Título: Um Congresso que não deixa saudades
Autor: Éboli, Evandro e Lima, Maria
Fonte: O Globo, 01/01/2007, O País, p. 8

Legislatura marcada por pizzas depois de festival de escândalos se aproxima do fim, e nova legislatura tentará mudar imagem

BRASÍLIA. O Congresso que toma posse em fevereiro tem o desafio de mudar regras e adotar condutas para tentar melhorar a desgastada imagem do Parlamento após uma legislatura desastrosa, marcada por escândalos e denúncias envolvendo mais de uma centena de parlamentares. Nas últimas semanas de funcionamento do Congresso, em dezembro, a sociedade deu mostras de que reagirá a abusos e exigirá mudanças, como fez ao provocar o recuo no aumento de mais de 90% nos subsídios de deputados e senadores.

Aos escândalos de corrupção somou-se, na campanha eleitoral, a evidência de abusos de um sistema político-partidário ultrapassado. O financiamento público de campanha, reprovado pela sociedade, segundo pesquisas, é defendido por especialistas como moralizador. Outras medidas citadas são fidelidade partidária, voto distrital, ou voto por lista, e enxugamento dos partidos políticos.

Outra providência seria a aprovação do fim do voto secreto, no plenário, nos processos de cassação de mandato. O voto fechado garantiu a absolvição, no plenário da Câmara, em 2006, de acusados de corrupção e condenados à perda do mandato pelo Conselho de Ética.

O Conselho enfrentou limitações impostas pelo regulamento, e agora quer mais poder. Sem prerrogativa para quebrar sigilo bancário, fiscal e telefônico dos acusados, em muitos casos os relatores não tiveram condições de avançar nas investigações. Está pronta uma proposta que dá mais força ao colegiado e assegura aos integrantes poderes de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

Orçamento é próxima tarefa

Razão de uma das últimas crises deste Congresso, as emendas individuais dos parlamentares vão continuar, mas são várias as propostas de adoção de critérios mais rigorosos para aplicação e liberação de recursos orçamentários. Elas foram a causa do escândalo dos sanguessugas, esquema montado para superfaturar compra de ambulâncias para prefeituras.

Mudar a forma de fazer o Orçamento da União é outro desafio. Enquanto não avançam as mudanças, a Comissão de Orçamento até ampliou de R$5 milhões para R$6 milhões o valor das emendas por parlamentar. Para compensar, foi aprovada a redução do número de integrantes da comissão, de 84 para 40. Outra medida foi o rodízio de parlamentares nas relatorias.

Os escândalos do mensalão e dos sanguessugas, que marcaram a legislatura, resultaram no envolvimento direto de 86 deputados, cerca de 20% da Câmara, e três senadores. Câmara e Senado passaram os dois últimos anos entre CPIs, Conselhos de Ética e quebra de sigilo. Mas, cassados mesmo, apenas três deputados: Roberto Jefferson (PTB-RJ), José Dirceu (PT-SP) e Pedro Corrêa (PP-PE).

¿ Graças a Deus a legislatura está acabando. A Câmara produziu problemas e não foi capaz de resolvê-los ¿ diz o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP).

Dos 67 deputados investigados pelo Conselho de Ética, acusados de integrar o esquema de venda de ambulâncias superfaturadas, 62 foram salvos de punições pelos colegas ¿ desses, 54 processos foram arquivados sem ser analisados; quatro foram arquivados por inépcia e quatro foram absolvições.

¿ É um final à altura do que foi essa legislatura. Quando achávamos que não dava para piorar, piora ainda mais ¿ lamenta o deputado Roberto Magalhães (PTB-PE).