista da PUC-Rio, afirma que os produtos que tiveram queda em 2006 subirão no próximo ano:

¿ Os preços das carnes voltarão a aumentar, com a normalização das exportações. Com isso, a cesta terá preços maiores em 2007.

Alex Agostini, economista da Austin Rating, ressalta que a pressão virá dos preços de commoditties como soja e trigo, usadas na produção de biocombustível, e milho e cana-de-açúcar, utilizadas na produção de etanol.