Título: Lula investirá no crescimento
Autor: Alvarez, Regina e Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 31/12/2006, O País, p. 3
Esta será a tônica do mandato que começa amanhã, mas governo ainda diverge sobre medidas
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva começa amanhã o segundo mandato empenhado no desafio de fazer o país crescer de forma sustentada e duradoura, o que não conseguiu nos primeiros quatro anos de gestão. O governo tem a fórmula para alcançar esse objetivo, mas ainda não sabe como implementá-la. O pacote de medidas que pretende anunciar na segunda quinzena de janeiro tem como foco resolver os problemas da infra-estrutura, com investimentos mais fortes nas áreas de transportes e energia, mas existem divergências internas sobre a condução das políticas fiscal e monetária, de forma a adequá-las ao objetivo de crescimento sustentado.
- Para viabilizar o crescimento sustentado, temos que eliminar os principais gargalos da infra-estrutura. Precisamos contar com um bom sistema de transportes e mais oferta de energia para que a economia não tenha restrição de oferta - resume o secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, coordenador do programa econômico do presidente Lula.
Já está praticamente certo que o governo aumentará os gastos com o Projeto Piloto de Investimentos (PPI) para até 0,5% do PIB, aplicando R$11, 3 bilhões do Orçamento em obras de infra-estrutura de transportes, infra-estrutura hídrica e saneamento. Parte dessas despesas será descontada da meta de superávit primário, e os recursos para a área de energia sairão do Orçamento das estatais e de outras fontes.
As divergências que precisam ser equacionadas decorrem de visões diferentes dentro do governo e do próprio Ministério da Fazenda sobre a condução da política monetária e fiscal nos próximos quatro anos.
O programa de desenvolvimento em gestação no governo será pilotado pela chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que tem posições muito pessoais sobre os rumos da política fiscal e monetária, que não se encaixam nas linhas da chamada Era Palocci, mantida pelo Banco Central. Dilma considera, por exemplo, que um dos fatores que impedem novos investimentos no país é a ausência de uma política de juros de longo prazo, que estaria inibindo a participação da iniciativa privada na formação de capital bruto.
- Há um problema de engenharia financeira. Os nossos juros não são consistentes para 30 anos de prazo - diz a ministra, que passou a usar a palavra "eficientização" como um mantra do segundo mandato de Lula.
Polêmica em torno dos gastos correntes
Outra questão chave é a redução dos gastos correntes do governo, para que se abra espaço no Orçamento a novos investimentos. No discurso, todos pregam a redução desses gastos, mas na prática pouco acontece.
Dilma influenciou Lula, que avalizou o acordo do salário mínimo, elevando ainda mais as despesas com a Previdência. A ministra acredita que os gastos do governo - mesmo os gastos correntes - são, por si só, indutores da reativação da economia. Na defesa do aumento do mínimo, as opiniões se dividiram na Fazenda.
Enquanto o ministro Guido Mantega e alguns secretários defendiam um reajuste menor - para não aumentar os gastos correntes - outros integrantes da equipe, como Nelson Barbosa, consideram o acordo satisfatório.
- Para cada R$1 de aumento do mínimo, R$0,20 voltam para o governo em forma de impostos. Este é um importante instrumento para melhorar a distribuição de renda, assim como o Bolsa Família. Não dá para pensar apenas na parcela dos 20% mais pobres (atendidos pelo Bolsa Família) - afirma Barbosa.
Fiel ao estilo de ouvir todos os lados e decidir sozinho as principais questões de seu governo, Lula formou uma espécie de conselho econômico informal para se inteirar de outras receitas que possam levar ao crescimento sustentado. Na segunda-feira, dia 4 de dezembro, o presidente reuniu quatro economistas de sua confiança, mas de correntes econômicas diversas: Mantega, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), o deputado Delfim Netto (PMDB-SP) e Luiz Gonzaga Belluzzo (Unicamp).
Depois de quatro horas de conversa, Lula concluiu que: 1) há espaço para flexibilizar a política monetária, acelerando a queda dos juros; 2) é necessário um esforço maior na redução das despesas de custeio; 3) é preciso criar novos instrumentos de financiamento para estimular a iniciativa privada; 4) e é preciso aumentar substancialmente o investimento público.
- Acho muito difícil crescer 5% em 2007. Mas, se o governo tiver coragem para realizar cortes no gasto público e se o cenário externo continuar favorável, poderemos tentar alcançar essa meta - afirma Mercadante, ex-líder do governo no Senado.
Como crescer de forma sustentada?
MÁRIO ERNESTO HUMBERG
Para o economista Mário Ernesto Humberg, presidente do Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE), um dos principais ingredientes na receita para fazer a economia crescer é garantir estabilidade nas regras para investimentos em infra-estrutura. Segundo ele, o governo não pode permitir o esvaziamento das agências reguladoras. Ele defende ainda um choque de capitalismo e uma ampla desburocratização.
MAILSON DA NÓBREGA
O ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega destaca as reformas da Previdência e do ICMS. Além disso, Mailson diz que é preciso conceder autonomia formal ao Banco Central e fazer um mutirão para aumentar os investimentos em infra-estrutura.
- É preciso cortar gastos correntes e criar marcos regulatórios que gerem seguranças para investimentos privados - diz o ex-ministro.
MÁRCIO POCHMANN
O crescimento da economia é uma questão de convergência política, para o economista Márcio Pochmann. Na opinião dele, a classe política não deve atuar seguindo interesses corporativos.
- O que temos de consenso é o combate à inflação, mas o que precisamos é de uma convergência política que defenda a economia - disse, destacando que o governo precisará de uma base de apoio forte para seu projeto de crescimento.
MÁRIO BERNARDINI
O diretor do Departamento de Competitividade da Fiesp, Mário Bernardini, acredita que a alta carga tributária é o principal vilão da economia no país.
- O governo precisa reduzir a carga tributária. Com esse confisco, não há condições de ter investimento para atividades produtivas - disse.
Ele defende também a redução dos juros:
- É incrível como falta dinheiro para estradas, mas não falta para pagar juros.
PAULO GODOY
Para o presidente da Associação Brasileira de Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, o Brasil precisa aumentar a eficiência na gestão do dinheiro público e estabelecer programas de longo prazo, que ultrapassam os limites de um governo. Os investimentos em educação e desenvolvimento tecnológico, por exemplo, devem ser prioridades. As empresas no Brasil, diz ele, precisam de segurança para investir.
SYNÉSIO BATISTA DA COSTA
O presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), Synésio Batista da Costa, considera a burocracia o entrave número um ao desenvolvimento:
- O governo tem que tirar do ambiente da produção o peso da burocracia - diz.
Para ele, as reformas trabalhista, fiscal e previdenciária também são obrigações que o governo deve cumprir.
PAULO PEREIRA DA SILVA
O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, afirma que para fazer a economia deslanchar o governo precisa reforçar o seguinte tripé: redução dos juros, diminuição de impostos e equilíbrio do câmbio.
- Mas se fizer só isso, não adianta. Tem que baixar também os spreads bancários.
ARTHUR HENRIQUE SILVA SANTOS
A abertura do Conselho Monetário Nacional (CMN) para a participação de representantes de trabalhadores e empresários deve ser considerada uma das prioridades para fazer a economia deslanchar, diz o presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Arthur Henrique Silva Santos.
- Com a participação dos trabalhadores e empresários no conselho, as metas de crescimento e emprego serão perseguidas, ainda mais no que se refere a taxas de juros, orçamento público e superávit primário.
JOSÉ LOPEZ FEIJÓO
Para o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, José Lopez Feijóo, o crescimento da economia passa pela distribuição de renda. Ele cita o aumento do salário mínimo.
- O crescimento da economia deve passar pelo crescimento de cada indivíduo - diz Feijóo.
"O governo tem que reduzir os gastos correntes. O caminho é o governo investir, criando um ambiente favorável ao desenvolvimentoda economia"
FÁBIO GIAMBIAGI
Economista do Ipea
"Se não mudarem as condições de investimentos, o país não vai crescer acima de 3,5% ao ano. O Brasil cresce pouco porqueinveste pouco"
FLÁVIO CASTELO BRANCO
Economista da CNI